Opinião
Gota d�gua no deserto

| Humberto Martins * Para despertar entusiasmo nas suas tropas, o imperador francês Napoleão Bonaparte, na sua incursão ao Egito, disse: Soldados, do alto dessas pirâmides, 40 séculos vos contemplam. Depois de mais de 40 séculos, os egípcios realizaram agora uma primeira eleição para presidente da República, por exigência dos Estados Unidos da América do Norte, país que faz questão que os seus aliados aparentem ser estados democráticos. Não conseguiram êxito completo na empreitada porque entre esses aliados estão algumas das mais truculentas ditaduras, como por exemplo a Arábia Saudita, cujo destino é traçado por 800 príncipes, devidamente empanturrados pelos resultados do petróleo vendido ao Ocidente. Há coisa de 50 anos atrás, um vendaval republicano extinguiu parte das monarquias árabes, entre elas a do Egito. O rei Farouk foi despachado para a Europa, onde terminou seus dias. Sucedeu-o o general Mohamed Naguib, que passou rapidamente o governo ao general Gamal Abdel Nasser, que ficou no posto até a morte, sendo sucedido pelo general Anuar Al Sadat, que foi abatido a tiros pela Irmandade Muçulmana, em pleno desfile da independência, há 24 anos. Assumiu então o poder o brigadeiro Osny Mubárak, que se mantém até hoje. O regime egípcio, baseado nas forças armadas e em um partido majoritário, admite uma oposição rarefeita e inconseqüente, que teve o direito de disputar a presidência com nada menos de dez candidatos, como conseqüência da pressão desencadeada por Washington contra Mubárak. O presidente foi reeleito facilmente. A estrutura medieval de grande parte dos estados árabes - Jordânia, Arábia Saudita, emirados e Marrocos - alimenta as monarquias, mas os resultados práticos das repúblicas proclamadas há décadas são parcos. Líbia, Argélia e Sudão, entre outros, são regimes fechados, que não apresentaram, após erradicação das suas monarquias, resultados políticos e sociais relevantes. A promiscuidade entre religião e política, o envolvimento dos militares na política e na administração, a radicalização acentuada a partir da presença do estado de Israel na região, entre outros fatores, criaram uma situação de estagnação que não será removida facilmente. A eleição egípcia é uma gota dágua no deserto. O exercício da cidadania se faz com a participação de cada cidadão, buscando, assim, o aprimoramento da democracia. (*) É desembargador do TJ/AL.