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Nº 5808
Opinião

Sexo na igreja

MARCOS DAVI MELO * O Santo Padre é reconhecidamente um homem sábio e não se deve dar crédito aos engajados nas fileiras anticlericais, que afirmam lhe faltar algo fundamental para repudiar a prática do sexo entre os padres e cardeais da sua igreja: a exp

Por | Edição do dia 03/05/2002 - Matéria atualizada em 03/05/2002 às 00h00

MARCOS DAVI MELO * O Santo Padre é reconhecidamente um homem sábio e não se deve dar crédito aos engajados nas fileiras anticlericais, que afirmam lhe faltar algo fundamental para repudiar a prática do sexo entre os padres e cardeais da sua igreja: a experiência. Pode ser verdade, mas não lhe faltam nem as normas canônicas, nem o conhecimento histórico e este lhe dá o respaldo pessoal para resistir às pressões e liberar o celibato entre os seus liderados. Nos idos da alta Renascença a Igreja Católica foi envolvida pelo clima de licenciosidade e ausência de limites predominantes na sociedade de então. O espanhol Rodrigo Bórgia, que viria a ser o papa Alexandre VI, marcou o seu pontificado pelo comportamento desregrado e libertino. Movido não só pela avidez material – já que acumulou vasta fortuna pessoal no papado -, como pela ganância sexual, teve uma vida repleta de escândalos. A sua eleição,  ocorrida em 1492,  foi comemorada  não com o Te Deum de ação de graças normal,  mas com uma  tourada na Praça de São Pedro, quando cinco touros foram abatidos. Suas  extravagâncias pessoais, todavia, remontavam aos tempos de jovem cardeal, quando foi pai de um menino e duas meninas, cujas mães permaneceram desconhecidas. Depois, já na casa dos 40, ganhou mais três filhos e uma filha, nascidos de sua amante oficial, Vanozza de Cataneis, que sucedeu a própria mãe no leito cardinalício. Uma loura belíssima de apenas 19 anos, Giulia Farnese, cujos cabelos louros caíam até os pés, foi a sucessora de Vanozza como a preferida de Alexandre VI. Essa ligação com um homem de 59 anos, 40 anos mais velho, ofendeu até o gosto dos italianos, já acostumados a uma vida privada licenciosa e obrigou a que se fizesse um casamento apressado entre a musa loura e um preposto de ocasião. O papa apreciava que suas amantes fossem casadas, para lhes dar maior respeitabilidade. Alguns dos filhos de Alexandre VI também se notabilizaram pelo descontrole e pela devassidão. Convivendo no Vaticano, César, Lucrécia e Alfonso protagonizaram escândalos repetidos, entre eles um triângulo incestuoso entre os três irmãos, tão forte que resistiu a inúmeros casamentos de Lucrécia, mulher que entrou para a crônica pornográfica como símbolo de fêmea incansavelmente sedenta e ninfomaníaca. O desenrolar da vida desta família caracterizou-se não só pela depravação, como por traições e mortes violentas: Alfonso apareceu boiando no rio Tibre, vítima de incontáveis punhaladas, creditadas ao irmão César, o preferido de Alexandre VI para lhe suceder, mas que abandonou a batina para se dedicar à carreira militar, vindo a sucumbir depois em sangrenta batalha em Navarra. Alexandre morreu em 1503, aos 73 anos, sendo as descrições sobre as suas exéquias as mais escabrosas possíveis. Isto e muito mais está em “A Marcha da Insensatez” da norte-americana Bárbara Tuchman. O fervor erótico de Alexandre VI e sua família influenciou sobremaneira a Igreja em relação a questão, tendo optado pela segurança do celibato alguns anos depois. Seu fantasma ainda hoje contribui para o drama interno da manutenção do celibato, que inferniza a vida de alguns homens eleitos e devotados à missão do evangelicismo. A abstenção sexual é um dogma  que limita a sua opção a um grupo  muito pequeno e especial de seres  humanos, capazes de renunciar ad ternum a um dos prazeres básicos da vida. Não esquecendo, para complicar, que o maior afrodisíaco sexual é a abstenção, o que pressupõe ainda mais dificuldades para o Santo Padre e sua igreja. A pedofilia é uma patologia e comot al deve ser tratada, esteja onde estiver. (*) É MÉDICO

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