O desemprego e a crise financeira internacional
Uma história que me comoveu. Ele tinha 46 anos, dos quais 26 de empresa, sempre correndo para dar conta das tarefas que lhe cabiam. Suava a camisa. Uma preocupação o dominava: mudanças e mais mudanças estavam ocorrendo no seu trabalho, inovações, avanços
Por | Edição do dia 19/11/2008 - Matéria atualizada em 19/11/2008 às 00h00
Uma história que me comoveu. Ele tinha 46 anos, dos quais 26 de empresa, sempre correndo para dar conta das tarefas que lhe cabiam. Suava a camisa. Uma preocupação o dominava: mudanças e mais mudanças estavam ocorrendo no seu trabalho, inovações, avanços tecnológicos; que, de sua parte, por mais que fizesse não conseguia acompanhar. Havia estagiários contratados, gente nova cuja linguagem e idéias de mudança deixavam-no à parte. Gradualmente, o medo de ser despedido o acometeu. Classe média, filhos em escola particular, esposa dedicada aos afazeres domésticos. De repente, foi chamado à gerência. Com indiferença, o chefe comunicou sua dispensa da empresa. Falou em globalização, crise econômica, e, com um tom de voz mais forte, acrescentou: o mundo do futuro já chegou e você não tem qualificação adequada para essa nova etapa. Desempregado, não encontrou outra ocupação. Dois anos transcorreram. Numa noite de chuva incessante, em que bátegas dágua cantavam nas vidraças, sentiu um súbito mal-estar, dor torácica aguda. A sombra da vida desapareceu. Qual é a família que não tem alguém desempregado? É comum aposentado que sustenta os filhos adultos; estudantes, que anos após a formatura, continuam a depender da renda familiar, pois a colação de grau não lhes foi garantia de subsistência. Dados estatísticos mostram que cerca de 50% dos brasileiros trabalham no mercado informal. Por outro lado, quando uma empresa contrata um empregado assume responsabilidades trabalhistas e previdenciárias exageradas. Segundo o cálculo do professor José Pastore, da USP, a empresa paga, aproximadamente, 102% de encargos sociais. De certa feita, contei uma piada que fez muita gente rir: as estatísticas são como os biquínis; o que mostram é muito interessante, mas o que escondem é o que há de melhor. Desemprego é assim; as estatísticas não informam claramente que há uma massa crescente de pessoas sem trabalho. No setor privado, quem está trabalhando vive a angústia da possibilidade de demissão. Vale recordar: Nos dias atuais, a participação dos homens na força de trabalho decresceu; a das mulheres foi ampliada; o tamanho da família diminuiu; o número de domicílios com apenas um membro se ampliou; permanecer solteiro o maior tempo possível é uma escolha cada vez mais comum; há maior concentração de desemprego entre jovens e pessoas de meia-idade. (*) É médico e ex-Secretário de Educação e de Saúde.