
ECONOMISTA DIZ QUE PREFEITURAS SOBREVIVEM DE REPASSES FEDERAIS
Segundo Cícero Péricles, situação beneficia principalmente os municípios sem arrecadação própria
Por arnaldo ferreira | Edição do dia 28/05/2022 - Matéria atualizada em 28/05/2022 às 04h00
O professor Cícero Péricles, doutor em economia da Universidade Federal de Alagoas, observou que as prefeituras dependem das transferências federais neste momento. Principalmente do FPM e do IPI- (Imposto sobre Produtos Industrializados). Estados como Alagoas estão sendo beneficiados com o aumento da arrecadação do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), porque os preços dos produtos dispararam. Uma parte da arrecadação do ICMS e do Imposto Sobre Veículos Automotores (IPVA) também é transferida para os municípios. “Essa situação beneficia principalmente as pequenas prefeituras que não têm arrecadação própria relevante. Esses municípios vivem das transferências. Alagoas também”. Além desses repasses, Péricles destacou que o Estado recebe anualmente R$ 9 bilhões (quase 90% do orçamento estadual) em pagamento dos segurados da Previdência e 400 mil alagoanos recebem mensalmente R$ 400 do Auxílio Brasil. “Essas transferências aquecem a economia municipal. O que preocupa neste momento é o processo inflacionário que reduz a capacidade de compra dos mais pobres”. Péricles observa que a disputa eleitoral de outubro não causará impactos políticos significativos nos cofres municipais, porque, segundo ele, o processo de discussão envolve temas nacionais e expectativas macroeconômicas. “A vida política municipal está ligada às atividades básicas: saúde, educação, transporte, assistência social, por isso o setor não é um ator proativo. As prefeituras são setores reflexivos”. Ele concorda com a tese de que o futuro governo federal terá que ter uma visão menor de Brasília e maior do Brasil. “Estados e Prefeituras ficam com a responsabilidade de manter os serviços básicos e atender a população. Isto tem que ser acompanhado com o crescimento das transferências orçamentárias dos programas que estão municipalizados”. Os pequenos municípios não suportam as transferências das responsabilidades sem recursos, frisou o professor. O economista observou que a inflação não cairá até o final do ano, e o desemprego também permanecerá em alta. No campo, o desemprego será menor.
AUMENTO DOS CUSTOS ASSUSTA GESTORES MUNICIPAIS
A inflação favorece o aumento da arrecadação, admitem os prefeitos. Por outro lado, é preocupação dos gestores os juros altos e o crescimento dos índices inflacionários que fazem desvalorizar os recursos da arrecadação muito rápido. Por isso, o presidente da Associação dos Municípios, Hugo Wanderley (MDB), recomenda aos prefeitos com dinheiro em caixa que devem aplicar os recursos no mercado financeiro a fim de evitar prejuízos maiores com a defasagem da moeda. “Inflação, apesar de promover o aumento na arrecadação, impacta forte nos serviços e na manutenção da máquina pública, que enfrenta o aumento nos preços dos combustíveis, manutenção da frota municipal e dos insumos. Dessa forma, o aumento na arrecadação pode levar à falsa interpretação porque os custos administrativos também dispararam, e a moeda está perdendo valor se ficar parada”. A AMA tem dados que confirmam que mais de 90% dos municípios do Nordeste, e particularmente de Alagoas sobrevivem, exclusivamente, das transferências federais, dos repasses de parcelas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do Estado. Com a retomada da economia municipal depois de dois anos de pandemia, a previsão é que os municípios terão dificuldades para fechar as contas. Por outro lado, as prefeituras estão com a economia aquecida por conta dos pagamentos dos Segurados da Previdência e do Auxílio Brasil, que repassa, mensalmente, R$ 400 para mais de 400 mil famílias em situação de extrema vulnerabilidade social. A outra boa notícia é que neste período pré-eleitoral, o governo federal está reduzindo a fila de espera para novos candidatos ao auxílio. Os comerciantes e prefeitos lamentam, porém, que a inflação corrói o poder de compra das famílias. O botijão de gás custa mais de R$ 110, e as contas de luz consomem a metade do Auxílio Brasil.
As perspectivas para 2022, segundo o prefeito Hugo Wanderley, são preocupantes por causa do processo inflacionário, dos benefícios fiscais implantados pelo governo federal para alguns setores. Isso impactará na queda da arrecadação e na falta de um programa definido para a retomada da economia. “A maioria dos 5,5 mil prefeitos estão preocupados com o futuro”. Mesmo assim, o processo eleitoral não atrapalha a gestão municipal. “O maior desafio dos prefeitos é enfrentar os problemas sociais, com o aumento da miserabilidade e do desemprego”, disse o presidente da AMA ao recomendar aos gestores que dialoguem com as autoridades federais, estaduais e segmentos produtivos para que possam ajudar a retomada do crescimento do Brasil, Estados e Municípios.
REAJUSTE
O prefeito de Coruripe, Marcelo Beltrão (PP), também considerou que os gestores voltaram a enfrentar dificuldades por conta da inflação, aumentos dos combustíveis e por consequência do custo de vida. “Os programas federais não têm reajustes, e os prefeitos agora fazem o que é possível para manter setores vitais como saúde, educação e assistência social e manter os investimentos em obras de infraestrutura”. Ele não considera que a disputa eleitoral do momento comprometa a gestão municipal. Ao ser questionado o que espera do futuro presidente foi taxativo: “Espero uma gestão federal com menos Brasília e mais Brasil”.
SERTANEJO
O prefeito Jorge Dantas (PSDB), que pela quarta vez foi eleito para a prefeitura sertaneja de Pão de Açúcar, também trabalha com cautela e observa que o aumento na arrecadação pode ser ilusório, “Todo mundo sabe que a inflação é o melhor imposto que existe para arrecadar. Mas, para a população é um desastre. Se por um lado a nossa arrecadação aumenta, por outro, as despesas seguem no mesmo ritmo e a gente não pode aumentar os nossos tributos na mesma proporção”. Como exemplo citou o caso da licitação para a compra de combustíveis da prefeitura cujo custo mais que dobrou em um ano.
Pão de Açúcar, além das transferências federais, tem no FPM a maior arrecadação, em média chega a R$ 2 milhões/mês. Porém, os pagamentos das obrigações previdenciárias patronal que estavam em 21% agora estão em 54%. Atualmente, a prefeitura gasta 53% da arrecadação com pagamento da folha de pessoal. O limite estipulado pela Lei de Responsabilidade Fiscal com gasto da arrecadação com a folha do funcionalismo é de 54% da receita. Com relação à disputa eleitoral, considerou que “atrapalha principalmente na relação com o governo do Estado. Neste momento vivemos uma instabilidade muito grande. Mas a disputa faz parte do processo democrático”, disse o prefeito.