Opinião
Greve dos caminhoneiros e a fragilidade do governo

Há uma semana o País acompanha a greve dos caminhoneiros. No início, os comentaristas se revezavam a dizer que nada podia ser feito, para não ceder em solução que gerasse custo para o governo, subsídio e outros que tais. E mais: a Petrobras não poderia oferecer solução para a crise. Faltou aos analistas um detalhe: combinar esses desejos com os grevistas. O desenrolar da greve trouxe a lembrança do livro Intermitências da morte, do escritor português José Saramago, no qual ele trata da vida criando um reino fictício onde a morte entra em greve e, de repente as pessoas param de morrer, iniciando um descontrole. Primeiro nas funerárias sem ter nada a fazer, chega a hospitais cheios de pessoas que continuam vivendo e atinge as seguradoras. O Estado, lá como cá, demora a se posicionar, quando o fez, segundo o escritor, disse: ?...o governo ratificava que não se havia registro de quaisquer defunções em todo o País desde o início do novo ano, pedia comedimentos e sentido de responsabilidade nas avaliações e interpretações que do estranho facto viessem a ser elaboradas, lembrava que não deveria excluir-se a hipótese de se tratar de uma casualidade fortuita...?. De nada adiantou, as pessoas continuaram não morrendo aumentando o descontrole, chegando ao ponto de o governo ter que lidar para resolver serviços clandestinos que cruzava a fronteira com quem deseja encerrar o sofrimento na terra. A semelhança da ficção com a realidade serve para evidenciar a falta de habilidade do governo ao lidar com a greve. Primeiro, ele subavaliou o impacto para o País e na vida das pessoas. E, em segundo plano, fez de conta não saber de que a greve é, em boa parte lockout de empresários dos transportes, que se juntaram aos motoristas autônomos em greve, para pressionar por mais benefícios. O desenrolar das notícias mostraram o desabastecimento com filas em postos, especulação de preço e caos crescente, até a paralisação total das cidades, sem suprimentos para as necessidades básicas, as escolas não funcionam, os hospitais enfrentam escassez. O movimento dos caminhoneiros evidenciou o erro na estratégia da Petrobras ao tratar o preço do petróleo como em outra empresa qualquer, não avaliando o seu papel estratégico para o país. O governo erra ao defender a ideia de preço flutuante com base em as cotações internacionais. Como assegurar isso, se o País é autossuficiente em petróleo? E, se o custo de produção é em Real? É incorreto justificar aumentos diários em nome da competitividade, pois a Petrobras tem monopólio para produzir e vender. Não é certo afirmar que sem ajustes diários a empresa quebraria, vez que há como adotar política de preços que garanta a remuneração do capital investido. E, dificilmente lhe faltarão fontes de financiamentos, já que a atividade é rentável com margens generosas. Os acionistas, por sua vez, consideram na formação de preço os riscos envolvidos por ser empresa controlada pelo governo e de ser monopólio na produção e distribuição de petróleo no País. Os acontecimentos revelaram a fragilidade do governo para orientar medidas capazes de minimizar os impactos na vida das pessoas. Inabilidade ao negociar a pauta de reivindicação, bem como falta de comando para orientar medidas nas diversas regiões do País. A crise dos preços dos combustíveis, centrada na discussão da reivindicação dos caminhoneiros e se a Petrobras deve ou não alterar sua política, não é o único problema a afetar a vida dos brasileiros, ela é apenas uma ponta das políticas erráticas do governo. É resultado também do aumento de preços em todos os segmentos e da opção do governo por medidas prejudiciais à população.