Autonomia foi um pr�mio pelo progresso
Tanto a sociologia como a psicologia dos povos estão profundamente afetados pelo fato histórico de sua emancipação política. É o dia e o mês que se sobressai no calendário, dividindo a história da sociedade em duas fases distintas: antes e depois da auton
Por | Edição do dia 15/09/2002 - Matéria atualizada em 15/09/2002 às 00h00
Tanto a sociologia como a psicologia dos povos estão profundamente afetados pelo fato histórico de sua emancipação política. É o dia e o mês que se sobressai no calendário, dividindo a história da sociedade em duas fases distintas: antes e depois da autonomia. É um dia que tem fisionomia própria, que se sobressai de imediato aos outros. Dia que tem um colorido especial desde a escola até o ambiente familiar, onde se passa a informação aos filhos e aos estudantes sobre o fato comemorado. Palestras, conferências, desfiles, feriado, fazem com que o acontecimento seja elevado a uma condição de data sagrada. O professsor, escritor e historiador Douglas Apratto Tenório, vice-presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e membro da Academia Alagoana de Letras, fala sobre este 16 de setembro, interrogando: O que faz doer o coração do alagoano neste momento tão venturoso? O que pretende empanar o brilho de nossa data maior?. A acusação O mesmo historiador responde: É a acusação de alguns historiadores pernambucanos como Pereira da Costa que, na verdade, a autonomia de Alagoas alcançada em 16 de setembro de 1817 seria a recompensa pela traição de Alagoas no episódio da Revolução de 1817, mantendo-se alinhada à Coroa, descumprindo compromissos celebrados com os revolucionários do antigo Leão do Norte. Segundo Apratto, longe de ocultar a polêmica, o melhor que se pode fazer para cicatrizar a ferida é conhecer o fato histórico, esclarecendo dúvidas, firmando posições, aprofundando o debate. O que foi a autonomia? Qual o seu significado? Foi justo o ato de D. João VI? Que papel desempenharam povo e elite na época? E o enigmático Ouvidor Batalha? Aderimos ou não aos revolucionários pernambucanos? O que significava no contexto da época o movimento republicano de 1817, deflagrado em Recife pelo Leão Coroado? Onde a traição? Inicialmente vamos considerar que é universalmente aceito, na França ou no Butão, no Acre ou em São Paulo, nos Estados Unidos ou no Chile, a sociedade valorizar os momentos mais criativos de seus antepassados, as datas mais decisivas de sua história. Momentos em que agindo em defesa de seus objetivos puderam alcançar os homens em seu tempo os anseios da coletividade. E é perfeitamente aceitável que a emancipação política de Alagoas foi um anseio da coletividade local. Como se contrapor a um projeto de ruptura entre duas sociedades de tronco comum mas de peculiaridades e características distintas. Um processo já desenvolvido em estado de maturação. É o caso de se perguntar onde e como houve a traição? Embora algumas vilas estivessem solidárias com o movimento revolucionário de 6 de março de 1817, desde o início, desde o primeiro momento, cidades como Atalaia, Anadia, em Alagoas e outras se colocaram em atitude de total fidelidade à Coroa. O Ouvidor Batalha nunca escondeu sua posição, nunca tergiversou. Era um homem da ordem e contrário ao movimento. Pode-se questioná-lo como homem do sistema, mas nunca de traidor. Prosperidade De acordo com Apratto, Alagoas tinha um crescimento econômico que justificava um corte do cordão umbelical com a Capitania do Norte. Sua renda, como atestam documentos e uma representação datada dezoito anos antes, era superior a algumas capitanias. Os insurgentes não tiveram cuidado de lutar por uma adesão popular ou mais ampla. Limitaram-se a uma rápida passagem aqui e a um contato com o comandante das armas que não era alagoano. A permanência do Padre Roma foi curtíssima. Mesmo assim parte de Alagoas se fez presente. Muitos dos seus filhos foram presos e martirizados como o coronel Fonseca Galvão, Manoel Lucas, Silva Morais. Quem desconhece a atitude de Ana Lins e Manoel Vieira Dantas na defesa dos ideais republicanos? Reconhecimento Douglas Apratto vê com propriedade a análise de Diégues Júnior: Fosse o 16 de setembro o resultado de um empreendimento dos próprios alagoanos, fosse uma dádiva da régia manuficiência, foi sempre um reconhecimento de que Alagoas tinha vitalidade robusta e elementos para realizar uma existência autônoma. E a afirmativa do também historiador Craveiro Costa, de que a Emancipação de Alagoas foi um fato natural, infugível, e dar-se-ia com a revolução ou sem ela. A revolução apenas precipitou o acontecimento inevitável e essa precipitação não foi devida à lealdade manifestada. O outro lado da questão, se tivemos, a exemplo da independência do Brasil, uma autonomia sem plenitude, face ao quadro de exclusão social que apresentamos, eu diria que sim. Sem que uma coisa apague a outra, salienta Douglas Apratto. E, em seguida, explica: Continuamos bem nitidamente com duas Alagoas, igual ao que era no período colonial. Senhores e escravos. Sem uma sociedade no sentido pleno, com objetivos e valores compartilhados. Ao lado de uma elite que obteve a autonomia plena, a maioria esmagadora da população que não a tem. Um dilema edipiano, nessa esfinge que tem origem porém, conhecida. É o caso de se perguntar se na quadra que vivemos não há nada a acrescentar sobre o evento. Não se pode apenas comemorar a data nos templos, nas casas, nos quartéis ou nas escolas, sem assumirmos novos compromissos para preservar a nossa herança histórica. E acho lamentável fazê-lo apenas com um formalismo estéril, que apequena a grandiosidade da data. Prefiro uma reflexão sobre o dia de hoje e pensando nas Alagoas de amanhã, pois a emancipação para ser permanente, deve ser vivida dinamicamente. Dia a dia, hora a hora, há forças que lhe contrapõem. Votar bem nas eleições de outubro, escolham os nossos representantes na política, por exemplo, é uma maneira de colaborar com a construção de nossa autonomia. De contribuir com o sonho de uma Alagoas independente e próspera.