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Nº 5900
Opinião

Chovendo orvalho

| Dom Fernando Iório* Nem sempre fomos orientados a refletir sobre o mistério do orvalho na Liturgia do Advento: “Ó céus! Espalhai como um orvalho a justiça e fazei chover o Justo” (Isaías, 45,8). Como poderiam os céus orvalhar e chover o Justo? Isso é

Por | Edição do dia 31/01/2006 - Matéria atualizada em 31/01/2006 às 00h00

| Dom Fernando Iório* Nem sempre fomos orientados a refletir sobre o mistério do orvalho na Liturgia do Advento: “Ó céus! Espalhai como um orvalho a justiça e fazei chover o Justo” (Isaías, 45,8). Como poderiam os céus orvalhar e chover o Justo? Isso é algo de fascinante mistério: alguma coisa deveria irromper em nossa vida, tornando-a nova - isto é intocada, despoluída. No Deuteronômio (32), o Cântico de Moisés inicia-se com a evocação: “Que minha doutrina jorre como a chuva; que minha palavra caia como o orvalho”. Consoante os habitantes da Palestina, era o orvalho, simbolicamente, de muita importância. À noite, caía o orvalho, despercebidamente, sobre a árida terra de cultivo. Bem assim encontrava-se o deserto, pela manhã, envolvido por um lençol de orvalho. Era comum, entre os gregos, ser o orvalho símbolo do amor. Conforme os persas, era símbolo da virgindade, do tenro, do intocado, do incólume, do imaculado. Era pensamento, quase comum, que Deus reproduzia, através do orvalho, o original desse mundo. Para os israelitas, era o orvalho a imagem de que o próprio Deus cuida dos seres humanos, fecunda o que vive ressequido e produz em nós vida nova. Na linguagem budista, o mundo do orvalho é o das aparências, signo do caráter efêmero das coisas e da vida. Relata o escritor chinês, Lie-Tse, que os imortais da ilha Ho-Tcheu se alimentam de ar e de orvalho tirado da Lua, com o auxílio de misteriosa concha. Na Grécia, Dionísio encarna o orvalho fecundante do céu. Astartéia é relacionada com o mar e o orvalho fecundante, acontecendo o mesmo com Afrodite, deusa pagã a retratar o amor. Entre os índios da América do Norte, a Grande Águia do Orvalho revivificava a terra esterilizada pelos espíritos nefastos. O orvalho rejuvenesce e nos convida a contemplar o campo, admirando-nos com o jogo de luz nas gotas orvalhadas, como se fossem cristais. Desde então, poderemos compreender melhor o versículo do Salmo 30: “De noite, demoram as lágrimas, mas, pela manhã, explode a alegria”. Ansiamos pelo orvalho que faz o ressequido florescer em nós; buscamos, do mesmo modo, o orvalho da justiça que nos faz caminhar em linha reta, com harmonia, sem intenções segundas, sem falsidades, nem ambigüidades. O importante é estar cada um disponível à ação do orvalho da justiça que vai operar nos atos de nossa vida. (*) É bispo de Palmeira dos Índios.

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