loading-icon
MIX 98.3
NO AR | MACEIÓ

Mix FM

98.3
segunda-feira, 14/07/2025 | Ano | Nº 6009
Maceió, AL
24° Tempo
Home > Política

Política

Um país de corruptos nunca será soberano

Ouvir
Compartilhar
Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Whatsapp

| LUIZA BARREIROS Repórter Para o consultor internacional Angel González-Malaxetxebarria, o problema da corrupção está na base da sociedade. Especialista na área de auditoria de contas públicas com mais de 30 anos de experiência, com passagem por organismos financiadores importantes como o Banco Mundial onde atuou como especialista em gestão financeira e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) onde foi chefe da auditoria de projetos internacionais , ele diz acreditar que sem indivíduos honrados não é possível ter nações e estados honrados e soberanos. Espanhol, mas morador de Miami (EUA), ele ministra cursos em nível máster internacional em países como Argentina, Paraguai, Chile e Espanha. Na última quinta e sexta-feiras, Malaxetxebarria esteve em Alagoas, onde fez um breve seminário para o corpo técnico de fiscalização do Tribunal de Contas de Alagoas, sobre o que há de novo no exercício da auditoria pública. O auditório do TC ficou lotado de técnicos, estudantes e profissionais da área, mas não havia nenhum auditor do próprio TC entre os participantes. Simplesmente porque, há mais de dois anos, o Tribunal não tem em seus quadros auditores e membros do Ministério Público Especial, cargos que deverão ser preenchidos através de concurso público ainda sem data para acontecer. Angel Malaxetxebarria aproveitou um convite feito pelo Tribunal de Contas da Bahia e, após proferir um curso de Salvador, veio a Maceió, onde falou para técnicos do TC. No intervalo da apresentação de quinta-feira, ele concedeu à Gazeta a entrevista a seguir. Gazeta - Por que temos a sensação de que a auditoria pública está sempre atrás na corrida contra a corrupção? Malaxetxebarria - O cidadão não deve esperar que o auditor público acabe com a corrupção. Não: a função de um auditor, seja público, seja privado, não é descobrir fraudes. Hoje em dia, considera-se que é responsabilidade deles fincar atenção sobre a possibilidade de que a fraude ocorra: recomendar ao órgão executivo da empresa que está examinando, seja pública, seja privada, mecanismos de prevenção. Mas é preciso deixar absolutamente claro que a função de auditoria não é descobrir fraudes, mas tratar de prevenir a execução dessas fraudes. A função é assessora ao Legislativo, ao Executivo e ao Judiciário, e como tal o auditor deve tratar de sugerir sistemas e mecanismos condizentes com a prevenção da fraude. Falta investimento dos governos na área de auditoria? Eu acho que hoje em dia, em todos os governos da América democrática, de uma ou outra maneira, pelo menos eles se dizem interessados em combater a corrupção. Mas se existe a corrupção dentro dos governos, a corrupção é um problema político que eles têm. Se não se está convencido disso, não há o que fazer. Costumo dizer nas minhas palestras que a corrupção é endêmica e pandêmica. Há vários anos, dei uma conferência em Buenos Aires, com o título Fraude, corrupção e desperdício, uma epidemia sem fronteiras. Nela, eu falei que a corrupção, hoje em dia, é pandêmica. Muito do dinheiro desviado pelos países vem de organismos financiadores internacionais como o Banco Mundial e o Banco Interamericano, para os quais o senhor já trabalhou como auditor? Eu não tenho estatísticas, mas como fui praticamente o fundador do setor de auditoria internacional do Banco Interamericano e especialista principal em gestão financeira do Banco Mundial, já ouvi algumas pessoas falarem que de 20% a 25% do dinheiro investido por esses órgãos financiadores sumiu, desapareceu. Tenho um trabalho que denomino Os neologismos da corrupção mundial através dos organismos de financiamento, onde eu falo de um caso famoso de um país africano, a Sumatra, que vamos inventar novos verbos de corrupção mundial, como o ?sumatrar?, para indicar um assalto ao erário público. A população morrendo fisicamente de fome, e, no entanto, eles viajam por todo o mundo e gastam em palacetes e habitações fabulosos. Quanto do dinheiro do desenvolvimento internacional está incluído? Aí eu não sei, mas tenho motivos para acreditar que é uma parte considerável. O trabalho de auditoria tem semelhanças nos diferentes países em que há corrupção? Na palestra que fiz aqui em Maceió, falo que um dos inconvenientes da globalização é que globalizaram a corrupção. Evidentemente, em todos os locais, os procedimentos de auditoria têm que enfocar a base do problema. E a base do problema em qualquer país é a formação do indivíduo, a formação da família. Se não temos indivíduos honrados e se não constituirmos uma família honrada, não temos nações e estados honrados. Por isso eu sempre digo: nunca será soberano um País de corruptos porque a corrupção é o inimigo primeiro da soberania nacional. O que há de mais novo e moderno da área de auditoria no mundo? A situação das fraudes obriga os governos e a própria profissão de auditores a novas tecnologias. Hoje em dia, auditoria não se faz como quando eu comecei, há 50 anos. É completamente diferente. E geralmente nos países mais poderosos, isso foi feito através de nova legislação, e um dos problemas é que estão levando os auditores a esquecer o monopólio das regras de auditoria. Os auditores deixaram de ser os donos de sua profissão e agora os governos, como o dos Estados Unidos, estão impondo suas regras de auditoria aos auditores. Mas para responder à sua pergunta, é certo que as novas tecnologias têm que ser adotadas pelos auditores. Um exemplo é algo muito importante para o Brasil, que é a auditoria ambiental. Um país que tem o privilégio de ser praticamente o dono da Amazônia, tem o direito soberano de ficar preocupado com o que os governos de fora estão fazendo com a Amazônia. A Amazônia não é só do Brasil, mas da humanidade! Então é preciso conscientizar o cidadão de que é preciso proteger o meio ambiente. Eu tenho um livro editado pelo Instituto de Auditores da Espanha, com o título Auditoria do Meio Ambiente, evolução, histórica profissional em que falo das técnicas e que, historicamente, a auditoria nessa área foi capturada pelos engenheiros, que passaram a se denominar engenheiros ambientais. Que segmentos no Estado são mais vulneráveis à corrupção? Eu acho que são as unidades do Estado que manuseiam mais dinheiro. Não posso acusar os departamentos de obras públicas, mas obviamente é um dos principais setores que tem controle sobre a utilização de recursos públicos. A estrutura administrativa brasileira contém um grande número de cargos de confiança, nomeados sem a exigência de concurso público. O senhor considera que esse é um fator que contribui para a existência de corrupção? É difícil imaginar que uma pessoa que esteja numa função dita de confiança se envolva com corrupção. Mas há o testemunho de um político cassado pela ação de um órgão de controle que mostra como é possível combinar o cinismo com a ignorância. Ele diz: O povo colocou-me nessa posição como político de confiança e não como especialista em contabilidade e finanças. E a imprensa e o partido político apóiam incondicionalmente esta desesperada autodefesa. Infeliz, você sabe quais são as suas responsabilidades como administrador público? Você sabe que não pode deixar de cumprir nem permitir que seus subordinados não cumpram as normas e leis vigentes? Ou deixar de informar fidedignamente sobre a execução do seu orçamento ao povo que elegeu você não como político, mas porque acreditava que estava votando em um candidato, você, e sua equipe de trabalho, íntegro como pessoa e honrado administrador? No Brasil é comum que as CPIs do Congresso Nacional descubram irregularidades na administração, que na maioria das vezes passam despercebidas pelos órgãos de fiscalização. Por que isso acontece? Primeiro porque, como já falei antes, não é missão primordial dos órgãos de controle fazer essas investigações. Há muitas maneiras de fraude: algumas mais visíveis, que estão na sua frente e são mais fáceis de ser detectadas, e há alguns em que são mais baixos, e são muito mais difíceis. Os países que têm os melhores sistemas de controle são Suécia, Grã-Bretanha, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Israel. O que é muito interessante é que Israel é o único país do mundo onde é instaurada a auditoria ética. Lá, o controlador do Estado pode examinar a integridade moral dos inspecionados e se as entidades inspecionadas têm atuado de maneira moralmente irrepreensível. Não existe nenhum País que tenha esse tipo de legislação. Eu acho que é um exemplo, se não a seguir, mas a ser conhecido. No exterior, o Brasil tem a imagem de País corrupto? Não. Geralmente o que acontece é o seguinte: os países desenvolvidos, que estão falando da corrupção, esquecem que não há corrupção sem corruptor. Há outros países que não vou mencionar, na América Latina, que são lembrados imediatamente ao se falar em corrupção, e eu acho que entre eles não está o Brasil. Onde há impunidade há mais corrupção? Claro. No Brasil, da mesma forma que em países de origem mediterrânea, há uma inflação de legislação. O inglês tem um provérbio muito difícil de traduzir, mas que quer dizer que o interessante não é ter a lei, mas fazer cumprir a lei. Então, tanto quanto não exista vontade política de que uma lei tem que ser cumprida, ela não será. O senhor conhece a Lei de Responsabilidade Fiscal brasileira? Sei que existe, mas não tenho conhecimento dos resultados dela para o Brasil, por isso não poderia falar sobre essa lei. Que país é considerado exemplar por ter sofrido com a corrupção, mas que conseguiu pelo menos uma redução a níveis loteráveis? Existe o índice de corrupção medido pela Transparência Internacional, que foi criado por um amigo meu, o advogado Peter Eigen, ex-diretor do Banco Mundial. Eu já falei para ele que o índice está criando um imbróglio político para muitos países, que protestam da maneira como está computado no ranking. Parece que já existe uma idéia premeditada de colocar o dedo nesse país e dizer: aqui está a Nigéria, a Bolívia. Na América Latina, o país que, pelo menos aparentemente, tem menos corrupção é o Chile, e parece estar conseguindo ter um bom desenvolvimento. ### QUEM É Nome: Angel González-Malaxetxebarria Idade: 75 anos Naturalidade: Bilbao (Espanha) Cargo: Consultor internacional na área de auditoria Formação: Filosofia, Letras, Ciências Hobby: Jogar pelota basca

Relacionadas