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Nº 5759
Opinião

Realidade singular

PASCHOAL SAVASTANO * O consagrado dramaturgo brasileiro Nelson Rodrigues confessava possuir uma alma suburbana. Achava que a vida se apresenta mais profunda nos bairros da periferia. Local onde seria possível ainda se morrer ou matar por amor. A zona no

Por | Edição do dia 02/03/2002 - Matéria atualizada em 02/03/2002 às 00h00

PASCHOAL SAVASTANO * O consagrado dramaturgo brasileiro Nelson Rodrigues confessava possuir uma alma suburbana. Achava que a vida se apresenta mais profunda nos bairros da periferia. Local onde seria possível ainda se morrer ou matar por amor. A zona nobre das cidades, representada pelos núcleos populacionais mais favorecidos, seria marcada por sentimentos ou interesses sofisticados. A pureza de espírito e o rigor das bravas reações estariam melhor identificados com o ambiente singelo e desprotegido das metrópoles. A afirmação do grande escritor lembra sua alma vocacionada às fortes paixões e sua notável capacidade de registrar os fatos do cotidiano. Ninguém como ele narrou intensamente as tragédias da vida, a inocência empolgante dos gestos ou a trêmula realidade dos instintos humanos. A poesia dos bairros decorre da simplicidade de seus habitantes e da espontaneidade de seus cenários. Sofrimentos e limitações contam a história de um povo esquecido que luta para encontrar motivos da alegria. A alma popular, acostumada aos dissabores, valoriza os breves momentos de euforia. A inspiração de Luiz Peixoto se fez canto: “Subúrbios, subúrbios, das moças prendadas, que fazem bordados e querem casar. Dos cães vira-lata que latem à lua, enquanto as galinhas se deixam roubar. Das ruas barrentas, tão simples e humildes que até nem o nome se lê nos jornais”. O crescimento das cidades corta a intimidade dos bairros. O fluxo do trânsito testemunha sua vida diária. Cidadãos de bermuda sem camisa ostentam enormes e orgulhosas barrigas. Moças de cabelos molhados chamam atenção aos cuidados de seu corpo e meninos soltos declaram amor à liberdade. Os seres humanos que enfrentam a vida com dificuldades cultivam as horas de alegria com extremo entusiasmo. E fazem das pequenas alegorias as festas de suas esperanças. Suas paixões ajudam a viver. E, sem elas a existência tornar-se-ia insuportável. Nelson Rodrigues narrou os dramas e os sentimentos humanos. Penalistas clássicos italianos sentenciaram – das dores de amor não se morre, mas se perde a razão. As pessoas agora transformam em letras de canção, a história de seus desencontros e os desejos inauditos de seu coração. (*) É ADVOGADO/OAB-AL

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