Polícia
Fidélis é morto à bala dentro de presídio

CARLA SERQUEIRA Repórter No mesmo dia em que a morte do tributarista Sílvio Vianna completou nove anos, José Fernandes Neto, mais conhecido como o fazendeiro Fernando Fidélis, um dos condenados pelo crime, foi assassinado dentro do presídio de segurança máxima Baldomero Cavalcanti. Por volta das 14h30 de ontem, em uma das celas do módulo 3, o fazendeiro foi alvejado com três tiros de revólver calibre 38 - dois na cabeça e um na região lombar, enquanto os demais presos tomavam banho de sol. Todos os indícios levam a crer que foi um crime encomendado, disse o promotor da 8ª Vara Criminal, Alfredo Gaspar de Mendonça, após ter acesso ao presídio. O assassino confesso de Fernando Fidélis, Edson dos Santos Tavares, vulgo Pé de Cobra, foi levado, com outro detento que presenciou os disparos, para o 2º Distrito Policial, no Tabuleiro do Martins, onde foi registrado o flagrante. Ele cumpria pena desde 2000 por tráfico e aguardava julgamento por homicídio. Matei ele primeiro, antes que me matasse, disse Edson em seu depoimento à polícia. Fernando Fidélis, 43 anos, estava condenado a 52 anos e 10 meses de prisão por três crimes: a morte do tributarista Sílvio Vianna; a chacina da família Xavier, na cidade de Pindoba, formada por um homem, uma mulher grávida de oito meses e duas crianças; e o assassinato de dois estudantes em Viçosa. Fernando Fidélis estava prestes a cumprir pena em regime semi-aberto. Há três meses foi transferido da ala especial para o módulo 3 do presídio e sabia que, no novo local, corria risco de morte. ### Esposa culpa juiz, diretor e o Estado Com a informação de que seu esposo havia passado mal dentro do Presídio Baldomero Cavalcanti, Vânia Fidélis, mulher de Fernando Fidélis, acompanhada dos filhos Fernando e Fernanda - grávida de seis meses, e dos genros, implorava por informações diante do presídio. Todos estavam apavorados e faziam ameaças à direção. A ex-vereadora de Cajueiro só teve a certeza de que seu marido estava morto quando o rabecão do Instituto Médico Legal (IML) entrou no prédio para recolher o cadáver. Exijo saber quem foi que mandou matar o Fernando, gritava Vânia, pela morte dele eu responsabilizo o dr. Marcelo Tadeu [juiz das Execuções Criminais] e o diretor do presídio [Jair Macário], dizia ela, culpando também o Estado. Agora o Estado vai ter que arcar com as conseqüências. A imprensa também foi impedida de acompanhar a movimentação dentro do presídio. Durante todo o tempo, cerca de dez policiais militares guardavam a entrada do prédio. O Instituto de Criminalística (IC) permaneceu por mais de duas horas no local, levantando pistas. O secretário de Ressocialização, Valter Gama, não soube explicar como uma arma foi parar dentro do presídio de segurança máxima da capital. Vamos instaurar sindicância administrativa para apurar quem facilitou a entrada da arma, disse, explicando que a transferência de Fernando Fidélis da ala especial para o módulo 3 se deu por causa da extinção da ala, chamada também de Centro de Observações Criminalísticas (COC). Lá ficaram apenas os ex-militares que cumprem pena, afirmou. |CS ### Garibalde teme ser o próximo alvo em prisão A pedido do ex-soldado da Polícia Militar, Garibalde Amorim, também condenado a 19 anos e 10 meses de prisão pela morte do tributarista Sílvio Vianna e outros crimes, o promotor da 8º Vara Criminal da Capital, Alfredo Gaspar de Mendonça, esteve ontem no presídio Baldomero Cavalcante. Ele [Garibalde] está com muito medo de morrer e quer ser transferido o mais rápido possível, disse o magistrado, afirmando que vai pedir mais segurança para o prisioneiro. A entrada de armas e drogas dentro dos presídios brasileiros é uma realidade constante e uma afronta à Justiça. Quero saber como esse assassinato aconteceu dentro de um presídio de segurança máxima, disse o promotor Alfredo Gaspar de Mendonça. Vim resguardar a integridade física de Garibalde, que é, assim como vinha sendo Fernando Fidélis, uma testemunha importante numa série de crimes que estão sob investigação, disse ele, se referindo aos crimes cometidos pela guangue fardada, da qual o ex-coronel Manoel Cavalcante, hoje preso no presídio Aníbal Bruno, no Recife, é acusado de liderar. Alfredo Gaspar de Mendonça é o promotor do caso Êto, apelido de Ebson Vasconcelos, morto em 2002, na rua Barão de Alagoas, no Centro de Maceió. Êto tinha um suposto envolvimento na morte do tributarista Sílvio Vianna e durante as investigações, acusou o ex-coronel Cavalcante de ser o responsável pela morte do tributarista. O fazendeiro Fernando Fidélis e o ex-PM Garibalde Amorim sustentavam acusações contra o delegado Valdir Silva de Carvalho e o ex-coronel Cavalcante de terem contratado Emanuel Guilhermino da Silva, o Fininho, e Ednaldo Bezerra da Costa, o Cigano, para matar Êto na intenção de queimar arquivo. O secretário de ressocialização, Valter Gama, disse que iria reforçar a segurança dentro do presídio, escalando mais agentes do Grupo de Ações Penitenciárias (GAP) para vigiar a ala especial, onde está preso o ex-soldado da PM, Garibalde Amorim. Ele explicou que o Ministério Público junto com a direção do presídio vão decidir o que será feito com o detento. Não podemos afirmar que ele será transferido. Esta decisão vai caber à Justiça. Só podemos garantir a presença de mais agentes, disse. |CS ### Fidélis: 52 anos de prisão por chacinas e morte de Vianna Apontado como um dos homens mais violentos do grupo do ex- coronel Manoel Francisco Cavalcante, acusado de liderar a gangue fardada, Fernando Fidélis, que passou a ser seu inimigo, cumpria pena de 52 anos e 10 meses, por participação em uma série de crimes. Apontado como participante da chacina de Pindoba, na qual, em 20 de fevereiro de 1999, foram assassinados, a tiros e golpes de facão, o vaqueiro Francisco Xavier, a esposa Maria Quitéria (grávida de oito meses ) e os filhos do casal Ginaldo e Maria Gilvânia, menores de 5 anos. Fidélis também tinha sido condenado a 19 anos e 10 meses pelo assassinato do tributarista Sílvio Vianna, além de uma outra condenação pela morte dos estudantes José Barros e Luiz Carlos Clemente, em 1986, em Viçosa. Fuga Em novembro de 2003, Fernando Fidélis fugiu do presídio Baldomero Cavalcanti. Segundo a polícia, em 7 de novembro de 2003, Fernando Fidélis recebeu permissão para visitar uma filha doente na fazenda em Pindoba. Três agentes penitenciários o acompanharam, e disseram depois que foram enganados pela esposa do preso, Tânia Fidélis, que os teria distraído enquanto Fidélis deixava a sua casa pela porta dos fundos. Fidélis foi recapturado oito meses depois, em junho de 2004, no município de Toritama, Pernambuco. Atualmente, Fernando Fidélis vinha tentando anular a sentença de 19 anos pela morte do tributarista Sílvio Vianna. Ele negava sua participação no assassinato, mas também vinha sendo investigado pela morte do pistoleiro Ebson Vasconcelos, o Eto, assassinado em 2002. Morte anunciada No ano passado, Fidélis brigou com o ex-tenente-coronel Manoel Francisco Cavalcante e passou a fazer denúncias sobre a participação do suposto líder da gangue fardada em crimes em Alagoas. Ele também acusava o delegado Valdir Soares de Carvalho e o policial militar Emanuel Guilhermino da Silva, o Fininho de envolvimento em crimes comandados por Cavalcante, entre eles, o assassinato do pistoleiro Eto. Aviso de morte A Gazeta apurou que Fernando Fidélis já tinha alertado o diretor do Baldomero Cavalcanti, Jair Macário, de que seria assassinado dentro do presídio a mando de seus inimigos. Fidélis chegou a montar um esquema de segurança dentro do presídio - ele andava sempre com o seu irmão, Fabiano Fidélis, que também cumpre pena no Baldomero, e evitava contato com presos desconhecidos. Fernando Fidélis também sugeriu que o ex-PM Garibalde Amorim, que cumpre pena no Baldomero, considerado o seu principal aliado, também poderia ser assassinado. GF ### Pé de Cobra: Matei ele antes que me matasse O motivo real da morte do fazendeiro José Fernandes Neto, mais conhecido como Fernando Fidélis, ainda é um mistério para a polícia. Mas, na delegacia o autor dos três tiros de revólver 38, Edson dos Santos Tavares, o Pé de Cobra, 31, declarou que cometeu o crime em nome de um acerto de contas antigo. A morte aconteceu no módulo III, do presídio Baldomero Cavalcanti, e quase foi presenciada pelo irmão Fabiano Fidélis. Os disparos atingiram Fidélis na cabeça e no tórax. No IML, a Gazeta constatou uma perfuração de bala na testa, do lado esquerdo. Durante seu depoimento à delegada platonista do 5º Distrito Policial, Kézia Lyra, ele disse que em 2002 teria se desentendido com Fidélis e ambos se juraram de morte. Depois disso os dois conviviam em módulos separados, mas há 15 dias. Matei ele antes que me pegasse. Ele chegou a discutir comigo e bateu no meu rosto. Sem falar que era cagüete (dedo-duro) e na cadeia isso não é perdoado, disse Edson. Influência Em contato com a imprensa, Pé de Cobra queixou-se do nível de influência de Fidélis dentro do Módulo e no presídio. Segundo o autor confesso dos disparos, o fazendeiro tratava todos como se fosse dono. Ele queria mandar em todo mundo, mas comigo é diferente. Mostrei que não aceito esse tipo de coisa, disse Edson, sem demonstrar arrependimento. Ontem, Edson cumpriu a ameaça. Ele não detalha por que escolheu a sexta-feria, 28 de outubro, data em que completaria 9 anos da morte do tributarista Sílvio Vianna, crime pelo qual Fidélis fora condenado. Edson dos Santos cumpre pena por tráfico de drogas e homicídio. Indagado se teme ser morto dentro do presídio, ele preferiu o silêncio.|MR ### Assassino apontou a arma para irmão de Fidélis A movimentação que antecedeu o assassinato do fazendeiro Fernando Fidélis no presídio Baldomero Cavalcanti não despertou suspeitas, revelou, ontem o reeducando David dos Santos. David revelou à Gazeta que no momento em que os disparos iniciaram ele estava com Fabiano Fidélis. Estávamos até jogando bola, quando ouvimos os tiros e corremos para a cela dele (Fidélis), disse. Quando chegaram ao local Edson dos Santos ainda estava com a arma em punho e chegou a apontar para Fabiano, mas foi contido. Como já convivi com o ?Pé de Cobra? em outros módulos ele me considera. Aí pedi para ele não atirar no Fabiano. Cheguei a ficar entre um e outro, contou o rapaz, ainda abalado. Na delegacia, Pé de Cobra confirmou que seu desejo era também matar Fabiano e que a intervenção do companheiro de cela foi que evitou mais uma morte. Em seguida, uma intensa movimentação de agentes e policiais foi registrada dentro da unidade. Edson chegou a resistir à idéia de se render, mas foi convencido por David a entregar a arma. Visitas Um dia antes de ser assassinado, Fidélis e o irmão, Fabiano, receberam a visita de familiares normalmente. Nada chamou sua atenção para uma possível emboscada. Ontem, segundo relato da única testemunha dos fatos, ele estava cuidando dos produtos da cantina que mantinha dentro do módulo III. Teria, inclusive, saído para despachar refrigerantes na portaria. Sobre a presença da arma no módulo, David contou que ninguém sabia disso. Essa informação foi confirmada por Edson, que criou uma versão intrigante para a presença do revólver. Eu achei esse revólver em cima de uma lata em 2003 durante uma fuga. Aí fiquei escondendo ela dentro de TVs, privada, colchão, para não ser descoberto, afirmou Edson. Os truques que ele afirma ter adotado para manter a arma contradizem a versão da direção da unidade, que realiza periódicas revistas, inclusive, com detectores de metais. O caso chama a atenção, principalmente porque Fidélis não comentou nada com a direção do presídio sobre ameaças que teria recebido dentro do módulo. Na versão apresentada à polícia por Pé de Cobra, ontem os dois voltaram a se desentender. A breve discussão foi seguida dos tiros. Na tentativa de se proteger Fidélis correu para o banheiro da cela, mas era tarde. Parti para cima e atirei na cabeça, para não dar chance, detalhou Edson, pouco depois de ter falado com sua mãe.|MR