Há muito tempo, a principal preocupação da Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) não vem sendo salvar vidas, atender pacientes cardíacos e otimizar prestadores de serviços. A partir do momento em que o secretário Alexandre Ayres foi escalado pelo governador Renan Filho (MDB) para ser candidato a deputado estadual pelo seu grupo político, a lógica de funcionamento passou a ser a conquista de votos e o emprego de futuros "cabos eleitorais". A avaliação é de deputados da Assembleia Legislativa (ALE).
Nem o pedido de aliados políticos passou a ter valor. Que o diga o deputado Dudu Ronalsa (PSDB), que criticou na Assembleia Legislativa a postura de Ayres e seus assessores. O uso da pasta com fins eleitorais começou com o fortalecimento do coordenador de sua campanha, o médico sargento Marcos Ramalho. Nos últimos seis meses, ele recebeu um supersalário de R$ 72 mil que resultou em R$ 343,975 mil no primeiro semestre. Tudo com a complacência do ex-diretor do Samu, levado para o Hospital Metropolitano.
"Infelizmente, o que temos visto é que o Secretário Alexandre Ayres só tem resolvido os problemas quando as pessoas que nos procuram vão até o instagram pessoal dele (secretário) em busca de solução. Não tenho nada a ver se o Ayres é candidato. Mas ele não pode utilizar a Secretaria para fins eleitorais. Pelo menos é assim que tem ficado claro", relatou Dudu Ronalsa.
Dudu confirmou que, diariamente, é procurado por pessoas com problemas cardíacos que não foram atendidas no HGE. Ao procurar a secretaria, encontrou resistência desde o próprio secretário e, até mesmo, de seus assessores. Segundo o parlamentar, Alexandre tem desprezado ligações já pensando na campanha eleitoral.
Mesmo com o evidente desvio de finalidade e suposta improbidade administrativa, já que o salário de Ramalho teria sido fruto de plantões inexistentes, Dudu não defende a instalação de uma CPI da Covid-19, mas apoia o avanço das investigações. Em sua avaliação, não é momento para isso, já que as denúncias serão apuradas pela Comissão de Saúde.
Denúncia
As apurações sobre o Marajá da Saúde avançam com o deputado Davi Maia (DEM). Ele já sabe que o indicado de Ramalho, responsável pelo Departamento de Recursos Humanos, é quem demite funcionários para atender as indicações da Sesau. Ele, inclusive, é subordinado ao sargento, o que, em si, já se constitui numa ilegalidade administrativa por conta do conflito de interesses.
No Hospital Metropolitano, Maia e sua equipe tiveram contato direto com o diretor, que se recusou a lhe fornecer documentos com as assinaturas de Ramalho nos supostos plantões. O parlamentar foi indagado sobre a falta de um pedido formal de informações. A solicitação havia sido feita um dia antes, na própria Sesau, mas não havia sido encaminhada para o setor de RH. Davi, então, fez um pedido de próprio punho.
Até o momento, segundo Davi, só foi possível rastrear que os pagamentos dos supersalários ocorreram por seis meses, mas há suspeitas de que tenha se iniciado ainda no passado. Por isso a necessidade do acesso a mais documentos. Por esta razão, o parlamentar defende que os fatos seja investigados a fundo, já que nem Ayres nem Ramalho estariam agindo sem o conhecimento do governador.
"Sou a favor da instalação de uma CPI para investigar os gastos do Poder Executivo no combate à pandemia de Covid-19. A denúncia de supersalário é apenas um dos itens de escândalos que podem ser constatados na pasta, que vem sendo usada para promover o então secretário, que já vem usando a máquina pública na promoção de sua pré-campanha a deputado estadual", disse Davi.
Como sabe que, até o momento, chegou apenas à ponta do esquema, mas o suficiente para provocar o silêncio de Renan Filho, Maia vai encaminhar tudo o que conseguiu, até o momento, uma robustecida denúncia, ao Ministério Público Federal (MPF) e ao Ministério Público Estadual (MPE). Até o momento, nenhum das notas divulgadas pela Sesau contestou as suspeitas de ilicitudes. Apenas tentam amortecer o impacto político do que foi revelado, mas não explicam nada.
Ontem à tarde, o deputado foi até a sede do Samu, no bairro do Farol, em busca de mais informações sobre a situação funcional do Marajá do Governo. Lá encontrou péssimas condições de trabalho, ouviu denúncias de assédio moral, ambulâncias quebradas, e, num vídeo publicado em suas redes sociais, disse que o local é insalubre.
"Descobrimos que falta material, falta EPI, material de oxigênio, cinco carros quebrados e fora 15 que estão na oficina. Ficou claro, também, que, aqui, o sargento Ramalho teria dado 14 plantões, mas não vem nem aqui", relatou Davi.
Bombeiros
Como o principal foco das denúncias, até o momento, atinge um oficial médico do Corpo de Bombeiros, o deputado Cabo Bebeto (PTC), que, além do MP e da Comissão de Direitos Humanos, vai oficiar ao Corpo de Bombeiros pedido para obter informações sobre "as coincidências" envolvendo Ramalho.
“O CBMAL é uma instituição centenária, que tem, diante da população, um reconhecimento enorme do seu papel e não pode ter seu nome manchado”, disse Bebeto.
Segundo o parlamentar, agora está claro porque, durante a fase mais crítica da pandemia, lhe foi negado o acesso ao Hospital de Campanha Dr. Marcelo Constant. Ele também criticou o fato de que, no Hospital Metropolitano, só tem acesso quem é escolhido, mas que, enquanto isso, no HGE tem pessoas comendo quentinhas nos corredores e morrendo por falta de cirurgias.
“É preocupante quando baixamos a cabeça e nos é tirado o acesso à informação, que é pública, mas aqui é a Terra dos Calheiros, pois a Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), há muito, deixou de ser de Alagoas para ser do Ayres e do Calheiros”, disse Bebeto em seu pronunciamento.
Gelo
Se, por um lado, nenhum órgão de fiscalização e controle se manifestou até o momento, nem o próprio Marajá Ramalho, além do secretário Alexandre Ayres, que não veio a público, ambos já foram escanteados pelo governador Renan Filho.
Em visita ontem à UPA de Arapiraca, isso ficou evidente, já que nenhum dos dois foi convidado para o compromisso, mesmo sendo diretamente ligado à estrutura que comandam. O que fica claro é que Renan, agora, quer distância dos dois.
Outro lado
Em nota, a Sesau apresentou sua versão. Veja a íntegra:
A Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (Sesau/AL) esclarece que todos os profissionais que atuam na linha de frente da Covid-19 estão recebendo salários dentro da média do mercado desde o início da pandemia. Não há caso individual, exceções ou favorecimento sejam enfermeiros, médicos, assistentes sociais, técnicos de enfermagem, entre outros. Assim como não há qualquer tipo de ilegalidade no processo de remuneração desses quase 4000 profissionais que estão há 18 meses trabalhando incansavelmente para salvar vidas. O Estado de Alagoas obteve um dos melhores resultados do Brasil no enfrentamento à doença e não mediu esforços para que não houvesse escassez de profissionais de saúde e para que todos eles tivessem as melhores condições de trabalho na batalha contra um vírus desconhecido.
* Com assessoria