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Sertanejos sobrevivem com verbas federais

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ROBERTO VILANOVA Traipu – O carpinteiro José Antônio, 50, mora na cidade e sobrevive da féria pelos consertos de barcos; seu Antônio Marcelino dos Santos, 60, mora na área rural e sobrevive de fazer balaios de cipó – mas ambos são como espécies em extinção na região ribeirinha do São Francisco. No município com o menor Índice de Desenvolvimento Humano – IDH – em Alagoas a maioria da população se mantém viva graças às verbas federais assistencialistas como o Bolsa-escola, Vale-gás e do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – Peti. Quinta-feira, 6, o dia amanheceu com a cidade ocupada por dezenas de paus-de-arara superlotados. Homens e mulheres embarcados nas fazendas e sítios do município vêm à cidade para aproveitar o único dia em que a Caixa Econômica Federal faz a transferência dos recursos financeiros da ajuda federal; quem perde o prazo fica sujeito à disponibilidade de caixa da única casa lotérica de Traipu – lá não tem agência da Caixa. Sacrifício O agricultor José Porfírio saiu às 4 horas da manhã do povoado de Piranhas, distante quatro léguas da sede do município, na esperança de receber 45 reais do Bolsa-escola referentes aos três filhos que mantêm estudando. Mas a casa lotérica não tem estrutura – além de pequena, apenas um funcionário para prestar todos os serviços; e não dispunha de moeda divisionária, o que complicava ainda mais a vida das pessoas obrigadas a aguardar o atendimento ao relento. “Se a gente não receber hoje, quando a Caixa faz o depósito, só em Arapiraca; mas aí tem a passagem, que custa dezesseis reais ida e volta. Aí, a gente tem de aguardar que a casa lotérica acumule dinheiro para pagar. Mesmo assim, não dá para pagar todo mundo”, afirmou Porfírio, explicando o sacrifício. Dependência Ao seu lado, dona Dulce Ferreira lembrava amargurada o que lhe aconteceu no mês passado, quando recebeu apenas 15 reais, apesar de inscrita nos três programas. “Já pensou se eu tivesse ido receber em Arapiraca? Ainda iria ficar devendo um real da passagem”!”, observou aliviada. A dependência do município em relação às doações do governo federal é tanta que em frente à casa lotérica formou-se uma feira livre; os feirantes tentam atrair os fregueses na boca do caixa, o comércio da cidade, mesmo acanhado, se agita. Calcula-se que o montante de dinheiro oriundo desses programas federais é de 200 mil reais por mês. Para o economista Cícero Péricles, professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), a dependência financeira não é de se estranhar; ele mesmo defende que, sem a ajuda do governo federal, Alagoas não tem como alavancar sua economia. “Alagoas é um problema federal, ou seja, a solução dos problemas do Estado passa por Brasília”, repetiu o economista, depois de analisar que a melhoria no Índice de Desenvolvimento Humano – IDH – registrada em alguns municípios se deve, exclusivamente, aos recursos financeiros federais liberados para educação e saúde. Para o economista, a década de 1990 foi perdida para o Estado e não há como Alagoas se recuperar, sem o apoio do governo federal. “O boom da década de 1970, com o Programa Nacional do Álcool, passou; o setor sucroalcooleiro alagoano não tem para onde se expandir horizontalmente”, mostrou. Abandono Embora os índices negativos de Traipu possam ser disfarçados pela beleza natural da cidade ribeirinha, construída exatamente à margem da única enseada formada pelo Rio São Francisco, o próprio governo reconhece que faltaram investimentos federais na região. E mesmo o acampamento dos sem-terra, à beira do rio, sofre com a carência de estrutura para a produção primária. “É inacreditável, mas é verdade. A gente vive à beira do rio e não tem água para irrigar a lavoura”, desabafa José Félix, que veio de Sergipe ocupar terra do lado alagoano. Mas ele explica: é estratégia do Movimento dos Sem-Terra, que evita ocupar propriedades com o pessoal que mora na mesma área. “Tem alagoanos assentados do lado de lá também”, justifica Félix. Mas nem tudo está perdido em Traipu, no município, que apresenta o menor Índice de Desenvolvimento Humano do Estado e um dos menores do País, há recursos naturais inexplorados, como os vales úmidos onde podem ser implantados projetos para desenvolvimento da rizicultura. Seria a volta ao passado – o município já foi um dos grandes produtores de arroz – com a vantagem da nova tecnologia à disposição dos produtores. “O único problema é o crédito bancário, que é caro, e a falta de apoio técnico. Sem crédito e sem apoio técnico não se faz agricultura”, ensina o fazendeiro Ildo Sergipano.

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