app-icon

Baixe o nosso app Gazeta de Alagoas de graça!

Baixar
Nº 5824
Opinião

construindo um futuro de mulheres, por mulheres e para mulheres

.

Por Candice Mascarello - engenheira | Edição do dia 08/02/2023 - Matéria atualizada em 08/02/2023 às 04h00

Não é preciso ir longe, nem fazer grandes reflexões, para identificarmos efeitos negativos que uma sociedade que ainda mantém moldes patriarcais tem na vida profissional das mulheres. Infelizmente, passamos por diferentes situações desde muito cedo, e que nos acompanham durante toda carreira. A começar pela educação. Nesta fase de formação, meninas comumente são menos incentivadas a seguirem caminhos disruptivos nas áreas da ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM, na sigla em inglês), por exemplo. Sim, um levantamento feito pela UNESCO mostra que, no Brasil, apesar das taxas de matrícula entre estudantes dos sexos masculino e feminino serem similares em todas as etapas de ensino, poucas mulheres são matriculadas em cursos dessas áreas, que em média apresenta maiores remunerações e ascensão coorporativa. Em uma sala de 30 estudantes de computação, por exemplo, elas são apenas 13%.

Já durante o trabalho, o desafio a ser superado é a expectativa social de que a responsabilidade pelos cuidados com a casa e os filhos é prioritariamente delas. Uma recente pesquisa do Boston Consulting Groupdescobriu que 60% das mulheres já tiveram que declinar uma oferta de trabalho por conta das tarefas domésticas, mostrando que no mundo todo, e não só no Brasil, ainda há uma cultura que não prioriza profissionais femininas. Quantos talentos e trajetórias brilhantes são perdidos por conta disso?

Outro ponto a destacar são os vieses inconscientes que estão muito presentes na vida cotidiana da mulher - como ilustra a autora inglesa Mary Ann Sieghart em seu livro A Lacuna de Autoridade. Na publicação, ela fala sobre o descrédito vivido por mulheres em diversas áreas tradicionalmente dominadas por homens, como política, negócios, ciência, entre outras. A situação se manifesta em pequenas ou grandes atitudes já bem conhecidas por nós: interrupções quando estamos falando, explicações redundantes sobre nossas ideias, invisibilidade ou rejeição de figuras femininas em posições de liderança.

É evidente que ações precisam ser tomadas para que tenhamos acessos a oportunidades tão relevantes quanto as dos homens. Creio que debater cada vez mais esse cenário, dando visibilidade a essa desigualdade, é um mecanismo poderoso para encontrarmos soluções urgentes. Há pouco tempo, tive uma boa chance de entender mais como outras executivas, líderes de diferentes empresas e setores, pensam sobre o assunto. Foi durante um evento organizado pelo BCG, o Mulheres na Arte, que tinha como mote abordar a presença feminina em diferentes esferas, a partir de um contexto que abrangia arte, conversas mais informais e networking. A ocasião ajudou a entender a necessidade de nos unirmos não só como mulheres, mas como profissionais, pois apesar de backgrounds tão diferentes, todas ali já haviam experienciado o desafio de ser a única em ambientes predominantemente masculinos, além da falta de um exemplo feminino a ser seguido e de incertezas sobre a carreira. O encontro com essas mulheres poderosas e inspiradoras me deixou otimista e ainda mais segura de que é primordial batermos na tecla da diversidade no meio corporativo -- sem medo de ser mal interpretada ou parecer repetitiva. E argumentos para isso não faltam. Um outro estudo realizado pelo BCG, em conjunto com o Peterson Institute for International Economics, conseguiu comprovar que empresas com pelo menos 30% de líderes mulheres têm aumento de 15% na lucratividade em comparação a negócios semelhantes sem diversidade no topo. É um claro sinal do nosso potencial para os negócios -- e isso não pode ser ignorado!

Para mim, um tópico que deveria fazer cada vez mais parte da realidade das profissionais femininas é a mentoria. Aprendemos com modelos, com exemplos, e ver a representatividade com os próprios olhos é um estímulo mais que significativo. Posso dizer com tranquilidade que sou um reflexo disso, apesar de estar constantemente inserida em ambientes com presença reduzida de mulheres tive em casa exemplos muito fortes de liderança feminina, em minha avó, mãe e tias que foram pioneiras em suas universidades e posteriormente em suas carreiras, e igualmente importante, tive em meu avô e meu pai exemplos de homens que quebraram paradigmas em suas atuações como pais, maridos e profissionais, com comportamentos arrojados até para os dias de hoje. Mas essa não é a realidade da maioria, e precisamos buscar mecanismos para que os exemplos apareçam.

Com alguns estudos, já identificamos outras ações que podem colaborarpara nossa trajetória, como, por exemplo, viabilizar diferentes caminhos de progressão de carreira rumo à liderança, considerando profissionais que não seguiram um caminho tradicional -- como reintegrar alguém que ficou fora do mercado após um período de transição; promover interações entre a equipe e, mais do que isso, incentivar conversas significativas entre líderes e demais colaboradores, visando a uma distribuição de oportunidades mais justa. Tenho o privilégio de trabalhar em um lugar onde as necessidades de todos são valorizadas e que se mostra receptivo às mudanças, como a elaboração de processos seletivos e seções de treinamento específicos para mulheres. Uma licença parental universal, como a que temos no BCG, por exemplo, é benéfica para todos de uma família e, além de colaborar para o empoderamento econômico das profissionais, gera um impacto de longo prazo na sociedade, contribuindo a diminuir a desigualdade salarial, de oportunidades e reduzir o estigma histórico das mulheres como cuidadores principais, pontos essenciais quando falamos em um mercado de trabalho mais equalitário.

Por fim, mas não menos importante, precisamos também atuar concretamente nos processos seletivos, garantir a remuneração correta e oferecer oportunidades iguais de promoção. Há um mito de que mulheres são menos ambiciosas e procuram menos promoções, mas existem dados que comprovam que somos tão audaciosas quanto eles, por isso a necessidade de nos mantermos atentas e resilientes. Somos parte de algo maior, de um futuro que já é palpável. Vamos, juntas, construir uma sociedade mais equânime?

Mais matérias
desta edição