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Nº 5759
Opinião

Um tango argentino .

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Por Marcos Davi Melo - médico e membro da AAL e do IHGAL | Edição do dia 18/11/2023 - Matéria atualizada em 18/11/2023 às 04h00

Publicado em 1930, no livro “Libertinagem”, o poema “Pneumotórax”, do poeta Manoel Bandeira (1886-1968) se tornou um clássico do modernismo brasileiro. Em poucos versos, vemos a história do eu-lírico que apresenta problemas pulmonares graves e sem soluções médicas. Com uma dose de humor e ironia, Bandeira termina o seu poema com uma conclusão inesperada: como o médico não lhe dá esperanças, o poeta exclama: “A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”.

Na década de 1890, os argentinos estavam entre os povos mais ricos do mundo, comparavam-se aos ianques e estavam muito acima dos infelizes irlandeses e noruegueses, que haviam perdido sua população para a imigração. Atualmente, a Argentina é a 69ª entre 167 países, está entre a Líbia e o Cazaquistão. Os ianques estão em nono lugar, os irlandeses em quinto e os noruegueses em primeiro. Entretanto, a Argentina é um país repleto de recursos naturais.

Segundo Pepe Mujica, “a Argentina é indecifrável, por uma mitologia, o Peronismo”. Peron foi um militar e político que se utilizou inicialmente dos sindicatos, depois o peronismo metamorfoseou-se entre a esquerda, a direita e o fascismo, seguindo sempre uma linha populista. Os Kirchner - Nestor e Cristina - assumiram esse legado que sobreviveu às custas de um distributivismo fiscal irresponsável que levou o país ao descontrole inflacionário, à pobreza crescente e a dolarização disfarçada, mas franca, de sua economia.

A Argentina é campeã de tentativas de planos de estabilização econômica fracassados. Foram doze, o dobro do Brasil, mas nenhum conseguiu resultados próximos ao Plano Real. É profícua em golpes militares, executados em 1930, 1943, 1955, 1962, 1966 e 1976, quando se instalou a última ditadura militar, que levou o país a uma guerra irracional com o Reino Unido pelas Ilhas Malvinas e a uma derrota fragorosa, quando 649 argentinos foram mortos.

A redemocratização do país teve em Raul Alfonsin o seu primeiro presidente civil. Sucedido em revezamentos pela esquerda e direita, e a Argentina, mesmo com todos os seus imensos problemas, ainda tem uma renda per capita maior do que o Brasil, uma população escolarmente mais educada que enfrentará neste domingo, 19, uma eleição cujo candidato governista é o ministro da Economia, com uma inflação que está acima de 140% ao ano, e um candidato ultraliberal que está longe do Liberalismo adulto de Adam Smith (1773-1790) e Frederich Hayech (1899-1920) e cujas propostas radicais são julgadas inviáveis pelo presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto.

Na democracia a escolha do eleitor se faz diante das ofertas de candidatos. A Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, logo abaixo da China e dos EUA, e o que lhe acontecer é de altíssimo interesse nacional. Manoel Bandeira, diante de tantas oportunidades que a vida lhe ofereceu - e ele perdeu -, resignava-se a escutar um tango argentino. Que a Argentina não se resigne a escutar o dramático, mas um belo tango, e consiga eleger um candidato que possa iniciar um afastamento definitivo do Peronismo e do Kirchnerismo e de todos os populismos que tem combalido um país com tanto potencial.

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