Opinião
Uma a��o generosa

JOSÉ MEDEIROS * Os dias maiores da Semana Santa tinham, para mim, um efeito semelhante aos longos dias de chuva de inverno, escuros e de poucas manifestações de alegria. Isso vem de muito longe. Na minha adolescência, durante a quinta e a sexta-feira da Paixão, não se comia carne, rádios tocavam músicas dolentes e religiosas. Com a família, eu acompanhava as cerimônias religiosas e litúrgicas, ainda proferidas em Latim, em que predominavam os cânticos gregorianos. Relembrando esse passado, encontro explicações para esses sentimentos guardados e atenuados com o passar do tempo. Recebi do meu amigo o ilustre médico psiquiatra Rostan Silvestre a cópia de uma historieta muito humana, de autor desconhecido, que, com diversos ajustamentos, na forma e no tamanho, reproduzo para o leitor. Um dia, um rapaz pobre que vendia mercadorias, de porta em porta, para pagar seus estudos, viu que só lhe restava uma simples moeda de dez centavos no bolso. Tinha fome. Decidiu que pediria comida na próxima casa que encontrasse. Bateu à porta. Porém, seus nervos o traíram, quando uma encantadora mulher jovem a entreabriu. Acanhado, ao invés de comida, pediu um copo dágua. Como o jovem parecia faminto ao invés de água ela lhe deu um copo de leite. Ele o bebeu devagar, olhando-a sempre, e depois perguntou: Quanto lhe devo? Não me deve nada. E continuou: Minha mãe sempre me ensinou a nunca aceitar pagamento por uma ação cristã. Ele agradeceu comovido. Quando Charles Kelly saiu daquela casa, sentiu-se fisicamente mais forte, e, principalmente, sentiu ampliada sua crença em Deus. Já estava resignado a abandonar todos os seus sonhos. Mas, reagiu, e resolveu enfrentar as batalhas do dia-a-dia. Anos depois, essa jovem mulher ficou gravemente doente. Os médicos locais não encontraram solução para o caso dela. Finalmente, enviaram-na à cidade grande, onde chamaram um especialista para estudar a rara enfermidade. Chamaram o Dr. Charles Kelly. Quando escutou o nome do lugar de onde a paciente proviera (era sua cidade), ficou extremamente curioso. Ao ver a paciente, reconheceu-a, imedia tamente. Recordou o episódio do copo de leite. Ela não se lembrou dele. Decidiu fazer o melhor que pudesse por aquela mulher que lhe estendera a mão. Depois de meses de luta para salvar a enferma, ele conseguiu recuperá-la. Mas, os gastos com o tratamento tinham sido enormes. Quando ela recebeu a conta teve medo de examiná-la, porque sabia que levaria o resto da sua vida para pagar todas as despesas. Finalmente, quando viu a fatura, algo lhe chamou a atenção, pois estava escrito o seguinte: Totalmente paga, há muitos anos, com um copo de leite. Assinado: Dr. Charles Kelly. Lágrimas de alegria correram dos olhos da mulher. O amor de Deus se manifestara nas mãos e no coração daquele homem. Então ela refletiu: o que você faz hoje poderá fazer a diferença em sua vida amanhã. Feliz Páscoa! (*) É MÉDICO E EX-SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO E DE SAÚDE