Orçamento
Câmara: impasse emperra votação da LDO e expõe disputa por mais recursos
Vereadores querem elevar percentual das emendas de 1,2% para 1,55%; prefeitura alega grande impacto


A votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de Maceió para 2026, peça fundamental para a construção do orçamento municipal, está travada na Câmara de Vereadores há dois dias.
O ambiente no plenário é de tensão, e o impasse vai além das questões técnicas: trata-se de uma queda de braço política entre o Legislativo e a gestão do prefeito João Henrique Caldas (PL), com foco no aumento do percentual das emendas parlamentares.
Atualmente, cada um dos 27 vereadores dispõe de R$ 1,8 milhão por ano em emendas impositivas. O novo pleito da Câmara é elevar esse percentual de 1,2% para 1,55% do orçamento líquido da prefeitura — o que significaria um acréscimo superior a R$ 62 milhões, elevando o valor individual para cerca de R$ 2,3 milhões por vereador.
A Prefeitura de Maceió se opõe ao reajuste, embora reconheça a legalidade da proposta. Os secretários José Júnior Leão de Melo (Governo) e João Felipe Alves Borges (Economia), acompanhados de técnicos da gestão, afirmam que a medida causaria impacto significativo nas contas públicas. A estimativa orçamentária para 2025 é de R$ 4,8 bilhões — R$ 450 milhões a menos que em 2024 — e a prefeitura alega falta de margem fiscal.
Durante as negociações de bastidores, a equipe do prefeito chegou a propor reajustes mais modestos, sugerindo 1,22% e depois 1,35%. Ambas as propostas foram rejeitadas pela maioria dos vereadores, embora não tenham sido oficialmente confirmadas.
“A meta declarada é isonomia com os percentuais praticados no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas estaduais, mas o pano de fundo é claramente político”, afirmou o vereador Eduardo Canuto (PL), ecoando opinião compartilhada por outros colegas.
Com a ausência do presidente Chico Filho (PL), em viagem à Colômbia, a presidência da Câmara está sob comando da vice-presidente Silvânia Barbosa (Solidariedade). Ela tem tentado manter um tom conciliador, mas admite que “não há acordo fechado” e que “os pontos ainda estão em discussão”.
O presidente da Comissão de Orçamento, Samyr Malta (Podemos), também defende a equiparação com outras casas legislativas. Ele afirmou que o Legislativo está aberto ao diálogo, mas mantém a defesa do novo percentual. “Não há animosidade, mas não vamos recuar de algo que é constitucional e legítimo”, disse o parlamentar, embora reconheça a necessidade de um meio-termo.
INTERESSES POLÍTICOS
Apesar do tom técnico, a disputa revela interesses políticos. O aumento no teto das emendas fortalece o poder de atuação dos vereadores em seus redutos eleitorais, especialmente em ano pré-eleitoral. As emendas são frequentemente usadas para obras, repasses a instituições filantrópicas e ações pontuais nos bairros, funcionando como importante capital político.
A sessão de ontem (12) foi suspensa por mais de duas horas para uma reunião a portas fechadas entre os vereadores e os secretários de Governo e Economia. Segundo relatos de bastidores, “não houve acordo com o Executivo”. A vereadora Silvânia Barbosa e outros 19 parlamentares confirmaram a ausência de consenso.
Com a votação da LDO travada, a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA) também fica comprometida, prejudicando o planejamento das políticas públicas para 2026. A base governista tenta desvincular o impasse de qualquer pauta relacionada a reajuste salarial dos parlamentares — hoje com vencimentos brutos de R$ 17,5 mil. No entanto, o sigilo das reuniões alimenta a desconfiança entre eleitores e setores críticos da sociedade.
O vereador David Empregos (União Brasil) foi direto ao afirmar que não há previsão para votar a LDO na próxima terça, como chegou a ser cogitado. “Depende do presidente da Mesa Diretora”, disse, transferindo a responsabilidade para Chico Filho.
Apesar das declarações da Comissão de Orçamento de que o diálogo entre Executivo e Legislativo ocorre em “nível técnico”, é evidente que a disputa extrapola a discussão orçamentária. A pressão política é intensa, e a crise expõe um desequilíbrio nas prioridades institucionais.
A LDO, por definição, deveria ser um instrumento de racionalidade fiscal, voltado para metas e prioridades de gestão. No entanto, tornou-se palco de uma barganha política, com cada vereador tentando assegurar mais recursos em um orçamento que encolheu.
O orçamento da própria Câmara já foi aprovado em sessão extraordinária e está fixado em R$ 120 milhões para 2025 — o equivalente a 4,5% do orçamento corrente líquido do Executivo, mesmo com uma redução de 3,09% em relação ao ano anterior.
Diante de um cenário de austeridade, com queda na arrecadação e restrições fiscais, a insistência no aumento das emendas soa desconectada da realidade econômica. A Câmara arrisca desgastar ainda mais sua imagem ao insistir em um reajuste milionário que, embora legal, não parece razoável no atual contexto.