Política
Homossexuais querem disputar elei��es municipais com candidaturas assumidas

ARNALDO FERREIRA O presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis - ABGLT e que acumula também a presidência da Grupo de Gay de Alagoas - GGAL, Marcelo Nascimento, revelou que os gays alagoanos vão tentar lançar candidatos a prefeito e a vereadores, nas eleições municipais de 2004. Porém, admitiu que ainda existe muito preconceito da sociedade brasileira e, particularmente, nordestina, em votar em candidatos assumidamente homossexuais. Embora reconheça que existem políticos homossexuais, Marcelo Nascimento citou o escritor Antônio Pessoa para destacar que a homossexualidade é uma opção pessoal e, assim, cabe a cada homossexual definir o momento exato de se assumir. Apesar do preconceito forte da sociedade, Nascimento revelou que os homossexuais ?estão saindo do armário?. No Brasil, já existem 150 organizações e, em Alagoas, são dez entidades que formam o GGAL. A mais nova chama-se ?Filhos do Axé?, ligada ao Movimento Negro. /// - O Brasil está saindo do armário? - (Risos) Hoje é constatado pelas instituições e pela sociedade, que houve vários avanços. Os grupos homossexuais aparecem em todas as regiões do País, tanto que já se calcula que há em torno de 150 organizações nacionais. - E em Alagoas ? - Temos em torno de dez organizações na capital e interior do Estado. A mais nova entidade é o grupo gay afro-descendente ?Filhos do Axé?, fundado, oficialmente, no último dia 26 de abril. Este é um grupo que além de abordar a temática homossexual, tratará da questão da negritude e está inserido dentro do movimento negro de Alagoas. - Neste Estado a questão da homofobia (aversão violenta aos homossexuais) é muito forte. Já existe uma estatística sobre esse assunto? - Nas décadas de 1970, 80 e 90, esse tipo de crime com origem na homofobia foi hediondo e acontecia de forma sistemática. Hoje, a gente já pode dizer que, em termos de homicídio, há uma situação estável. Embora, os números da violência sem mortes, mas com registros de agressões físicas, verbais, perseguições, torturas e outros casos, permanecem altos, ao ponto de que vivemos, nos dias atuais, uma situação de epidemia. Só para vocês terem uma idéia, no ano passado, foram registrados cinco assassinatos e 60 casos de violação de direitos de homossexuais. Tudo isso foi notificado pelo Grupo Gay. - Os meios de comunicação de massa continuam agindo de forma violenta contra os direitos dos homossexuais? - Infelizmente, alguns segmentos dos meios de comunicação violam os direitos das minorias. Por exemplo, os programas de caráter policialescos precisam se refinar e se adequar às novas existências da comunicação de massa e respeitar os direitos da cidadania, respeitando as várias diferenças que existem entre as pessoas, entre elas, a orientação sexual. Inclusive, a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados lançou uma campanha nacional pela humanização dos veículos de comunicação, entre eles, a televisão. A campanha é para combater a baixaria que a gente assiste, hoje, nas emissoras de televisão de rede nacional. - Tem setores da Igreja que além de condenar o homossexualismo ainda trata a questão como uma doença. Como a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis entende essa interpretação religiosa? - Lamentamos a interpretação. Não é papel da Igreja dizer o que é ou não doença. A Igreja não tem acúmulo científico para diagnosticar nenhuma patologia. Esta é uma atribuição de médicos, cientistas da área de saúde pública. - Mas homossexualismo é uma doença? - A Organização Mundial de Saúde (OMS) definitivamente diz que não. Quando a OMS e o Conselho Federal de Medicina retiraram a homossexualidade da lista das patologias, esse tipo de discussão acabou. As maiores autoridades de saúde mundiais atestam que homossexualismo é uma orientação sexual saudável como as outras. - Como fica, então, a questão do pecado? - Aí há certa controvérsia porque o Vaticano saiu com a encíclica onde afirma que a homossexualidade é pecado. Embora, numa obra recentemente lançada - o livro se chama ?Orgia dos Papas? - há indicativos de que houve bispos que praticaram publicamente a homossexualidade. Portanto, a gente percebe, neste livro, as contradições com as críticas. - Os homossexuais alagoanos estão ?saindo do armário?? - Dizia Antônio Pessoa que a homossexualidade é uma opção pessoal e cada pessoa sabe a sua hora e o momento de assumir esta condição. Mas eu vejo que, hoje, os cidadãos homossexuais convivem com a sua condição, com menos tabus e menos complexidade. Boa parte da sociedade já abomina qualquer tipo de agressividade contra pessoas assumidas. - Quando o Movimento Gay de Alagoas terá o seu representante no poder político? - (Risos) Olha... já fizemos algumas tentativas, testamos o poder de voto da população homossexual. Mas, na realidade, o que existe é o seguinte: a população homossexual não vota no candidato só pelo fato de ele ser homossexual. É necessário que o candidato tenha outros atributos como honestidade, competência, propostas coerentes, plataformas; daí, estamos buscando uma personalidade do universo homossexual que possa levar ao cenário político as nossas bandeiras, mas que tenha, também, os atributos necessários para ser candidato. Porém, faço questão de registrar que ficamos muito contentes quando aparecem candidatos homossexuais. - Existem candidatos homossexuais? - Sim... Claro. Em toda eleição sempre aparece. Alguns são velados e outros assumidos. É evidente, também, que os candidatos assumidos são em menor número. Mas trabalhamos para estimular as candidaturas específicas de homossexuais. - Neste Estado existe algum tipo de candidato velado, que chegou a algum lugar na política? - Sim... Claro... E a sociedade toda conhece essas personalidades que são políticos, hoje, aqui no Estado... - Estes políticos não se assumem por quê? - Há ainda um forte preconceito impedindo que as pessoas que estão em cargos públicos ou mandatos assumam a condição de homossexuais. O próprio IBGE fez uma pesquisa, em 1988, e constatou que 60% das pessoas entrevistadas, em todas as regiões brasileiras, afirmaram que não votariam num candidato assumidamente homossexual. Porém, esta pesquisa tem uma contradição. O instituto GAPE fez uma pesquisa, entre 2001 e 2002, onde 55% dos entrevistados afirmaram que não teriam nenhum problema em votar num candidato gay. Então, acho que cabe muito mais a cada político ou candidato fazer a sua análise de externar ou não a sua condição. Claro que para nós seria motivo de orgulho ter um político externando a sua condição sexual. - O que vocês fazem, efetivamente, na luta contra o preconceito que ainda existe na sociedade? - Pagamos os nossos impostos, cumprimos as leis, respeitamos o nosso semelhante e a cidadania. Como cidadãos, desenvolvemos ações dentro do Movimento Homossexual. Entre as ações principais, destacamos os atos afirmativos, como por exemplo a Terceira Parada da Adversidade Sexual, que iremos realizar no dia 1o de junho, em Maceió. A atividade abrirá o circuito nacional das paradas gays. Vêm delegações de todas as cidades nordestinas e o nosso ícone entre os artistas, Edson Cordeiro, será uma das grandes atrações. Recebemos apoio de vários setores da sociedade, indústria, comércio, do Estado, da Prefeitura de Maceió, Assembléia Legislativa, por meio de vários deputados, do Ministério da Saúde, Unesco e diversas ONGs. Estamos num caminho de encontro ao preconceito e, assim, buscamos o respeito de todos.