Opinião
Literatos e o sobrenatural

DOM FERNANDO IÓRIO * O Sobrenatural invadiu a natureza humana, desde aquele sagrado momento em que o Verbo de Deus foi semeado no ventre daquela mulher, única na história do mundo: Maria. Estava, de então por diante, o Filho de Deus incorporado à vida dos seres humanos. Era o invisível de Deus tornado palpável no semblante e nas ações de Jesus Nazareno, presente no tempo e no espaço dos homens e das mulheres. Nada, sem dúvida, mais impressionante nesse momento da história, como inúmeros literatos revelam aquele gosto acentuado por aquilo que Newman chamava de ?realidades invisíveis?. No Brasil, dentro do Movimento Modernista de 1922, o Grupo Festa defendia as realidades sobrenaturais, tendo à frente o escritor Tasso da Silveira. Seguiram o caminho do religioso escritores, poetas e romancistas, como Jackson de Figueiredo, Perilo Gomes, Gustavo Corção, com a ?Descoberta do Outro?. Dentre tantos, avulta a figura de Alceu Amoroso Lima (Trystão de Ataíde), a explicitar em quase todos os seus livros o mistério do Sobrenatural, mormente em ?Meditações sobre o Mundo Interior?. A partir de ?Tempo e Eternidade?, publicado em 1935, juntamente com Murilo Mendes, penetra, em cheio, Jorge de Lima no tema do Catolicismo, explorando-o, através de textos bíblicos, da mitologia cristã e de uma imaginação pessoal, em que se incluem a formação religiosa familiar e o fastígio folclórico, em torno das novenas e festas de uma região rica em tradições populares, como é nossa Alagoas. Podemos ler em um de seus versos: ?poesia tirei de tudo/para oferecer ao Senhor?. É a universalização de sua nova concepção, sintetizada na concepção da ?ilha?, vista como o paraíso perdido, próximo de Deus, que vai desaguar na portentosa obra ?Invenção de Orfeu? que respira o sobrenatural. Sob o signo do sagrado, suas referências imediatas são, primeiramente, dirigidas a Deus: ?Aceito as grandes palavras eficazes/e os caminhos queDeus pôs diante de mim?. O religioso de Jorge de Lima se agiganta em ?Túnica Inconsútil?. O poema inicial desse livro, ?Poema do Cristão?, respira uma temática religiosa: ?Porque o sangue de Cristo/ jorrou sobre os Seus olhos,/a minha visão é universal?. Sucedem-se emoções ritmadas, como: ?Sou ubíquo; estou em Deus e na matéria,/compreendo todas as línguas, todos os gestos, todos os signos/... Sou inconsútil como a sua túnica/sou numeroso como sua Igreja?. Trata-se de uma poesia em comunhão com a esfera do sagrado. Quando gravemente enfermo, Jorge de Lima recebeu a visita amiga de Alceu Amoroso que o saudou: - Como vai Jorge? Como está de saúde? ? ?Vou muito bem: Pronto para encontrar-me com Deus?. (*) É BISPO DE PALMEIRA DOS ÍNDIOS