Opinião
Exemplar Borges

PASCHOAL SAVASTANO * Jorge Luiz Borges, escritor de expressão universal, confessou em forma de memória: ?Meu pai era inteligente e, como todos os homens inteligentes, muito bondoso?. Em seu espontâneo julgamento filial colocou o valor da bondade como expressão maior do império da razão. Para agraciá-lo com o reconhecimento do equilíbrio de suas qualidades, sentenciou ainda de forma genial: ?Meu pai era um homem tão modesto que teria preferido ser invisível. ?A leveza da sua recordação admitiu poder tornar imperceptível a grandeza e a humanidade de seu destino. O primeiro poema publicado de Borges, quan-do passava um inverno em Sevilha, chamava-se ?Hino ao mar? e chegou a repercutir em Madrid, servindo para aproximá-lo do ambiente intelectual, do final da segunda década do século passado na Espanha. ?Oh mar! oh imenso leito / Que já nos conhecemos há séculos / Ambos com intensa sede de estrelas / Ambos com esperança e desencargos?. Essa inspiração inicial lhe valeu o título de cantor do mar e o levou a conhecer o consagrado Rafael Cansinos-Asséns, cuja amizade motivou seu crescimento cultural e rendeu gratos episódios para sua intensa vida. O grande escritor argentino dedicou um dos seus últimos livros a sua afetuosa e confidente companheira Elsa. Nas palavras de homenagem ao seu solidário amor, deixou registrada uma significativa sentença: ?Todo presente verdadeiro é recíproco?. Mesmo depois que perdeu a visão, Borges continuou a vislumbrar os horizontes da existência, as cores dos sentimentos e a beleza das comoventes verdades. Os admiradores de seus trabalhos exaltam o crescente poder mágico de sua fantasia. No pleno domínio de sua triunfante idade admitiu ser capaz de superar os aspirantes a críticos de sua obra, fazendo uma longa invectiva contra si mesmo. Seguro do esplendor de sua criação, tinha a consciência da necessária humildade que pode levar à verdadeira felicidade. Julgava-se um eterno jovem e achava irrelevante as preocupações em torno das fragilidades e dos sucessos humanos. Dava prioridade a paz, ao prazer do pensamento e da amizade. Tinha uma grande ambição, a de procurar sempre a possibilidade de amar e de ter o privilégio de ser amado. (*) É ADVOGADO