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Penitência, jejum e a fila do pão

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Momo é deposto na quarta-feira do carnaval e nas cinzas dessa data o católico sincero recorda que é pó. Por quarenta dias, se meterá em jejuns e penitências. Despoja-se. Renuncia aos doces, foge da cerveja e se faz surdo a fofocas. Martírio? Nem de longe, mas só é fiel no muito quem é fiel no pouco. No limiar da Quaresma, o coitado teme o deserto porque teme a si mesmo. Nada se ouve, exceto a confissão do mal entre as jaculatórias. Cada Ave-Maria sussurra: ?Pai, fui egoísta, perdão?; ?dominei-me pela vaidade, misericórdia?; ?cedi à concupiscência, tende piedade?... De súbito, porém, o tilintar das contas do Rosário é interrompido. Atônito, o penitente se levanta da hora dolorosa. É envolto por uma multidão a bradar: MORADIA! EDUCAÇÃO! PREVIDÊNCIA SOCIAL! A Campanha da Fraternidade chegou. Sem entender como seu deserto se transformou em passeata, o desorientado fiel recebe megafone, bandeira e uma causa para defender. Pronto! Nos sermões do domingo, aprenderá legislação, orçamento, economia e mercado. Políticas públicas serão a sua penitência e jejum. Na Via-Sacra, não chorará as chagas do Redentor, mas a crucificação da cidadania, ou o que isso possa representar. Ao final da Quaresma, estará preparado para corrigir um Reino que é deste mundo. No que lhe resta de devoção, o penitente vai ao confessionário. Ao de lá sair, eis a ocasião para purgar as faltas - recebe a súplica de um pobre por alimento ? ?senhor, qualquer coisa serve?. Mas quando se prepara para abrir a carteira e aliviar a fome do desvalido, o benfeitor recua do gesto. A Campanha da Fraternidade triunfara; claro, porque os carentes são de responsabilidade do governo. O excluído, mais excluído do que nunca, sai de mãos vazias e com a indicação da fila do pão ou da secretaria de estado mais próxima. Encenado o Dia do Juízo sob o magistério da CNBB, talvez assim se possa imaginar o interrogatório mais temido por toda criatura: diante da pergunta do Justo Juiz sobre o que fez aos pobres, quando famintos, sedentos, nus ou doentes, poderá a alma em julgamento, sorrindo e transbordando de orgulho cívico, responder: ?Senhor, eu vos indiquei uma Política Pública?..

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