Opinião
Traipu

EDUARDO TAVARES MENDES * Toda comunidade tem sua história, seu folclore, suas crenças. Somente quem nasceu e viveu em cidades do interior sabe o que é o convívio com gente simples que, com certeza, sabe aproveitar aspectos e passagens da vida que, verdadeiramente, proporcionam bem-estar e felicidade. A pequena Traipu, situada na margem alagoana do Velho Chico, não foge à regra. Pelo contrário: é rica em valores locais e universais e, como em grande parte das cidades brasileiras, a religiosidade dos seus filhos é marcante. Lá, da colina sobre o Rio São Francisco, é Nossa Senhora quem exerce, realmente, a função de protetora de toda aquela gente pacata e hospitaleira. Sempre indaguei a respeito do magnetismo e da força de Maria sobre os povos, e sempre perguntei sobre o porquê dos seus tantos nomes e das suas tantas imagens. Aprendi, depois, que os muitos títulos dedicados à mãe de Jesus correspondem à maneira de sua aparição ou à sua imagem diversificada. Às vezes, a imagem retrata seu sofrimento durante a paixão e a morte de Jesus Cristo; outras mais, exalta a virgindade, a dor, a glorificação no céu, ou o triunfo contra o mal. Na verdade, o povo de cada cidade, de cada vila ou recanto da Terra quer ter o prazer de chamar a Virgem Santíssima de uma forma particular. A cada aparição, um novo nome lhe é concedido e, assim, Maria está ligada aos lugares e às populações de forma bastante especial: Nossa Senhora Aparecida, da Lapa, da Apresentação, da Conceição, das Dores, de Fátima, da Anunciação, da Glória, da Assunção etc. Em Traipu, Maria é chamada de Nossa Senhora do Ó, nome talvez relacionado ao momento da encarnação, e é grande a atração que sua imagem exerce sobre as pessoas, mormente as mais carentes. São João Damasceno já dizia que o que a Bíblia é para os que sabem ler, a imagem o é para os iletrados. Daí a explicação para o fato de as romarias serem compostas de tanta gente modesta e necessitada. Mas a fé atrai ricos, pobres, eruditos e analfabetos. É ela que mantém viva a esperança de melhores dias. É ela, ao lado da esperança, que dá sentido à vida. A característica mais importante da localidade, portanto, é a fé inabalável que o povo tem em sua guardiã. Todos os anos, em dezembro, centenas de traipuenses dirigem-se à terra natal para participar das festividades da padroeira Nossa Senhora do Ó, mãe, amiga, milagreira, e protetora das mulheres e dos homens ribeirinhos. Quem a ela recorre não passa privação, não se senteabandonado, suporta o sofrimento e tem visão mais otimista do mundo - dizem os devotos. Quantas vezes criaturas sofredoras não se sentiram aliviadas ao pronunciarem a conhecida frase, em tom de súplica: Valei-me, minha Nossa Senhora do Ó!? Filho de Traipu, sempre desfrutei do conforto de ter nascido sob a proteção de Nossa Senhora do Ó, vivenciando, a cada instante, a alegria de fazer parte de uma comunidade composta de tanta gente boa e trabalhadeira que, com a fé na Virgem Maria, tem enfrentado, com altivez, com coragem e com força de vontade, todos os desafios da vida. (*) É PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE ALAGOAS