Opinião
Oásis Jatiúca .
.

Cícero Péricles, em sua obra “Formação Histórica de Alagoas”, nos apresenta uma Pajuçara envolta pela luxuriante vegetação natural da Floresta Atlântica, onde entre árvores frondosas o pau-brasil predominava. Floresta e fauna ricas em frutos e dádivas que enxiam os olhos e as barrigas dos Caetés que por aqui viviam. Era um paraíso tropical.
Félix Lima Júnior, em sua obra “Maceió de Outrora”, descreve Maceió no início do século XX e do sobrado de taipa e biqueira onde morava, com portas de cedro e três janelas envidraçadas, com grades de ferro, “no qual, uma vez ou outra, principalmente em noites de luar, aparecia, sem prévio anúncio, fazendo as suas viagens e alarmando a minha família, a alma do negro Faustino, que fora in ilo tempore, escravo de minha avó materna, a austera professora Argemira Wanderley Leal, de saudosa memória”.
Continua Félix Lima Júnior: “Embora libertado pela Princesa Isabel em 13 de maio de 1888, ficou preso, pela estima à minha mãe, que visitava enquanto viveu e os seus afazeres o permitiam. Aparecendo em nossa casa, depois de morto, deu margem a que alguns parentes meus, gente de imaginação poderosa e fértil, depois do susto por que passava, ficassem convencidos de que o cativo deixara uma botija na parte térrea do prédio”.
Ainda pegamos a Pajuçara onde, perto do atual Marco dos Corais, existiam uns currais de pescadores nos quais mergulhávamos e pegávamos lagostins que iam direto para a panela ainda se mexendo; dos dias finais do Gogó da Ema; dos Sete Coqueiros intactos entre extenso coqueiral. É inevitável que tanta beleza natural seja cobiçada por moradores e por empreendimentos imobiliários.
Mas também é inevitável a perplexidade diante da informação de que o Hotel Jatiúca pode dar lugar a grandes espigões. O Jatiúca e a Lagoa da Anta, onde o cidadão pode observar as tartaruguinhas nadando placidamente em sua superfície, é um refresco para mente humana, é como se estivéssemos em um lugar distante, longe dos atropelos da cidade. É um oásis entre a selva de pedras que avança pelo litoral; uma última lembrança daquele paraíso tropical original; uma parte de nosso patrimônio geográfico e afetivo. Ali, esquecemos por alguns momentos as coisas ruins que estão acontecendo no mundo lá fora.
Entre os apreciadores daquele oásis do Jatiúca existe uma confraria que regularmente faz um café da manhã em torno do pediatra Milton Hênio. Eles ocupam aquela privilegiada varanda em frente ao mar. Um dos confrades é o Félix Oiticica, respeitado médico ortopedista e, coincidentemente, filho do autor de “Maceió de Outrora”. Segundo um dos membros dessa confraria, caso o Bebé, como carinhosamente os amigos o chamam, tenha achado e guardado a botija do velho Faustino, eis a hora para praticar uma boa ação: ou o Bebé compra outra varanda semelhante ou, pelo menos, distribua uma lasquinha dela para os confrades mitigarem um pouquinho da tristeza por perderem o seu recanto favorito. Maceió sem o oásis do Hotel Jatiúca? Se alguns dos confrades ficarem entristecidos e quiserem beber um vinho pra espairecerem e esquecerem disso, quem seria eu para os culpar?