Opinião
O Ac�cio de Garanhuns

Ronald Mendonça * Ainda abalado com o desagradável encontro com o leão do Imposto de Renda, somente agora está sendo possível fazer algumas reflexões sobre as falas de improviso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na intimidade, o Acácio de Garanhuns. Na realidade, o acerto de contas que os assalariados são obrigados a cumprir anualmente com o governo, por meio da Receita Federal, é a repetição esculpida e encarnada da fábula O Lobo e o Carneiro, onde, evidentemente, o lobo não é o contribuinte. Uma das grandes ironias desse rendez-vous fiscal reside justamente na desigualdade de forças, na poderosa armadura legal e punitiva que nos transforma (nós assalariados, insisto) em preás de serpentário. E pensar que um dia alguém já disse que salário não é renda. Voltando ao Lula, o conselheiro Acácio acima referido, o verdadeiro, é um personagem delicioso de O Primo Basílio, obra ímpar do escritor português Eça de Queiroz. Freqüentador da roda de comensais que rondavam a residência do casal Luíza-Jorge, personagens-chave do romance, Acácio é um tipo já maduro, calvo a bem da verdade universal que alia falsa moral conservadora a observações verbais que variam do óbvio ao patético. Tido como um respeitável sábio, não será difícil encontrar nas páginas impiedosas e realistas de Eça expressões como, as conseqüências virão sempre depois, saídas da boca solene do conspícuo conselheiro. Como disse, com uma freqüência cada vez maior, nosso presidente vem tendo recaídas da febre do conselheiro. Guiado por algum faro midiático especial, Lula talvez acredite ser um iluminado e possuidor da sabedoria instintiva, natural, burilada na universidade da adversidade, permitindo-se dar palpites em tudo. À semelhança de Acácio, quando não diz o óbvio, seus improvisos beiram o besteirol. Apesar da pérola quem tem fome quer mais é comer, ouço dizer que o presidente é um homem bem-intencionado. Olhando-se o índice de aprovação popular conclui-se que os eleitores gostam do seu estilo acaciano. Dias desses, por exemplo, falando para crianças carentes, arrancaria lágrimas de emoção ao recomendar que os pequenos sejam obedientes aos pais, mas que não procurem imitá-los naquilo que eles (pais) fizerem de errado. Sua ingenuidade (?) ficou evidente ultimamente quando incitou as pessoas a levantarem o traseiro para buscar juros bancários mais baixos, como se não fosse o seu governo o mentor desses juros obscenos. Mais ainda: esqueceu de que juro bancário é um poderoso e inexpugnável cartel. Com certeza, Conselheiro Acácio não se sairia melhor. (*) É médico e professor da Ufal