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Nº 5693
Opinião

A vacinação e seus desafios

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Por Marcos Davi Melo. médico e membro da AAL e do IHGAL | Edição do dia 16/01/2021 - Matéria atualizada em 16/01/2021 às 04h00

É sob o cenário de horror de uma inominável tragédia humanitária em Manaus que a vacinação no Brasil – muito atrasada e correndo atrás do gigantesco prejuízo - finalmente estará começando. Espera-se que a Anvisa aprove os pedidos emergenciais para o uso da vacina do Butantan e da Oxford e em seguida de outras que possam ter segurança compatível. Vamos precisar de todas elas, pois a tarefa de imunizar um público alvo de 160 milhões de pessoas é monumental.

O desafio de realizar a vacinação em tempo hábil eleva-se pela necessidade de usar duas doses na maioria das vacinas disponíveis. Segundo o microbiologista Luiz Gustavo de Almeida, da USP e do Instituto Questão de Ciência, são dois os objetivos claros: atingir a imunidade de rebanho e conseguir a proteção individual das pessoas. O objetivo prioritário é reduzir o número de casos graves e de óbitos, portanto, a precedência é para os grupos mais vulneráveis, como idosos, doentes crônicos e profissionais de saúde, que cuidam de todos os demais. Reduzir a circulação do vírus é um objetivo essencial de saúde pública, mas que só virá a posteriori, com a vacinação de um número elevado de pessoas e que necessitará de muito mais vacinas do que as disponíveis no País atualmente (Coronavac em São Paulo e 2 milhões da Oxford, que deverão ser trazidas da Índia), daí a necessidade de se manter todas as medidas de prevenção, como uso de máscaras, higiene pessoal e distanciamento social. Serão indispensáveis fortes e continuadas campanhas de informação e estímulo patrocinados pelo Ministério da Saúde para essa finalidade. Das três vacinas com processos mais avançados no País (Coronavac, Oxford e Pfizer), cada uma tem as suas características próprias, o que, segundo os especialistas, mostra a necessidade de estratégias diferentes para a utilização de cada uma delas. Para obter a imunidade de rebanho, a Coronavac, com 50,4% de eficácia, precisaria ser administrada em 99% do público alvo, 160 milhões de pessoas, o que exigiria 18 meses. A AstraZeneca/Oxford, com eficácia de 62%, necessitaria imunizar 129 milhões de pessoas, o que demoraria 12 meses. A PfizerBiontech, com eficácia de 95%, precisaria ser aplicada em 81 milhões de pessoas e necessitaria de 5 meses. Na prática, a melhor vacina é a disponível que possibilite maior cobertura, facilidade de distribuição, armazenagem e manutenção, o que significa maior eficiência. A Coronavac poder ser produzida pelo Instituto Butantan, assim como a AstraZeneca promete transferir a sua tecnologia para a Fiocruz, o que sempre necessita algum tempo. A vacina da Pfizer tem uma logística de distribuição e manutenção complexa e é a mais disputada no mercado. Precisaremos de todas as vacinas que possam aparecer com segurança adequada. O desafio de executar bem uma campanha de vacinação com duas ou mais vacinas e em duas doses ao mesmo tempo, exigirá uma execução muito eficiente e competente, mesmo para o SUS, que tem estrutura e notável experiência em campanhas de vacinação .

Precisaremos, sobretudo, de exemplos vigorosos de responsabilidade, dignidade, solidariedade e compaixão humanas, na forma de manifestações de apoio à vacinação de todas as nossas lideranças nacionais, como bem o fizeram os papas Bento e Francisco. Temos um desafio a mais: o ministro da Saúde, general Pazuello, tem se mostrado, além de incompetente, desrespeitoso com a ciência, recomendando tratamentos sem respaldo científico, o que é afrontoso com as milhares de vítimas. O desafio começa por aí.

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