Ros�rios de orgias
| Ronald Mendonça * Sessentona, Soledade foi criada nos rigores de um catolicismo eivado pelos preconceitos e pelo culto aos chamados intermediários de Deus (santos e/ou sacerdotes carismáticos, tipo padre Cícero e frei Damião). De suas passadas peregr
Por | Edição do dia 10/11/2007 - Matéria atualizada em 10/11/2007 às 00h00
| Ronald Mendonça * Sessentona, Soledade foi criada nos rigores de um catolicismo eivado pelos preconceitos e pelo culto aos chamados intermediários de Deus (santos e/ou sacerdotes carismáticos, tipo padre Cícero e frei Damião). De suas passadas peregrinações, não consegue esquecer que, certa feita, depois de encarar fila quilométrica para cumprimentar o velho missionário, na hora H, teve sua bênção negada pelo fato de não ser casada no religioso. Hoje, fundamentalista de um braço da Igreja Pentecostal, dona Soledade não consegue compreender as acusações contra o padre Júlio Lancelotti. Na cabeça da evangélica não cabe a hipótese de um homem com tanto estudo, como costumam ser os padres, apresentar conduta tão deplorável. Na realidade, por mais que o mundo tenha perdido as estribeiras certos desvios comportamentais vão além da tolerabilidade, daí as denúncias contra o padre merecerem aprofundada reflexão. Com efeito, integrante de uma ala engajada da Igreja Católica, com uma razoável folha de serviços voltados para o social, Lancelotti confirma a teoria da abissal complexidade da alma humana. Embora não existam acusações processuais formais, no mínimo há um quê de ingenuidade supor-se que alguém sem culpa no cartório ceda a manobras de chantagem anos a fio. De todo modo, o que até agora vem sendo publicado são acusações graves capazes de detonar currículos dos mais piedosos dos santos. Se estivesse na Ásia, certamente o religioso teria optado por solução radical para acabar com as especulações. É até plausível que as investidas pelas sendas dos prazeres carnais não cheguem a tirar o mérito das obras do sacerdote. Contudo, é humanamente impossível dimensionar com exatidão todo o mal que produziu. Por isso, é inconcebível fechar os olhos sobre suas atuações perversas. Aliás, fingindo ignorar, durante anos os alagoanos conviveram com algumas figuras ligadas ao clero, não obstante recalcitrantes e notórias práticas sexuais assemelhadas, e que também se notabilizariam por trabalhos de cunho social. É claro que com os atos de pedofilia e de supostos desvios de verbas de ONGs para financiar luxúria e taras, o ministro de Deus não se transformou no mais abominável dos pedófilos do planeta. Está longe de ser o primeiro, tampouco o último caso, no histórico pouco edificante de rosários de orgias da Igreja. Ele é a bola da vez à espreita de outro comemorativo escandaloso que possa substituí-lo na mídia. (*) É médico e professor da Ufal.