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Nº 5759
Opinião

Medicina e picaretagem

RONALD MENDONÇA * A revista Veja desta semana (edição 1.749) alerta sobre os riscos das terapias alternativas. Sempre que se fala sobre isso, lembro da declaração contundente de Dina Sfatt, diva do cinema, do teatro e da televisão dos anos 60 aos 80. Por

Por | Edição do dia 04/05/2002 - Matéria atualizada em 04/05/2002 às 00h00

RONALD MENDONÇA * A revista Veja desta semana (edição 1.749) alerta sobre os riscos das terapias alternativas. Sempre que se fala sobre isso, lembro da declaração contundente de Dina Sfatt, diva do cinema, do teatro e da televisão dos anos 60 aos 80. Portadora de um câncer de mama a atriz, em entrevista, lamentava profundamente o tempo perdido com um certo Thomasgreen, suposto paranormal a quem se atribuía poderes de – além de entortar talheres – curar ao emitir um medonho grito com o som de “Rá”. Se estivesse viva, certamente, a combativa Sfatt teria enriquecido a matéria de Veja com sua funesta experiência pessoal. Há 30 anos, os jornais fizeram um grande estardalhaço proclamando a descoberta da cura do câncer com o uso de um preparado de ipê roxo, árvore comum no nordeste. Infelizmente, para a humanidade, não passou de mais uma informação sensacionalista, desprovida de veracidade científica. Foi pura balela. Uma rápida revisão na memória nos faz recordar de estranhas terapias ao longo dos séculos: chás de “raspas” de toda natureza, inclusive de dejetos humanos ou não, até curas espirituais através de rezas, passes, toques “energéticos”, etc, sem esquecer a “força da lua” essencial e indispensável em vários métodos. O fato é que boa parte dessa liturgia da crendice sobreviveu e está presente com novas roupagens, enriquecidas pela tecnologia moderna. Algumas resistem com os mesmos rituais, como os das rezadeiras para curar febres e afastar maus olhados e a queima de vestimentas depois de uma crise epiléptica – para afugentar os “espíritos de trevas”. Seria até folclórico, não fora o trágico existente por trás dessas práticas. Com o nível de desinformação popular, é de se imaginar as legiões de pacientes que deixam de procurar o tratamento adequado no alvorecer da doença, retardando seu início, preferindo as “milenares” – ou nem tanto – e inócuas (?) terapias alternativas (muitos médicos estão nessa trilha). Doutra parte, é ingênuo sacralizar o tratamento médico. Longe disso: o apetite dos laboratórios farmacêuticos continua leonino: além da impotência para curar um número considerável de doenças, mesmo dispondo de todos os recursos, não são poucos os doentes revol-tados com o tipo de aten-dimento que lhes é oferecido. É desolador o contingente de pessoas sem acesso ao médico adequado, a exames complementares que efetivamente esclareçam seus males, e, talvez o mais cruel de tudo: a rejeição dos hospitais, sobretudo para os casos mais graves. É duro admitir: mas, num dado momento, até que se entende a proliferação dos curandeiros e charlatães. (*) É MÉDICO E PROFESSOR DA UFAL [email protected]

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