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Nº 5759
Opinião

Paixões humanas no Natal .

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Por Marcos Davi Melo - médico e membro da AAL e do IHGAL | Edição do dia 23/12/2023 - Matéria atualizada em 23/12/2023 às 04h00

As pessoas se encontram e trocam efusivas manifestações de feliz Natal, paz e amor: é o espírito natalino. Vão à igreja etc e tal. Mas nas redes sociais essas mesmas pessoas propagam a animosidade contra antagonistas e disseminam o ódio, tal como Tchekov alertou: “Nada une tão fortemente como o ódio - nem o amor nem a amizade nem a admiração”. Pergunte-se, então: em quais exemplos esses “cristãos” se inspiram?

Pois quase tudo o mais nas palavras e nos atos de Jesus Cristo é pregação da brandura, da paciência, da indulgência. É o pai de família que recebe de volta o filho pródigo (Lucas, XV), é o trabalhador que vem à última hora (Mateus XX) e que recebe a paga como os outros, é o samaritano caridoso (Lucas, X), ele próprio justifica os seus discípulos que não jejuaram (Mateus, IX), perdoa à mulher pecadora (Lucas, VII), contenta-se em recomendar fidelidade à mulher adúltera (João, VIII), digna-se até a condescender com a alegria inocente dos convidados de Canaã (João, II), que já aquecidos pelo vinho pedem ainda mais, e faz-lhes um milagre, transformando a água em vinho.

Não se exalta, nem mesmo contra Judas, que vai traí-lo: ordena a Pedro que nunca se sirva da espada (Mateus, XXVI), repreende os filhos de Zebedeu (Lucas, IX), que, a exemplo de Elias, queriam que do céu se abatesse um fogo sobre uma cidade que não lhe tinha dado guarida.

Por fim, morre vítima da inveja. Se ousarmos comparar o sagrado com o profano, um Deus com um homem, então a morte de Cristo, humanamente falando, tem grande relação com a morte de Sócrates. O filósofo grego morreu por causa do ódio dos sofistas, dos sacerdotes e dos primeiros homens do povo; o legislador dos cristãos sucumbiu ao ódio dos escribas, dos fariseus e dos sacerdotes. Sócrates podia ter evitado a morte, e não o quis. Jesus Cristo ofereceu-se voluntariamente. O filósofo grego não só perdoou aos que o caluniavam e aos seus iníquos juízes, com lhes pediu que, um dia mais tarde, tratassem os seus filhos como a ele, se esses fossem suficientemente felizes para merecer o ódio; o legislador dos cristãos, infinitamente superior, pediu a seu pai que perdoasse seus inimigos (Lucas, XXIII).

O Papa Francisco fez um ato de indulgência ao conceder a benção dos padres para os casais homoafetivos. Foi um ato de amor, mas para uma corrente dos que se dizem “religiosos” e compartilham constantes hostilidades, disseminam as fake news, apoiam o armamentismo e a violência, esse ato papal desencadeou nova série de provocações onde o ódio predomina,

O Papa Francisco tem repetido que a religião jamais deve ser uma ferramenta para criar muros, mas sim para construir pontes. Ele entrará para a História por ter tocado profundamente o coração e cativado mesmo os que, não sendo religiosos, acreditam no que Borges escreveu: “Parece-me fácil viver sem ódio, coisa que nunca senti, mas viver sem amor, acho impossível”. É simples assim, se as pessoas conviverem mais e melhor com a indulgência, a tolerância e a ética, sentirão que esses sentimentos humanos são infinitamente superiores ao ódio e assim viverão melhor com as outras pessoas, com os parentes e até consigo mesmas.

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