O limite da simples razão não pode ser ultrapassado pela imposição
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Por Oswaldo Gouveia Filho - procurador de Justiça do Ministério Público de Pernambuco | Edição do dia 27/10/2023 - Matéria atualizada em 27/10/2023 às 04h00
Para se compreender a guerra que se desenvolve no Oriente Médio, impõe-se abeberar-se nas fontes de informação da história do povo de Israel, próxima do quarto milênio. Entender os fatos que se desenvolvem atualmente naquela região descontextualizando-os de uma trajetória que se mantém atualizada através dos séculos na dicotomia, povo/estado, é impossível e inadmissível.
Estávamos em 1947. Encontrava-se no proscênio do palco do mundo um brasileiro nascido nas coxilhas e pampas do Rio Grande do Sul: Oswaldo Aranha. O palco era a Organização das Nações Unidas (ONU), presidido pelo gaúcho em sessão especial. Ali ficou decidida a criação do Estado de Israel e também a existência de um Estado Árabe. A Resolução 67/19 atualizava o Estatuto da Palestina como entidade observadora.
Abba Eban foi durante muito tempo representante de Israel nas Nações Unidas e também ministro do Exterior. Na década de 1960 publicou a História do Povo de Israel que remonta a era dos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó, correspondente entre 2000 a.C e 1100 a.C. Eles foram os primeiros líderes religiosos do povo judeu. Os judeus foram guiados por Abraão para migrarem da civilização mesopotâmica em busca de melhores pastagens e de terras mais férteis, se deslocando até a região da Palestina, em Canaã, a “Terra Prometida”.
Não obstante os referenciais bíblicos, existem discordâncias quanto à conquista de terras. Considerando-se que o Livro dos Juízes fala de uma incursão demorada e escalonada, o Livro de Josué aponta na direção de uma ação militar rápida. O próprio Abba Eban, dotado de uma erudição singular, admite incongruências e incertezas, sendo fato que os cananeus, como descrito na Bíblia, viviam na região de Canaã. Diz ainda Abba Eban que a expressão cananeus seria uma identificação coletiva “para todos os habitantes sedentários da Palestina antes da conquista hebréia. Cogitando-se que os filisteus também habitavam a região”.
Como se vê, tantas digressões e até mesmo divergências, espantam a linearidade das narrativas.
Seja como for, existem razões plausíveis colocadas nas negociações em dois momentos históricos. A primeira quando a recém criada Organizações das Nações Unidas recomendou a aplicação do plano de partição da Palestina através da Resolução 181, que propunha a divisão do país em dois Estados, um árabe e outro judeu. Pela proposta, a cidade de Jerusalém teria um status de cidade internacional - um corpus separatum, sob a supervisão da ONU como medida preventiva para evitar conflitos e, se necessário, dirimi-los. O segundo, o Acordo de Paz de Oslo, na Noruega, e registrado em 13 de setembro de 1993 nos Jardins da Casa Branca em Washington, firmado por Ytzhak Rabin e Yasser Arafat, representando respectivamente o Estado de Israel e a Organização para a Libertação do Estado da Palestina (OLP), com mediação do então presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton.
Segundo relatos, Rabin teria dito no momento: “Nós lutamos contra vocês, palestinos, dizemos hoje com voz forte e firme: “Basta de sangue e de lágrimas. Basta!” Em seguida, Rabin e Arafat apertaram as mãos.
Em 1994, por conta do seu pacifismo, Rabin recebeu o Prêmio Nobel da Paz ao lado de Yasser Arafat e Shimon Peres, então chanceler de Israel.
Em 4 de novembro de 1995, quando participava de um comício pela paz na antiga Praça dos Reis, em Telavive, hoje Praça Yitzhak Rabin, Rabin foi assassinado por Yigal Amir, um estudante judeu ortodoxo, militante da extrema-direita, contrário às negociações de paz. Em 13 de setembro o Acordo de Oslo completou 30 anos.
Quando a aviação israelense bombardeou Beirute, a capital do Líbano, no mês de julho de 1981, visando atingir a sede da Organização Para a Libertação da Palestina e causou a morte de 300 civis, não havia dúvidas que ocorrera um ato de terrorismo da maior gravidade.
Quando o Hamas bombardeou Israel, neste mês de outubro de 2023, também não havia dúvidas que se tratava de um execrável ato terrorista.
Não existe lado bom no terrorismo.
Atento a tudo isso, Yasser Arafat, em entrevista concedida em 26 de agosto de 1981 ao repórter Marcos Antônio Resende, que a publicou em revista de grande circulação nacional, admitiu que dificilmente o Estado Judeu vai desaparecer para dar lugar a um Estado Palestino. E concluiu: nesse caso a solução do problema passaria antes pelo reconhecimento mútuo das duas realidades.
Como se constata, a extrema-direita que provocou o holocausto, age para impedir que a maioria das nações consigam obter a paz que o mundo deseja. Os caminhos estão abertos e apontados: cumprimento da Resolução da ONU e cumprimento do Acordo de Oslo. Nesse aspecto, a diplomacia do governo brasileiro opera com maestria no desempenho contemporizador e mediador, em consonância com os países pacifistas.
Lideranças mundiais responsáveis já se pronunciaram. O papa Francisco disse: “Estamos vivendo uma guerra mundial em pedacinhos.
“Immanuel Kant, na sua obra A religião nos limites da simples razão, no prefácio da primeira edição de 1793 afirma categoricamente: “A moral não tem necessidade alguma de religião, mas basta-se a si mesma, graças a razão pura e prática.
“Relendo um livro que me foi presenteado, com dedicatória, por um coronel velho amigo, me detive em um trecho da obra: “Quando cercar um exército, deixe uma saída livre. Isso não significa que permita ao inimigo fugir. O objetivo é fazê-lo acreditar que é um caminho para a segurança, evitando que lute com a coragem do desespero. Pois não se deve pressionar demais um inimigo desesperado.” O nome do livro é: A Arte da Guerra. O nome do autor: Sun Tzu. Foi escrito na China há 2.500 anos.
Continua atual!