Opinião
De todos tudo esperava

| DOM FERNANDO IÓRIO RODRIGUES * Ele era assim: esperava tudo de todos. Por trás das mais desagradáveis comédias, das defesas mais consternadoras, dos crimes por mais abomináveis, descobria Ele a criança pouco amada que havia cessado de crescer, desde quando nela deixaram de acreditar. Quase sempre é por falta de terem sido compreendidos, amados, descobertos, incentivados, julgados melhores, que muitos se tornaram revoltados, maus, perversos. É que Deus existe em cada ser humano e espera seja Sua presença descoberta para nele crescer. Amar alguém é despertar nele um ser oculto e, misteriosamente, mudo que é forçado a surgir ao nosso apelo. Mistério secreto: mesmo quem o oculta não o conhece, mas de tal maneira é verdadeiro que não pode deixar de ser reconhecido ao ser descoberto. Todos detestavam aquele publicano Zaqueu. Não era para menos, visto como se tinha murado, definitivamente, nas suas mal adquiridas riquezas. Pessoa alguma nada de bom esperava de Zaqueu, ninguém nele confiava. De sua parte, ele nada de bom esperava de alguém, nem em pessoa alguma confiava. Não obstante, mal sabia Zaqueu que alguém o amava e dele esperava muito. - Desce depressa, Zaqueu, ordenou-lhe aquela voz decisiva e amiga: Quero hoje, jantar em tua casa. Jesus esperava por Zaqueu que subira num sicômoro para poder ver Jesus de Nazaré que passava, vez ser ele de baixa estatura: Desce depressa quero hospedar-me em tua casa. E aquele cobrador de impostos, etiquetado como avaro, corrupto, injusto, perdido, promete a Jesus: Senhor, já que vieste a minha casa, eis que darei aos pobres metade de meus bens, e se alguém enganei, pagarei dez vezes mais. As fontes do pecador, que pareciam secas, começaram a jorrar águas cristalinas de conversão, de solidariedade, de justiça e de partilha. Confiara Jesus em Zaqueu no momento em que todos o abandonavam. É como afirma Paul Claudel: No avarento mais insensível, no interior da prostituta e do bêbado mais sórdido há uma alma imortal ocupada em respirar a chama do pavio que ainda fumega Deus não permite que o pavio, ainda fumegante, se extinga, no recôndito do ser humano. Foi na arquibancada do tronco de um sicômoro que Zaqueu encontrou a misericórdia de Deus. (*) É bispo de Palmeira dos Índios.