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Nº 5759
Opinião

OS IDOS

Novembro é o mês que nos suscita uma especial lembrança dos entes queridos que partiram antes de nós. No dia primeiro, celebramos a memória de todos os santos, aqueles que já encontram contemplando a face de Deus, segundo nos ensina o catecismo católico;

Por | Edição do dia 21/11/2014 - Matéria atualizada em 21/11/2014 às 00h00

Novembro é o mês que nos suscita uma especial lembrança dos entes queridos que partiram antes de nós. No dia primeiro, celebramos a memória de todos os santos, aqueles que já encontram contemplando a face de Deus, segundo nos ensina o catecismo católico; no dia dois, rezamos pelos idos que ainda estão purgando as faltas cometidas (a chamada igreja padecente), intercedendo para que eles alcancem a paz eterna e cheguem à igreja triunfante. Caminhantes que somos, “chorando e sofrendo nesse vale de lágrimas”, unimo-nos pela oração aos que não estão mais fisicamente conosco e recordamos o quanto eles foram, cada um à sua maneira, importantes na nossa caminhada. Seja no velho cemitério de Murici, onde estão os meus avós e as pessoas que marcaram a minha infância, ou nas necrópoles de Maceió, onde repousam minha mãe e tantos dos amigos que fiz ao longo da vida, a saudade me aperta o peito e a memória dos momentos com eles compartilhados me fazem voltar no tempo, quase como se eu os tivesse novamente bem perto de mim. Ouço a voz de uns, sinto o cheiro do perfume de outros, noto uma certa cor dos olhos, uma roupa mais constante, um meneio de cabeça. Vejo os que inundavam a minha casa com sonoras gargalhadas, e os que chegavam discretamente, sua presença silenciosa trazendo ternura e paz. Trago-os sempre na lembrança, e posso repetir com Drummond: “Do lado esquerdo carrego meus mortos; por isso caminho um pouco de banda”. Triste esse saldo da idade adulta, quando os rostos amigos vão-se transformando em lápides frias. Como fazem falta o abraço apertado, as conversas que consumiam horas, os segredos confidenciados, os conselhos recebidos na intenção única de ajudar, o telefone atendido a qualquer hora, o contato físico, enfim – essas coisas que espiritualmente não podem acontecer, e que são tão vitais para qualquer relação. Católico que sou, creio firmemente na vida eterna, cônscio de que a morte é somente uma passagem, de que seguimos vivos noutra dimensão. Mas o que me machuca é o meu lado humano, carnal, que necessita de vozes e de gestos para sentir-se aconchegado. “A pálida morte bate forte”, disse-nos Horácio, poeta grego” (“palida mors pulsat”, diria em latim o mestre Aloysio Galvão). Esse é um dos golpes mais dilacerantes da indesejada das gentes: roubar de nós, do alcance dos nossos olhos e das nossas mãos, aqueles que são tão importantes para a nossa existência. Seguimos adiante sem eles, é bem verdade; mas restamos muito mais pobres, mais solitários, menos felizes.

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