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Opinião

A pandemia: foco, disciplina e ciência

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Por Marcos Davi Melo. médico e membro da AAL | Edição do dia 04/04/2020 - Matéria atualizada em 04/04/2020 às 06h00

Quando Osvaldo Cruz declarou que pagaria 300 réis por rato trazido para a Diretoria Nacional de Saúde Pública, o equivalente ao Ministério da Saúde atual, um espertalhão chamado Amaral apareceu com uma quantidade enorme de roedores mortos. Preso, confessou: criava ratos para vender ao governo (“mas só ratos cariocas”, disse em sua defesa). Era 1903 e a ciência já identificara que os roedores eram os transmissores da peste que então assolava o País.O Rio de Janeiro era então tão insalubre que os navios mercantes internacionais evitavam aportar ali para comercializar as suas mercadorias, dificultando os embarques de café, na época o principal produto de exportação e a principal fonte de divisas para cobrir a enorme dívida com os bancos ingleses. Mas o País todo vivia uma crise sanitária gigantesca: doenças transmissíveis, como febre amarela, peste, varíola, grassavam nas maiores cidades e causavam alta letalidade, como também elevada devastação econômica e social.

Em 1904, Osvaldo Cruz institui a vacinação obrigatória contra a varíola. A população, desinstruída, suspeitava da vacina e recebeu pessimamente os imunizadores. Criou-se a Revolta da Vacina, que explodiu em novembro, contra Osvaldo Cruz e o governo. Fizeram parte dos revoltosos os socialistas, monarquistas, estudantes, sindicalistas, militares e, infelizmente, até médicos. Barricadas surgiram no bairro da Saúde, bondes foram virados, a iluminação pública foi destruída. Houve foco das autoridades no enfrentamento da doença letalíssima, disciplina no combate aos revoltosos e respeito absoluto à ciência. O presidente Rodrigues Alves somou forças com o Exército e a ciência foi vitoriosa. A peste era uma doença que devastava a humanidade há séculos, mas somente com a microscopia se conseguiu identificar que existia um patógeno microscópico que era transmitido pelos ratos, o que não ocorre com o patógeno da pandemia de Covid-19. Pouco conhecido ainda, esse patógeno tem a perturbadora capacidade de realizar múltiplas mutações em sua estrutura, criando novas linhagens; só no Brasil, em pouco tempo, já são 11, o que dificultará muito a elaboração de uma vacina. Sobre a afetividade do seu diagnóstico, só agora saem as primeiras publicações científicas que mostram que a acurácia varia muito com a área onde foi colhida a amostra. Exemplo: amostra do lavado broncoalveolar pode ser positivo em até 93% das amostras, a colheita nasal em 63%, mas a da orofaringe, só em 32%. A percentagem de falsos negativos e subnotificação é, portanto, imensa. Só agora são publicados os primeiros trabalhos randomizados com hidroxicloroquina e ainda são inconclusivos.

Atualmente, temos um ministro da Saúde que tem como lema oficial o foco, a DISCIPLINA e a ciência. Mandetta honra a memória de Osvaldo Cruz, mas Bolsonaro, extremamente indisciplinado, sabota constantemente o trabalho do Ministério da Saúde; usa fakes news para apavorar a população; e o seu único foco é a sua reeleição em 2022. Ele precisa ser contido para que não morra mais gente inocente por suas ações desleais com o ministro da Saúde e com a população brasileira.

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