Opinião
O Cínico de Sínope

Quando o meu pai nasceu, meu avô foi buscar inspiração na Folhinha do Sagrado Coração de Jesus de 30 de junho de 1944. Deparou-se com uma frase de Diógenes, gostou do conteúdo e registrou o filho com o nome do filósofo grego, mesmo sem nunca ter aprendido a pronunciá-lo corretamente. O velho Zezinho Fogueteiro morreu chamando o herdeiro de ?Dioge?, e jamais soube ao certo quem de fato tinha sido o homenageado. Vó Maria queria mesmo era que o menino fosse batizado de José, pois nascera laçado, sob pena de morrer ainda criança, queimado ou afogado, mas o machismo do marido foi superior à sua ingênua vontade. Somente na minha adolescência, durante as aulas de Filosofia do Colégio Marista de Maceió, fui conhecer a história daquele homônimo meu. Diógenes de Sínope foi um filósofo da Grécia Antiga. Exilado de sua terra natal, Sínope se mudou para Atenas, onde tornou-se discípulo de Antístenes, antigo pupilo de Sócrates. Fez da pobreza um modo de vida: sua habitação era um barril, no meio da rua, e mendigava perambulando pela cidade com uma lamparina acesa, em pleno dia, dizendo procurar um homem de verdade (?quanto mais procuro por homens honestos, mais admiro os meus cachorros?, teria dito). Propagou o ideal da autossuficiência, uma vida que fosse natural e prescindisse das luxúrias da civilização, tornando-se, por isso também, conhecido como Diógenes, o Cínico, já que nutria uma profunda indiferença pelos valores da sociedade da qual fazia parte. Reza a lenda que os seus únicos bens eram um alforje, um bastão e uma tigela. Certa feita, foi encontrado por Alexandre, o Grande, que já ouvira falar das suas críticas e das suas ideias excêntricas. Diógenes estava tomando banho de sol, deitado no chão, e o imperador fazia-lhe sombra; quando Alexandre perguntou o que poderia fazer por ele, o filósofo retrucou-lhe: ?Só peço que não me tires o que não me podes dar? ? isto é, a luz do sol. Dizem que o comandante, voltando ao seu batalhão, teria dito: ?Se eu não fosse Alexandre, queria ser Diógenes?. Noutra vez, foi visto pedindo esmola a uma estátua, e quando lhe perguntaram porque fazia aquilo, ele respondeu: ?Para que eu me acostume a não receber nada e a não depender de ninguém?. Viveu um período como escravo, nunca teve qualquer patrimônio material e praticou sempre a virtude, definindo-se como um cidadão do cosmos, sem estar preso a nenhum lugar. Em meio à multidão, gritava bem alto: ?Gente muita, pessoas poucas?. Talvez devesse ter vivido nos tempos de agora, para não deixar que nos esquecêssemos de tantas verdades há muito silenciadas.