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Nº 5700
Opinião

Mário Marroquim e a doutrina jurídica .

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Por Marcos Vasconcelos Filho - ensaísta, autor, entre outros, do livro “Mário Marroquim: dos romanos aos matutos” (2020) | Edição do dia 24/04/2024 - Matéria atualizada em 24/04/2024 às 04h00

Mário Marroquim (1896-1975), romanista e cicerófilo, nutria um pendor especial para o campo do direito privado. Ademais: certo gosto pela liberdade negocial das obrigações e dos contratos. Mais: a inclinação ao ramo das sucessões, neste vasto mundo juscivil.

Todavia, sete decênios atrás, apresentou à Faculdade de Direito de Alagoas (hoje, FDA, na Ufal), como tese de concurso em direito romano, um estudo decerto divisor de águas na sua bibliografia, porquanto lhe alargava a visão técnico-ideológica: “A limitação legal da propriedade romana” (Maceió: Casa Ramalho, 1952).

À parte as seculares contendas liberais x socialistas, estado x mercado ou latifúndio x reforma agrária, a permanência do livro residirá num ponto tanto sutil quanto indeclinável: a prevalência do coletivo ante o benefício individual. (Aliás, a discussão deu pano pra mangas durante a pandemia).

O trabalho acadêmico traduz-se numa viagem erudita pelos preceitos romanos, tão contemporâneos, a propósito, no nosso sistema legal. Secciona-se em seis porções: (I) A origem da propriedade, (II) Definição da propriedade, (III) Limitações da propriedade, (IV) Interesse público, (V) A desapropriação por utilidade pública e (VI) A teoria da “aemulatio”.

Tal obra se adiantava aos incisos XXII, XXIII e XXIV do quinto artigo e ao parágrafo primeiro do dispositivo 216 da Constituição Federal de 88, nos quais se consagram a garantia e os limites ao direito de propriedade (dentre estes, o instituto da desapropriação); bem assim aludia aos direitos difusos através do patrimônio cultural-ambiental, à fundamentalidade dos espaços públicos e ao regulamento mineral (veja-se, no presente, o Código de Minas); e ainda exarava regramentos da prerrogativa ocorrentes na vivência quotidiana a partir do rol dos direitos reais, sob mor atenção, na civilística nacional, os direitos de vizinhança (cf. Código Civil de 2002, art. 1.277ss).

Especificamente no último capítulo, já se nota a preocupação com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade face a possíveis abusos das intervenções estatais. Preocupavam-no a legítima e equânime “missão social do Direito”, os “elementos éticos no campo fechado do direito de propriedade”, “a compreensão da destinação social da propriedade, que, assim, não tinha o sentido de um domínio individual ilimitado”, frente a voluntariosas restrições de direitos fundamentais.

Conquanto o excesso de constitucionalização, no século XXI, do ordenamento jurídico brasileiro, preocupante a ponto de quase ameaçar a logicidade das normas, no painel dos doutrinadores brasileiros, máxime os alagoanos, ocupa o autor seu espaço quando a temática é a tradição românica e a incontornabilidade de um direito transindividual.

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