Sessão especial
ALE discute tensão sobre demarcação de terra indígena em Palmeira dos Índios
Deputados e moradores contestam critérios da Funai e vão pedir ao governo federal a revisão do processo


A Assembleia Legislativa de Alagoas (ALE) promoveu, na manhã de ontem uma sessão especial para discutir a polêmica demarcação de terras indígenas no município de Palmeira dos Índios. A iniciativa, proposta pelo deputado Cabo Bebeto (PL), buscava reunir representantes de órgãos federais, estaduais e municipais, além de lideranças indígenas, agricultores e entidades civis. No entanto, a ausência de representantes da Funai, da comunidade Xucuru-Kariri e do Ministério Público Federal marcou o encontro e foi lamentada pelos participantes.
O debate ocorre em meio a tensões crescentes no município, onde indígenas e agricultores têm apresentado posições divergentes sobre a proposta de demarcação. O estudo da Funai prevê a delimitação de cerca de 7 mil hectares, envolvendo áreas rurais e urbanas, o que tem causado apreensão entre moradores, pequenos agricultores e gestores públicos.
ALE pretende consolidar as informações apresentadas ontem em um documento oficial, que será encaminhado ao governo federal.
O secretário estadual de Relações Federativas, Júlio Cezar, ex-prefeito de Palmeira dos Índios, afirmou que o modelo apresentado para o município é semelhante ao aplicado em Amarantes, no Maranhão – e que, segundo ele, trouxe prejuízos profundos. Júlio destacou que 90% da área afetada pertence a pequenos agricultores familiares, muitos certificados por DAPs e DAFs.
“É uma guerra de pobre contra pobre. O modelo que a Funai quer implantar penaliza famílias humildes, atinge áreas urbanas e produz impactos sociais e econômicos graves. Precisamos de uma solução negociada, como já recomenda a PGR”, afirmou.
O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Alagoas (Faeal), Álvaro Almeida, reforçou que a ALE tem papel central na mediação do conflito e deve levar a pauta ao presidente da República. Ele questionou a expansão territorial proposta, ressaltando que a comunidade indígena já dispõe de área reconhecida.
“Nada temos contra os povos indígenas, mas é preciso equilíbrio. Como justificar que exercem atividades em apenas cerca de 150 hectares e querem ampliar para mais 5 mil, atingindo até área urbana? Estamos falando de 10 mil produtores afetados direta ou indiretamente, o que representa 30 mil pessoas”, disse.
O deputado Cabo Bebeto cobrou prudência e uma reavaliação técnica mais ampla. Para ele, a análise feita por um único especialista não é suficiente para embasar uma decisão tão sensível.
“O governo não pode resolver o problema de uns gerando prejuízo a outros. Queremos um documento oficial desta sessão para encaminhar ao Governo Federal, pedindo mais calma e uma avaliação mais justa e técnica”, frisou. Ele também ressaltou que, embora não haja relatos de violência direta, o clima é de “ameaça permanente” diante da possível perda de patrimônios construídos ao longo de gerações.
O procurador do município de Palmeira dos Índios, Marcos Guerra, alertou para um “risco enorme à segurança jurídica”, afirmando que muitas áreas possuem registros centenários. Segundo ele, cerca de 10 mil pessoas seriam atingidas, a maioria pequenos produtores rurais.
“Estamos falando de famílias humildes, que cultivam hortifrutis em pequenas propriedades. Sem indenização adequada pela terra nua, essas pessoas não teriam como se realocar. O impacto social seria devastador”, pontuou. Comparando a situação ao caso do bairro do Pinheiro, em Maceió, Guerra enfatizou que, ao contrário do episódio da mineração, não há perspectiva de compensação financeira que permita a reorganização das famílias.
A ausência de representantes da Funai, do MPF e da comunidade Xucuru-Kariri foi apontada como um dos principais entraves ao avanço do debate. “Todos foram convidados. É lamentável que não tenham comparecido”, criticou Bebeto.
