Opinião
As crenças e as evidências
.

A chegada da quarta onda da pandemia de Covid-19 na Europa suscita Carl Sagan quando escreveu “Não é possível convencer um crente de coisa alguma, pois suas crenças não se baseiam em evidências; baseiam-se numa profunda necessidade de acreditar”. A Europa constata o número de infecções e mortes por coronavírus se elevar e introduz restrições direcionadas a pessoas não vacinadas, responsáveis por nova onda de contágios que coloca em risco retomadas econômicas, a saúde pública e um possível retorno às liberdades pré-pandemia. A Áustria passou a restringir o movimento em viagens, trabalho, escolas, comércios e assistência médica de pessoas não vacinadas com mais de 12 anos. Na Alemanha, se constata o ressurgimento de infecções, e a imposição de medidas restritivas aos não vacinados inclui a obrigação de apresentar testes negativos para coronavírus para viajar de ônibus e trem. Na França, doses de reforço tornar-se-ão pré-requisito para pessoas com mais de 60 anos obterem passaportes sanitários. Na Itália, vacinação, recuperação recente de covid-19 ou testes frequentes serão obrigatórios para todos os trabalhadores.
No Leste Europeu, epicentro da nova onda, a Romênia, que tem o segundo menor índice de vacinação da Europa, registra a taxa mais alta de mortes no mundo por Covid-19 por habitantes. Na Bulgária, os hospitais estão lotados. A Rússia e a Ucrânia, que possuem índices de vacinação inferiores a 50%, também adotam medidas restritivas. Mesmo na Espanha e Portugal, que têm altos índices de vacinação, observa-se recrudescimento de casos nos não vacinados. A Coreia do Sul, com 80% de seus 52 milhões de habitantes imunizados completamente, três semanas depois de relaxar as medidas restritivas, viu o número de infectados e mortes por Covid-19 elevar-se. Entretanto, a sua taxa de letalidade é relativamente baixa, 0,8%, se comparada com maio de 2020, antes da vacinação, quando era de 2,4%, evidência de que as vacinas funcionam, mas que também é indispensável manter as medidas de proteção não-farmacológicas.
A nova onda da pandemia obriga a efetivação de crescentes lockdowns na Europa. Um retorno à normalidade decorrente do sucesso das campanhas de vacinação fica ameaçado pelas pessoas que não se vacinam, oferecendo espaço para o vírus se proliferar e mutar.
Existem no Brasil 21 milhões de pessoas que estão atrasadas para a segunda dose e não estão imunizadas, sobrepujando em urgência sanitária a 3ª dose ou dose de reforço para toda a população. A vacinação em menores entre 7 a 14 anos tem respaldo científico, pois além de a infecção poder levá-los ao óbito (mil óbitos de menores nos EUA por Covid-19), eles podem ser acometidos, ficar assintomáticos, mas infectar idosos, mesmo vacinados, porque a sua imunização decresce bastante com o tempo. As evidências sugerem que a Covid-19 tornar-se-á uma endemia como a gripe. Para conviver com ela será necessário que a sua taxa de mortalidade seja igual a de um resfriado comum que é de 0,1% e só a vacinação ampla, regular e generalizada nos proporcionará isso. A ciência se impõe pelas evidências.