A marcha da insensatez .
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Por Marcos Davi Melo - médico e membro da AAL e do IHGAL | Edição do dia 09/09/2023 - Matéria atualizada em 09/09/2023 às 04h00
Escreveram que a história se repete como farsa, o que poderia significar que vivemos em uma eterna farsa, já que tudo o que a história faz ao longo dos séculos é se repetir. Os tormentos que o mundo e o Brasil vivem nos remetem à obra “A Marcha da Insensatez”, da historiadora norte-americana Barbara Tuchman, duas vezes vencedora do Pulitzer. A obra trata de um dos grandes paradoxos da humanidade: a insistência dos governos em adotarem políticas contrárias aos próprios interesses.
O livro cobre quatro conflitos históricos em que decisões erradas daqueles que estavam em posições de liderança tiveram consequências catastróficas: a Guerra de Troia; a Reforma Protestante; a Independência dos Estados Unidos; e a Guerra do Vietnã. A reflexão mais interessante, eu diria até assustadora, é a completa incapacidade de governantes (e governados) enxergarem quando estão repetindo exatamente os mesmos erros trágicos do passado - muitas vezes, um passado bem próximo.
Em outra obra, “Um Espelho Distante – O Terrível Século XIV”, publicada em 1990, a autora fez preocupantes paralelos entre a vida contemporânea e um período quase esquecido da história da humanidade. Um desses paralelos envolvia a Peste Negra e a corrida nuclear, preocupação atualíssima, como se constata com o negativismo na pandemia de Covid-19 e a Guerra da Ucrânia. A verdade é que, por mais paradoxal que possa parecer, se quisermos entender o futuro, precisamos olhar para o passado.
No Brasil de hoje, como em muitos países, para alguns, a única alternativa a um governo radical de esquerda ou direita parece ser um governo radical de direita ou esquerda. E esse insano pêndulo político tem algo de foice: conforme balança abruptamente, de um lado ao outro, vai cortando e destruindo tudo por onde passa. Se tivéssemos dedicado mais atenção aos livros e a história, saberíamos que um governo radical, seja de esquerda ou de direita, jamais foi capaz de promover a felicidade ou o bem-estar de forma sustentável. Ditaduras sempre se tornaram fonte de trevas, perseguições e exclusão de direitos. Independentemente das intenções e valores dos ditadores ao chegar ao poder - de Hitler a Stálin, de Fidel Castro a Saddam, dos militares de direita do Brasil aos militares de esquerda da Venezuela -, o resultado final sempre foi (e sempre será) trágico.
No momento, a Marcha da Insensatez de governos e de governados em reconhecer os problemas que mais os ameaçam - inclusive a sua sobrevivência -- pode ser resumida na questão climática, do aquecimento global, cruelmente presente em hecatombes como na tragédia que se abateu sobre o Rio Grande do Sul nesta semana e o pior e mais quente verão da história do hemisfério norte. Precisamos dar voz, escutar, aceitar e agir com o que a história, a ciência, a moderação, o equilíbrio e o bom senso nos ensinam e nos recomendam.