Liberdade de imprensa X crimes contra honra .
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Por PAULINO FERNANDES – defensor público e professor, pós-graduado em Direito Processual Penal | Edição do dia 07/12/2023 - Matéria atualizada em 07/12/2023 às 04h00
Volta e meia, deparamo-nos com decisões judiciais que deixam interrogações em relação aos impactos que trarão.
Nesses dias, foi a vez de se ressuscitar o tema que afeta, diretamente, a liberdade de imprensa, enquanto direito fundamental consagrado constitucionalmente.
O que deixou muitos perplexos, além do contexto em que se deu a decisão, foi a ausência de maior exatidão quanto à sua aplicação e, consequentemente, o alcance da tese firmada no julgamento.
Embora a matéria tenha sido pautada no campo das questões de repercussão geral (que é um pressuposto para se manejar o recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal), a legitimidade em si não isenta o julgado de questionamentos, já que o tema é complexo e de aplicação ampla e difusa.
O caso representativo do julgamento ocorreu em outras condições de tempo e de circunstância, sendo isso um primeiro ponto a se refletir. Tratou-se de uma entrevista veiculada no Jornal Diário de Pernambuco em que o entrevistado imputara a prática de crime a outrem.
O trecho do texto da tese fixada mais nodal é o que prevê a responsabilidade dos veículos de comunicação quando publicada a notícia da qual não se tenha absoluta certeza de que seja verdadeira.
De cara, já se vê que não é tarefa nada fácil se aferir quanto de verossímil possa conter uma notícia, principalmente quando a exibição se der de forma AO VIVO, já que é humanamente (porquanto também juridicamente) impossível se aquilatar os elementos de veracidade no ato da entrevista.
Mesmo quando se tratar de gravação que pode, portanto, ser levada ao ar (por imagem ou áudio), posteriormente, ou nos casos de matéria impressa, em que se conta com o recurso da edição, existe, naturalmente, uma margem de erro, considerando que nem os órgão de investigação policial e judicial conseguem concluir de forma absoluta, autoria e materialidade delitiva em pouco tempo.
Daí, tantos casos que são noticiados não só na mídia, mas no próprio convívio humano-social sofrerem alteração depois de anos do acontecimento, com reviravoltas oriundas de depoimentos ou de outras provas documentais, a que não se teve acesso quando das primeiras notícias.
No Direito Processual Penal pátrio, consagrou-se o princípio da verdade real, ao invés da verdade meramente formal, própria do civil. Esse norte é buscado, por todos os meios juridicamente possíveis, a fim de que não se tenha uma condenação ou absolvição injusta.
Ora, se essa tarefa, que é exercida pelo próprio Judiciário, exige não só o competente conhecimento técnico, mas o empreendimento de diligências para obtenção dessa verdade, que exigem um aparato específico, e ainda assim não há conclusões cem por cento infalíveis, o que dizer do trabalho de imprensa, que não conta com todo esse aparato técnico.
Cremos, com quase absoluta certeza, que o tema será revisitado pelo STF, o qual deve proferir uma decisão mais razoável e condizente com a nossa realidade de mundo atual, até por uma questão de justiça.