Opinião
Esperando Godot

RONALD MENDONÇA * Através de uma matéria da Gazeta de Alagoas, veio a público que os hospitais não estão aceitando prestar atendimento a pacientes do SUS. Desta vez é para cirurgias otorrinolaringológicas (desculpem o palavrão). O fato é que existem algumas centenas de doentes, crianças geralmente, que aguardam numa fila (?) a oportunidade de serem tratados. Ocorre que esta fila não anda, porque os hospitais exauriram os seus recursos para atender os conveniados do SUS, na vaga esperança de que um dia cada vez mais improvável poderia haver uma remuneração justa, estão começando a rebelar-se para sobreviver. É, no mínimo, curioso o raciocínio oficial. Quando se trata de levantar paredes, fazer ou refazer estradas a verba chega com certa facilidade e não são poucas as denúncias e/ou claras evidências de superfaturamento, propinas e outras coisas cabeludas que todos conhecem. Se há atraso no repasse do dinheiro, as empreiteiras não têm o menor constrangimento em cruzar os braços. Já em relação ao pagamento de serviços médicos, o comportamento é completamente diferente. Pouco interessa aos geniais planejadores das políticas de saúde o que os hospitais gastam para manter suas portas abertas, e ainda tendo de suportar o constrangimento da desconfiança e achincalhes. É bom que se diga que o que se vê hoje é resultado de uma política, digamos equivocada, de um grupo de sanitaristas que galgou o poder há uns 15 ou 20 anos com a idéia fixa de acabar com a medicina curativa. A partir daí foi palpável o sucateamento proposital (e criminoso) dos grandes hospitais públicos. Em relação à rede hospitalar privada, eles cuspiram em cima. Ter título de especialista em área clínica, para aquele grupo, era ser outsider e foi assim que o valor das consultas chegou aos humilhantes 2 reais e uma neurocirurgia em 60 reais. A retirada das amígdalas, para muitos, pode ser considerado procedimento tolo, simples, o que na verdade não é. Os médicos que atuam nessa área fazem um longo treinamento de 23 anos, às vezes até mais, para que possam familiarizar-se com a técnica e depois passarem a impressão de simplicidade. É evidente que todo esse tempo não é gasto somente para aprender a retirar as amígdalas. Como escrevi em comentários anteriores publicados nesse espaço, o que se está vendo é a pontinha de um iceberg. Não esquecer que os problemas vão num crescendo; os doentes das amígdalas desenvolvem-se mal e são fortes candidatos, dentre outras, a doenças graves do coração. Termino, lembrando que sob o mesmo pretexto (prejuízos homéricos), estão amontoados na Unidade de Emergência vários doentes com aneurisma cerebral, lesionados raquemedulares etc., à espera de Godot. (*) é médico e professor da Ufal. e-mail [email protected]