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Jatiúca

Projeto de megatorres enfrenta dúvidas jurídicas e resistência do mercado

Empreendimento imobiliário para entorno da Lagoa da Anta vem sendo oferecido antes mesmo de autorização legal

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Sem licenças ambientais, urbanísticas ou manifestação formal dos órgãos de controle, o megaprojeto imobiliário anunciado para a região da Lagoa da Anta, no coração da Jatiúca, em Maceió, vem sendo ofertado a investidores antes mesmo de qualquer autorização legal.

A iniciativa da construtora Record, que prevê a construção de cinco torres de alto padrão no local, de 15 andares cada, está cercada de incertezas jurídicas e operacionais que colocam em xeque a viabilidade do empreendimento.

Com o metro quadrado sendo apresentado a valores estimados em R$ 12 mil, a Record iniciou a pré-venda de cotas a nomes estratégicos do mercado e da política, mesmo sem apresentar garantias reais nem condições contratuais sólidas que resguardem os compradores caso o projeto não seja viabilizado. Investidores ouvidos pela Gazeta relataram abordagens diretas da empresa com propostas de aquisição de unidades no modelo de cotas, sem documentos oficiais que respaldem legalmente a operação.

Em um dos episódios, um parlamentar alagoano com forte atuação no setor agropecuário do Nordeste foi procurado para participar do projeto. Desconfiado e preocupado com a repercussão que o acompanha desde o início, exigiu garantias como aval bancário, garantia real e multa compensatória. Nenhuma das condições foi aceita pela construtora, o que ampliou as dúvidas sobre a seriedade da proposta e a segurança jurídica do processo.

“Sou um investidor de mercado e não está muito claro se eles [Record] vão conseguir entregar o que prometem. Todo o processo é confuso e polêmico, o que não agrada a quem quer rentabilidade com um mínimo de risco”, relatou o parlamentar ao corretor consultado sobre o empreendimento.

PROJETO BILIONÁRIO SEM LICENÇAS

Estimado em até R$ 2 bilhões de Valor Geral de Vendas (VGV), o projeto assinado pelo escritório italiano Pininfarina prevê cinco torres de 15 andares: uma torre comercial, um hotel, uma torre residencial de luxo e dois edifícios de apartamentos do tipo studio. Ainda assim, nenhum licenciamento ambiental foi apresentado até o momento, nem estudos de impacto sobre mobilidade urbana e saneamento básico foram tornados públicos.

A Lagoa da Anta é considerada uma área sensível do ponto de vista ambiental. O contrato de cessão do terreno assinado entre o Grupo Lundgren e a Prefeitura de Maceió em 1979 proíbe a descaracterização do ecossistema local, o que pode inviabilizar a implantação das torres e levar a uma disputa judicial. Mesmo assim, a Record e o grupo proprietário da área retomaram as tratativas após o período eleitoral, sob sigilo e sem audiências públicas.

DÍVIDA BILIONÁRIA E HISTÓRICO DE OBRAS INACABADAS

Executivos ligados ao contrato confirmaram que a Record já desembolsou R$ 10 milhões ao Grupo Lundgren e assumiu a responsabilidade por uma dívida de R$ 260 milhões do Hotel Jatiúca com o sistema financeiro. O contrato prevê ainda um pagamento adicional do mesmo valor, totalizando um compromisso de R$ 520 milhões, sem contar os custos de construção, marketing e operação estimados em mais de R$ 300 milhões nos próximos três anos.

Além disso, há o histórico recente da construtora. Projetos como o “Malibu” e o “Vista da Garça”, ambos de alto padrão e também divulgados como grandes apostas da empresa, seguem sem conclusão e enfrentam dificuldades operacionais, segundo corretores do mercado local.

IMPACTO NA CIDADE E RESISTÊNCIA TÉCNICA

Urbanistas e arquitetos ouvidos pela reportagem alertam que o projeto pode provocar sobrecarga no trânsito e no saneamento da região, já afetada por congestionamentos diários. O cálculo preliminar aponta a necessidade de pelo menos 2.140 vagas de garagem apenas para moradores das torres, sem incluir estacionamento para o hotel, comércio e visitantes.

Sem um Plano Diretor atualizado — defasado há 15 anos —, Maceió está vulnerável a empreendimentos de grande impacto sem mecanismos urbanos que regulem a ocupação do solo. Há receio de que a Lagoa da Anta enfrente o mesmo processo de degradação de outras áreas da orla, onde o avanço imobiliário desordenado provocou assoreamento, perda de mata nativa e colapso da infraestrutura básica.

ARTICULAÇÕES POLÍTICAS

A reportagem também apurou que vereadores da capital têm sido procurados por representantes do projeto. As abordagens buscam apoio político e institucional para destravar o avanço do empreendimento, mesmo diante dos dispositivos legais que impõem limites ambientais e exigem ampla discussão pública.

Especialistas consultados reiteram que o conjunto de elementos — ausência de licenças, antecipação de cotas, dívida bilionária, histórico problemático, resistência popular e pressão sobre o poder público — transforma o projeto da Record na Lagoa da Anta em uma operação de alto risco jurídico, financeiro e ambiental.

Mesmo assim, a Record e
o grupo proprietário da área re-
tomaram as tratativas após o pe-
ríodo eleitoral, sob sigilo e sem
audiências públicas.

OUTRO LADO

Durante toda essa sexta-feira (25), a Gazeta tentou contato com diretores da Record e com Hélio Abreu, sócio da construtora, para esclarecimentos sobre a pré-venda de cotas do projeto imobiliário sem as devidas garantias. Entretanto, até o fechamento desta edição, às 22h, não obteve resposta.

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