REPERCUSSÃO
Lei das Focinheiras gera críticas de tutores e alerta sobre abandono de cães em Alagoas
Veterinários e criadores questionam a falta de debate e critérios técnicos na nova legislação


A nova legislação sancionada pelo governador Paulo Dantas (MDB), que obriga o uso de focinheira por determinadas raças de cães em locais públicos, tem provocado forte reação entre tutores, veterinários e criadores de animais em Alagoas. Eles criticam a ausência de debate técnico prévio, a falta de clareza em pontos fundamentais da lei e os riscos de que a medida provoque aumento no abandono de animais de grande porte.
A Lei nº 9.622/2025 lista raças como Pit Bull, Rottweiler, American Bully, Fila Brasileiro, entre outras, e estabelece que esses cães só podem circular em locais públicos com coleira, guia curta de até 1,5 metro e focinheira. O problema, segundo os críticos, é que a regra desconsidera o bem-estar animal, aspectos técnicos sobre determinadas raças e não aponta soluções práticas para sua execução imediata.
“Você exigir focinheira de um American Bully é como pedir dinheiro a um Pug. Ambas as raças têm síndrome braquicefálica e, se usarem focinheira, correm risco real de morte por hipertermia”, alerta Oliveira Neto, tutor e criador de cães. Segundo ele, a lei falha ao focar exclusivamente em determinadas raças, ignorando que a maioria dos ataques registrados vem de animais sem raça definida, sem treinamento ou controle.
Além disso, os tutores reclamam da ausência de uma autoridade definida para fiscalização, dos custos elevados para adquirir equipamentos adequados e da falta de prazo para adaptação. “Não houve audiência pública. Uma lei como essa, tão radical, precisava ser discutida antes. Criadores experientes se preocupam com a conduta social do cão, mas isso precisa ser tratado com equilíbrio e não criando brechas e insegurança jurídica”, completou Oliveira.
O veterinário Rodrigo Lopes, especialista em comportamento canino, também contesta a eficácia da lei. Para ele, a criminalização por raça é ultrapassada e ineficaz. “Essa abordagem não funcionou em países como a Inglaterra. O problema real não é a raça, mas a falta de socialização, adestramento e responsabilidade dos tutores”, explicou.
Lopes também faz um alerta técnico: focinheiras mal ajustadas podem impedir o cão de arfar — processo natural de regulação da temperatura corporal — o que pode causar casos graves de superaquecimento. “Cães não suam como nós. Se não conseguirem arfar, podem morrer só por estarem caminhando na rua”.
Em sua avaliação, o caminho mais eficaz seria uma legislação baseada no porte do animal, com exigência de treinamento e provas de socialização, como já ocorre em países da Europa. “A prova de cão social, aplicada pela CBKC [Confederação Brasileira de Cinofilia], poderia ser exigida para cães acima de determinado peso, independente da raça”, sugere.
Diante da repercussão, o deputado Cabo Bebeto (PL) convocou uma sessão especial na Assembleia Legislativa de Alagoas para o próximo dia 11 de agosto, às 14h, para debater a posse responsável e as consequências da nova legislação. Tutores e especialistas estão se mobilizando para participar da audiência.
Apesar das críticas, os envolvidos no debate reconhecem que a lei representa um ponto de partida para uma discussão mais ampla sobre a posse responsável e o comportamento animal. “Faltou equidade. Não é sobre raça, é sobre responsabilidade. Estamos prontos para contribuir com propostas que considerem o bem-estar dos animais e a segurança das pessoas”, conclui Oliveira Neto.