loading-icon
MIX 98.3
NO AR | MACEIÓ

Mix FM

98.3
segunda-feira, 17/03/2025 | Ano | Nº 5924
Maceió, AL
26° Tempo
Home > Opinião

Opinião

Justi�a no campo

Ouvir
Compartilhar
Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Whatsapp

HUMBERTO MARTINS * Poucas questões brasileiras são tão complexas como a situação fundiária. Todas as tentativas feitas através da história do País para dar ao Brasil um campo mais homogêneo foram debalde. Divergências entre proprietários de terras e camponeses continuam provocando conflitos em dimensão cada vez maior. Tanto é assim que, em 2001, morreram mais pessoas nesses incidentes do que em 2000, numa proporção de 40%. É chocante que prevaleça esse clima no campo numa nação onde a maior parte dos espaços está desocupada. Quem viaja de avião freqüentemente e contempla a paisagem pela janela da aeronave constata que, dez minutos após a decolagem, o que se observa são vastidões de lavouras, florestas, descampados e incontáveis famílias. Os erros da colonização nos vastos rincões brasileiros vêm desde os primórdios, há mais de cinco séculos. O Rei de Portugal, através dos governadores gerais, doou enormes porções de terra a numerosos portugueses que se comprometeram a explorar os recursos naturais da colônia. Esses beneficiados transmitiram as terras aos seus sucessores através do tempo, sem que em épocas modernas o Executivo federal e o Congresso se preocupassem em redesenhar esse mapa de privilégios. Durante centenas de anos, milhões de pessoas – índios, seus descendentes, caboclos, mamelucos e pobres, de modo geral – se conformaram em habitar, como favor de seus patrões, incontáveis glebas, exercendo a agricultura de subsistência e o pequeno criatório. Parte do tempo de que dispunham dedicavam ao trabalho nas terras do patrão. O que sobrava era para cuidar das lavouras próprias. O advento da legislação trabalhista, a exigência de que os seus direitos fossem respeitados, o temor dos proprietários de que suas posses fossem colocadas em risco desencadearam um processo de entrechoque, cuja manifestação inicial mais violenta foram as Ligas Camponesas do falecido deputado federal pernambucano Francisco Julião, no fim da década de 50 – início da década de 60, principalmente em Pernambuco e Paraíba. As Ligas Camponesas atuavam mais ou menos como agem hoje os denominados movimentos dos sem-terra, ocupando fazendas, obstruindo estradas, invadindo repartições públicas. Em matéria de desapropriação de terras para efeito de reforma agrária, o atual governo federal tem feito, ainda, muito pouco. No que falha é na seqüência de providências para que essas terras se tornem produtivas, para que os camponeses se transformem em agricultores com alguma noção de gerir suas glebas, na construção de casas, no abastecimento d’água, energia e numa série de outras providências, sem as quais a reformulação agrária não prospera e evolui. Pelo menos 40 pessoas foram assassinadas no interior brasileiro, como conseqüência de conflitos agrários, no ano pretérito. Além de mortos e feridos, a situação no campo provoca a existência de indivíduos escravizados, transportados por seus empregadores para regiões remotas e mantidos isolados da civilização. Para se ter uma idéia dessa situação anômala, mencione-se que apenas no Pará foram identificadas e libertadas, nos últimos meses pelas autoridades, 2.416 pessoas que trabalhavam em regime de escravidão. Dotar a enorme área rural brasileira de condições racionais e modernas de trabalho é uma tarefa ciclópica, que exige determinação e investimentos de bilhões de reais. A construção de uma sociedade livre, justa e solidária, visando erradicar a pobreza e a marginalização, só será atingida em sua plenitude, com uma melhor distribuição de renda, pelo que passa, também, a questão da reforma agrária. Uma boa política agrícola somente será efetivada com a participação ativa do setor de produção. É sabido que a reforma agrária planejada na forma da lei oferece mais trabalho e oportunidade de emprego no campo, reduzindo a violência na conquista da terra, além de garantir o desenvolvimento nacional, com mais justiça social. (*) É DESEMBARGADOR DO TJ/AL

Relacionadas