Lideran�a comunit�ria: profiss�o perigo
A presença do Estado na periferia é como água que escorre pelas mãos. Enquanto os espaços são preenchidos por traficantes, milícias e grupos de extermínio, muitas associações de moradores se aventuram em funções que cabem à administração pública e se expõ
Por | Edição do dia 28/12/2008 - Matéria atualizada em 28/12/2008 às 00h00
A presença do Estado na periferia é como água que escorre pelas mãos. Enquanto os espaços são preenchidos por traficantes, milícias e grupos de extermínio, muitas associações de moradores se aventuram em funções que cabem à administração pública e se expõem ao risco. Com esta nova lógica de poder presente em conjuntos, grotas e favelas de Maceió, ser líder comunitário pode ser uma atividade bastante perigosa. Após declarar guerra ao tráfico de drogas, ajudar a polícia a combater assaltos e até perseguir um suspeito de assassinato que estava armado, o prefeito comunitário do Benedito Bentes, Silvânio Barbosa, recebe uma média de três ameaças de morte por dia. Há cerca de um mês, todos os seus passos são acompanhados por policiais militares escalados como guarda-costas por decisão do Conselho Estadual de Segurança. ### Professor mexe em vespeiro e recebe ameaças de morte Acho que me meti numa casa de maribondos. Mesmo com dois PMs colocados à disposição, o professor e prefeito comunitário do Benedito Bentes, Silvânio Barbosa, percebe que a segurança 24 horas não lhe dá garantias de vida. Na noite anterior à entrevista para a Gazeta, ele recebeu três ligações no celular com xingamentos e ameaças de morte. Todo dia é assim, eles me chamam de safado, de tudo quanto é nome feio e dizem que vão me matar, revela Silvânio. As intimidações e desaforos também se estendem a amigos e funcionários da prefeitura comunitária. Disseram que iam detonar todo mundo aqui dentro. ### Prefeito investiga até causas de tiroteio O prefeito comunitário por vezes assume um papel que pode ser comparado ao de um xerife. Por exemplo, ele desenvolveu uma investigação paralela sobre o que provocou o tiroteio entre traficantes dos conjuntos vizinhos Freitas Neto e Selma Bandeira que matou duas pessoas e deixou oito feridos por balas perdidas e identificou o motivo. Descobri que a tabela da nóia (preço cobrado pelo crack) não estava condizente com o que pessoal do Freitas Neto queria. A droga era vendida por R$ 10 e todo mundo deixou de comprar lá para adquirir no Selma pelo preço de R$ 5. Silvânio já participou de operações com a polícia para identificar criminosos, mas rebate a acusação de que atuaria como dedo-duro. ### 80% dos crimes ligados ao tráfico Cerca de 80% das mortes no Benedito Bentes nos últimos seis meses têm relação com o tráfico de drogas. A maioria delas envolve crianças e adolescentes. Por isso, ele defende uma reação energética da comunidade. Não tenho notícias hoje de outro líder comunitário com segurança da PM, mas ninguém colocou o pé numa boca de caieira como eu botei, analisa Barbosa. Para ele, o trabalho em parceria com a Secretaria de Defesa Social já surte efeito. ### Coragem de líderes não é unanimidade A atuação mais engajada de líderes comunitários nas questões de segurança é criticada pela Federação das Associações Comunitárias de Maceió (Facom). O coordenador administrativo da entidade, Reinaldo Cabral, condena o que classifica como excesso de autoridade e desvio do verdadeiro papel do representante da comunidade. O Baré-Cola é o exemplo mais emblemático entre alguns líderes comunitários que não têm uma formação intelectual ou cultural e põem na cabeça que sabem tudo só porque desfrutam de algum poder na região, têm acesso a algum vereador ou deputado. Eles lidam com pessoas humildes e se transformam numa espécie de oráculo, achando que podem fazer qualquer coisa, afirma Cabral. /// Líder e cabo eleitoral Edvaldo Guilherme (Baré-Cola) foi executado no Conjunto Joaquim Leão. Foto: Arquivo GA