IA no marketing
dadeiras ou pasteurizadas?

A inteligência artificial (IA) deixou de ser um experimento restrito a grandes empresas de tecnologia e passou a ocupar lugar estratégico nas áreas de marketing das companhias brasileiras. O movimento ganhou tração nos últimos meses e agora se consolida: um levantamento da HubSpot, divulgado em junho de 2025, revela que 97,9% dos profissionais de marketing do país planejam ampliar o uso da IA em suas estratégias ao longo do próximo ano.
Mas, aqui e agora, os ganhos de produtividade já são evidentes. Entre as empresas que utilizam ferramentas de inteligência artificial, 95,4% relatam aumento no retorno sobre investimento. A automação de tarefas, a personalização de mensagens em escala e a otimização de campanhas já se tornaram realidade em muitas organizações. E não apenas nas grandes corporações: com a popularização das ferramentas, empresas de médio porte passaram a contratar pacotes empresariais a custos mais acessíveis.
Com a adoção crescente, no entanto, aumenta um risco perturbador para a memorabilidade e o posicionamento das marcas. À medida que tantas passam a usar ferramentas similares para se comunicar, será que não corremos o risco de todas acabarem falando a mesma língua? Essa é a nuvem que se avoluma no horizonte dos profissionais de marketing, publicidade e conteúdo. Será que a padronização imposta por modelos de IA, ainda que extremamente eficaz do ponto de vista técnico, vai esvaziar a identidade das marcas e afastá-las emocionalmente de seu público?
Esse dilema é especialmente relevante em mercados regionais, onde o sotaque, os valores locais e o jeito de se comunicar são ativos importantes para criar empatia e identificação com o consumidor. Quando a IA define o tom e o conteúdo com base em padrões nacionais, ou mesmo globais, corre-se o risco de eliminar justamente aquilo que torna a comunicação mais autêntica.
Em um cenário hipotético, imaginemos duas marcas concorrentes usando o mesmo comando (ou prompt, o nome técnico de instrução dada às ferramentas de IA) para gerar campanhas com inteligência artificial. Dificilmente o resultado seria muito diferente um do outro. O que restaria da identidade de cada uma dessas empresas? Para evitar que isso ocorra, a supervisão humana continua sendo indispensável. Afinal, não é só a IA que tem de ser inteligente: seu uso também.
Não à toa, as empresas que vêm obtendo mais sucesso no uso de inteligência artificial aplicada ao marketing são aquelas que utilizam a tecnologia como suporte, e não como substituto. Para manter sua essência, as marcas precisam estar permanentemente atentas aos conteúdos gerados, garantindo alinhamento com o contexto local, ajustando o vocabulário e, sobretudo, preservando os símbolos que sustentam a conexão com seus consumidores.
É preciso, obviamente, usar a tecnologia para escalar mensagens. Mas, mais importante ainda, é validar os resultados com um olhar crítico e muito humano. Porque uma empresa não pode, jamais, renunciar à originalidade, de seu tom de voz único, de sua identidade e do histórico emocional que constrói o fio condutor de sua presença na vida do consumidor.
A pergunta deixou de ser se as empresas vão ou não adotar a inteligência artificial em suas estratégias de marketing. Isso já está acontecendo. A questão é como farão isso sem perder a própria voz. Porque em marketing, como na vida, não basta ser eficiente. A marca precisa continuar a ser, e a parecer, autêntica e fiel a si mesma.