Cuidados
O outubro rosa

Era outono dos anos 90, quando as árvores do Central Parque adquirem aquela folhagem multicolorida tão inspiradora de obras musicais e pictóricas. Nas suas largas avenidas, incluindo a ponte do Brooklyn, uma corrida de rua inusitada se desenvolvia sob aplausos da comunidade. Ela era integralmente constituída por mulheres de várias partes do país, unidas por um elo comum a todas elas - eram mulheres que tinham se submetido a tratamento de câncer de mama.
O câncer da mama é uma doença tão antiga quanto a humanidade. Remontam a Imothep, o médico que viveu no Egito antigo, 1.700 anos antes de Cristo, as primeiras referências sobre a enfermidade, contidas no papiro de Edwin Smith, o mais antigo documento médico de que se tem conhecimento. A rainha turca Atossa Ágatha, a linda jovem vítima da perseguição romana aos cristãos, martirizada com amputação cruenta dos seus seios e, mais tarde, tornada a padroeira dos mastologistas, é uma das figuras emblemáticas dessa que atualmente é a neoplasia maligna mais frequente nas mulheres, com mais de 2,4 milhões de casos novos em 2025 no mundo.
Durante séculos, o tratamento do câncer de mama baseava-se na sua amputação. Foram os estudos clínicos randomizados realizados por Umberto Veronezi no Instituto de Câncer de Milão, Itália, nos anos 80, depois repetidos globalmente com similar êxito, que demonstraram que uma cirurgia menor, mantendo os seios (cirurgia conservadora) e associada à radioterapia obtinha os mesmos resultados, aperfeiçoados posteriormente com a quimioterapia. Com o desenvolvimento do primeiro mamógrafo pela francesa Companhie Generale de Radiologie (CGR), em 1965, e a aquisição de dois deles pelo Brasil em 1971, a Medicina iniciou a detecção desses tumores por imagem antes mesmo de eles serem palpáveis. Atualmente, mamografias de alta qualidade diagnosticam os tumores de mamas femininas ainda iniciais, impalpáveis e curáveis em mais de 90% dos casos.
As políticas de saúde pública, inclusive as campanhas de controle do câncer uterino e de mama, só se tornaram efetivas e amplas no Brasil com o advento do SUS, em 1988, e da redemocratização do País, com mamografias disponíveis em larga escala e acesso das mulheres aos tratamentos oncológicos, que necessitam contínuas atualizações e aperfeiçoamentos. Em oncologia nunca se trata um paciente fora dos protocolos internacionais oficiais, um oncologista respeita a Medicina Baseada em Evidências.
Precisamos fazer o diagnóstico precoce do câncer de mama e salvar vidas: a informação correta é fundamental e a participação da sociedade, como a as voluntárias da Rede Feminina de Combate ao Câncer de Alagoas, é essencial em sua dedicação, solidariedade e doação ao próximo.
O Outubro Rosa é uma competição pela vida e pela dignidade da mulher contra o câncer de mama em um momento dificílimo de sua vida. Ele nasceu daquela corrida de Nova Iorque, quando as folhagens multicoloridas das árvores do Central Parque se renovam, como a demonstrar que a vida se revigora com lastro no amor, na empatia, na solidariedade e na esperança.
Um diagnóstico precoce feito em uma mama ainda sem alterações morfológicas e outro feito algum tempo depois, quando um nódulo já passa a ser palpável, pode ser a diferença entre recuperar a saúde sem maiores traumas e um enfrentamento desconfortável da doença. Nesse sentido, a recente deliberação do Ministério da Saúde em autorizar a mamografia a partir dos 40 anos é correta e uma oportunidade para as mulheres realizarem o diagnóstico da doença em uma fase mais precoce, o que é um fator decisivo no prognóstico.