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Nº 5886
Política Deputado Paulão diz que vídeo da reunião ministerial de Bolsonaro é “circo de horrores”

POLÍTICOS DE AL SE DIVIDEM SOBRE VÍDEO DE REUNIÃO MINISTERIAL

Bancada federal e deputados estaduais se mostram surpresos com ataques ao Judiciário, mas não com a linguagem de Jair Bolsonaro

Por Marcos Rodrigues | Edição do dia 26/05/2020 - Matéria atualizada em 26/05/2020 às 06h00

Um dia após o Brasil conhecer uma face serena, educada, cordial, administrativa e objetiva do presidente Jair Bolsonaro, a divulgação do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril veio à tona e desmontou as impressões sobre ele de 24h antes. Na oportunidade, ao se reunir com 27 governadores dos estados e prometer R$ 60 bilhões de ajuda no combate à pandemia do novo coronavírus, Bolsonaro chegou a ser elogiado por seu desafeto político, o governador de São Paulo, João Dória (PSDB). A repercussão das imagens do mês passado, cercada de palavrões, ameças e insinuações à democracia e até ataques de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) dividiu a opinião pública de lideranças políticas alagoanas.

Em princípio, o foco do vídeo seria a confirmação das declarações do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro. Isto porque ao deixar o cargo, ele acusou o presidente de tentar interferir, por meio das atribuições do cargo, na Polícia Federal. Mas, em pouco mais de duas horas de conteúdo, foram várias as revelações.

A primeira delas - quase unanimidade entre as lideranças ouvidas pela Gazeta - é quanto ao seu comportamento. Todos ou quase ninguém demonstrou surpresa com a explosividade demonstrada e os vários impropérios ditos contra e diante de tantas autoridades de seu próprio governo.

Uma delas, a deputada Jó Pereira (MDB), com seu jeito ponderado de ser, lembrou que o presidente foi o que realmente é, desde antes de assumir o maior cargo eletivo do país. Para ela, isso é consequência do modo como os eleitores têm se comportando nas eleições.

"Infelizmente, o Brasil tem escolhido nos últimos pleitos pessoas e não projetos, e isso é muito prejudicial para o nosso desenvolvimento. Personificar a escolha, sem discutir um projeto de Nação, não é saudável para a democracia. Percebe-se ainda que o presidente da República se afastou do combate à corrupção, que não existe diálogo, nem entre os ministérios e órgãos federais importantes, nem entre poderes ou membros da federação", analisou Jó.

Com seu olhar crítico, ela não deixou de perceber uma ausência quase total de planejamento para o principal desafio da saúde brasileira hoje: o combate à Covid-19. Jó lembrou que o problema, além de grave, não tem precedentes na história da humanidade.

"O tema foi minimamente abordado. Uma pena, uma reunião que juntou todos os ministérios, que poderia ter sido rica em encaminhamentos e decisões importantes, no sentido de aliviar os efeitos da pandemia, nos trouxe preocupação e certeza de que seguimos sem uma coordenação do enfrentamento da pandemia, em todas as áreas", apontou Jó.

Sem efeito

Seu colega de parlamento, o deputado Cabo Bebeto (PSL), eleito na onda bolsonarista que varreu o Brasil e por sua liderança construída na eleição anterior, achou que houve inclusive uma estratégia do Palácio do Planalto "em valorizar" a entrega do conteúdo para criar uma maior expectativa sobre o que seria revelado. Ao seu modo de ver, a questão acabou sendo "positiva" para Bolsonaro.

"Criou-se uma curiosidade enorme sobre ele. E o que eu vejo que o resultado foi bem positivo para o presidente. Inclusive aliados que estavam desanimados, ganharam um gás muito grande com a sua exibição. Discutindo sobre com minha assessoria, alguns até brincaram comigo porque achavam que eu é que falava muito palavrão. E eu realmente falo. Me policio no plenário da Assembleia Legislativa, mas no meu dia a dia, no trato e quando pesco falo que só a p****.", revelou Bebeto.

Sem demonstrar surpresas com o conteúdo, ele acha que o presidente acabou demonstrando para as pessoas que o jeito de ser nas ruas, no contato com as pessoas, com o público é o mesmo nos bastidores. Isso pode ter demonstrado para o seu eleitor ou simpatizante que ele não mudou com a chegada ao poder. 

"Eu vi um vídeo de uma reunião, sem nenhuma hipocrisia ou demagogia, onde existia um líder que naturalmente é assim. Tem trato simples com todo mundo. Tem uma comunicação peculiar dele. Para mim, o diálogo do Bolsonaro me traz segurança e sinceridade e muito feliz com esse vídeo. Acho que ele sai vitorioso e fortalecido. Quando faço reuniões com minha assessoria os apertos acontecem, cercados de reclamação e conversas. Quando estamos no meio de aliados não ficamos se podando para falar. O cara fala à vontade. Certamente, se fosse uma reunião com líderes mundiais, ele não teria aquela linguagem", considerou o deputado do PSL.

Para Bebeto, o que foi revelado é algo natural. Além disso, o que vai ficar para a população é a imagem de um presidente simples e humilde que "fala olhando no olho" e que cobra resultado. "Vi ali o cara que eu votei e estou satisfeito demais"., concluiu o deputado.

Sem provas

Segundo o deputado Marcelo Beltrão (MDB), se o principal objetivo da exibição do vídeo, como determinou o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), era confirmar a versão apresentada pelo ex-ministro Sério Moro, em sua avaliação o efeito lhe pareceu inexistente.

"Eu não vi motivação para impeachment ou qualquer coisa parecida, nem que certificasse a afirmação do ex-ministro Sérgio Moro", destacou Beltrão, referindo-se ao foco e o que teria motivado sua revelação.

Isso, porém, não torna sem efeito o modo como a reunião foi conduzida, em especial com vários palavrões, que fogem à liturgia do cargo, ainda mais estando diante de outras autoridades.

"A linguagem baixa não está nos níveis adequados  para o cargo. A questão do ministro da Educação [Abraham] Weintraub, num total desrespeito ao Judiciário, desequilibra a autonomia dos poderes. Além do ministro do Meio Ambiente [Ricardo Salles] também se aproveitar da situação para encaminhar os interesses do ministério. Fora isso não vi motivação nenhuma de impeachment", reafirmou Marcelo. 

Desrespeito

Para o líder da bancada federal de Alagoas em Brasília (DF), deputado Marx Beltrão (PSD), o momento exigia maior foco e respeito às questões relacionadas a crise sanitária. Para ele, foram vários os exageros cometidos por alguns presentes, como a ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, e o ministro da Educação.

"Acredito que algumas falas do vídeo são descabidas, especialmente os desrespeitos para com o Poder Judiciário e a sugestão de prisão de governadores e prefeitos", observou Marx.

Sobre o comportamento do presidente, ele também não se surpreendeu, pois além de conhecê-lo do parlamento, mesmo no cargo de mandatário do país ele já havia agido de modo semelhante.

"Sabemos que o presidente Bolsonaro tem um linguajar próprio e isso não é novidade para ninguém. Exaltar-se em reuniões, por exemplo, é algo que pode ocorrer no calor do debate", ponderou Beltrão.

Em relação à acusação do ex-ministro Moro e a tentativa de mostrar essa prova no vídeo, para ele é cedo para se fazer um julgamento. Tanto que ao invés de desconsiderar a chamada prova técnica, ele defendeu que haja maior apuração. 

"Quanto à suposta interferência na Polícia Federal, é preciso apurar com mais profundidade para se evitar pré-julgamentos, lembrando que todos têm direito à defesa", defendeu o líder da bancada alagoana.

Despreparo

A oposição acredita que o vídeo, além de ter a prova apontada pelo ex-ministro da Justiça, acaba por revelar outros crimes que precisam ser apurados. O deputado Paulo Fernando dos Santos, o Paulão (PT), classificou o conteúdo como "circo de horrores".

"O vídeo é um circo de horrores porque percebemos a desqualificação e incompetência de uma forma generalizada dos seus ministros. Ataque aos servidores de forma irresponsável, colocando-os como inimigos. O ataque ao Banco do Brasil, que é uma das instituições mais antigas e sólidas e sua meta de querer privatizá-lo a qualquer custo. Ele representa o rentismo e o capital especulativo. O objetivo é privatizar as jóias da coroa. A irresponsabilidade, insanidade e visão desumana do ministro do Meio Ambiente para 'abrir a boiada', o que consequentemente atinge os povos indígenas e comunidades tradicionais e quilombolas", criticou o petista.

Ele vai além ao considerar que o ataque aos poderes revela também o desrespeito à democracia e à ordem constitucional. Como exemplo lembrou o que disse a ministra Damares, que defendeu "em forma de ataque" a prisão de prefeitos e governadores "por terem visão diferenciada entre a ciência e o negacionismo".

"Não podemos deixar de destacar a postura leviana do ministro da Educação atacando o Poder Judiciário e o STF. E a submissão dos ministros que representam as Forças Armadas. O coordenador da reunião, o ministro e general Braga Neto, achei que teria uma postura de gestão, mas pelo contrário: ele ficou dando aval à postura do presidente. E o Bolsonaro, de cada dez palavras, oito eram pornografia, demonstrando falta de estatura para um presidente da República", completou Paulão.

Se por um lado esses destaques já são sérios, o que não pode ser esquecido é que a maior crise sanitária que o país está vivendo "não foi tocada em nenhum momento", mesmo com a curva de morte que já vinha aumentando.

"Não foi apresentada nenhuma estratégia para fortalecer a saúde pública no sentido de se ter uma rede estadual, municipal, montagem de hospitais e a compra de respiradores com a China. Além disso, falar da restruturação produtiva da indústria que é capaz de construir avião, lançadores de mísseis e navio não consegue fazer respirador. Foi um desalento e uma decepção. Por isso que cai nas pesquisas de forma forte, inclusive no eleitorado de classe média que votou nele. Lamento muito. Isso demonstra que estamos vivendo um momento difícil no Brasil. Não temos um presidente do Brasil, e sim um genocida no comando e com o apoio das Forças Armadas", completou Paulão.

Para finalizar, ele lembrou, ainda, que a economia mundial terá graves problemas nos próximos anos e o país não demonstrou nenhuma estratégia para enfrentar essa situação que vai comprometer quem já perdeu o emprego agora, mas principalmente os jovens no futuro. 

Valores

Em sentido contrário, o presidente do PSL em Alagoas, o agente de Polícia Federal Flávio Moreno, diz que o vídeo reafirma valores de defesa da família, do porte de arma e do desenvolvimento econômico, típico de um país que quer crescer. Ele também desconsiderou o seu poder como prova para a denúncia e o inquérito aberto a partir da denúncia que Moro fez contra o presidente.

"Com a liberação do vídeo não vejo elementos jurídicos para caracterização de crime de responsabilidade e improbidade administrativa, e que gere um processo de impeachment do presidente Jair Bolsonaro. O uso político do vídeo de uma reunião fechada entre ministros vai existir por ambos os lados, situação e oposição", disse Moreno.

Ele também reconheceu que o momento é de crise mundial na economia, algo parecido com a quebra das bolsas em Nova York, em 1929, e por isso defende o combate ao coronavírus como sendo estratégico para que o país aponte o quanto antes caminhos para o futuro.

"O Brasil e o mundo enfrentam a maior crise de saúde e econômica da história desde a crise de 1929. Precisamos focar no combate ao vírus chinês, nas medidas sanitárias e de contenção do vírus e na manutenção das empresas e empregos, sob pena de uma catástrofe humanitária ainda pior. Todos os esforços dos Estados e Nação devem estar voltados para a sobrevivência das pessoas e da economia", acrescentou Flávio Moreno.

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