Opinião
Como esquecer seu cheiro sedutor, princesa?
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1960: quatro horas e trinta minutos da madrugada, o menino sobe os três degraus da Marinete do seu Antônio Monteiro, pioneiro no transporte coletivo intermunicipal. Tempos depois se consolida como empresa poderosa chamada Auto Viação Progresso Ltda. Uma companhia de ônibus que fez história em Alagoas, liderada por um grande e abnegado empresário à época. Pai e mãe com corações palpitando foram embarcar o filho que lacrimejava sentindo no peito o aperto da saudade. Também deixaria para trás uma cria de estimação, um gato-do-mato, presente de um tio, criado desde bebê alimentado com leite de cabra na mamadeira. O pelo tinha as marcas do temido felino, lindo como uma onça. Era uma oncinha mesmo! Além da maleta quadrada que guardava os calças curtas, camisetas, pijama listrado e pertences de higiene, não poderia faltar a tradicional lancheira com Mariolas, o pacotinho de bolacha Maria e uma garrafinha com ponche de laranja. Viagem longa, estrada de barro cheia de buracos, muitas paradas, seis horas de solavancos, lágrimas ensopando a melhor camisa escolhida pela mãe, preservando a elegância combinada com sapato e meia branca até a canela. Assim cheguei em Palmeira dos Índios, por volta de uma hora da tarde sendo esperado por João Motorista num carro Ford Preto ano 1948 que me levaria à casa de outro tio onde seria seu hóspede por maravilhosos dez anos. Entre Pão de Açúcar e Maceió, como contei na penúltima coluna, questionada por alguns fiéis companheiros de adolescência por não ter registrado essa página da história. A Princesa do Sertão foi o berço da minha educação escolar onde vivi por uma década até a mudança definitiva para a capital, em 1970. Há dois anos escrevi uma crônica intitulada “Meus três amores”, que fizeram e continuam fazendo parte inesquecível da minha vida. Palmeira dos Índios, entre os anos cinquenta e sessenta, foi uma fonte inesgotável da cultura alagoana. Riquíssima de escritores filhos naturais e tantos que a adotaram como terra natal. Difícil nominá-los para não cometer o risco de injustiça. Assim como jornalistas premiados e destaques pelo Brasil afora; atores, poetas, artistas da música regional, brilhantes profissionais do rádio, medicina, direito e engenharia. Tudo isso graças ao nível educacional dos colégios liderados por respeitadíssimas congregações religiosas, nacionais e estrangeiras, incluindo-se a escola pública que nada deixava a desejar quanto a qualidade e dedicação dos seus docentes. Foi uma cidade política de destacadas lideranças no legislativo e executivo estadual e federal. Foi igualmente pródiga e considerada modelo pela eficiência das unidades de saúde e competência dos profissionais da medicina. Quando a gente conquista já quase o topo na difícil subida da montanha da vida, com determinação e coragem para o trabalho, nem lembra desse negócio de terceira idade. E quando os clarins anunciam a chegada do carnaval, melhor relembrar a juventude dos momentos deliciosos de alegria e felicidades do reinado de Momo em Palmeira dos Índios: dez dias de maratonas na Praça da Independência; blocos inesquecíveis como os Cangaceiros; bailes do Aeroclube, AABB, Monte Pio, Maloca do Índio; o alvorecer curando ressacas energizando o corpo para um novo dia de incontida alegria. O carnaval da princesinha do sertão tinha o gostinho sedutor do congraçamento e prazer!