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Sonegação

Em oito anos, Gaesf desmonta casos de fraude fiscal que somam R$ 9,3 bi em AL

Grupo especial do MPAL já identificou cerca de 2 mil empresas de fachada, algumas ligadas ao PCC

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Promotor Cyro Blatter foi o responsável pela criação do Gaesf em 2017 para combater a sonegação
Promotor Cyro Blatter foi o responsável pela criação do Gaesf em 2017 para combater a sonegação | Foto: Assessoria

Criado há oito anos, o Grupo de Atuação Especial contra a Sonegação Fiscal e os Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e as Relações de Consumo (Gaesf), que faz parte do Ministério Público Estadual, conseguiu, sem disparar um tiro, incluir R$ 9,3 bilhões na dívida ativa do Estado, resultado de sonegações e fraudes acumuladas por empresários e organizações criminosas.

Somente neste ano, os dez alvos prioritários do Gaesf permitiram identificar e iniciar a recuperação de mais de R$ 400 milhões em tributos sonegados. Desse total, R$ 92 milhões já ingressaram nos cofres estaduais. O restante segue em discussão judicial, em fase final de recursos.

Outro dado relevante: das empresas investigadas, cerca de 2 mil eram de fachada — algumas ligadas ao Primeiro Comando da Capital (PCC) —, e 400 já foram fechadas.

Atualmente, o Gaesf processa criminalmente 421 pessoas em ações que tramitam na 17ª Vara Criminal, especializada em crimes de organizações criminosas e fraudes fiscais. Os réus são ligados a diversos setores, entre eles atacadistas de Maceió e Arapiraca, o ramo de combustíveis, empresas “trades” de importação e exportação e o setor de plástico.

De acordo com as autoridades envolvidas no combate à sonegação, os R$ 9,3 bilhões desviados ao longo dos últimos anos seriam suficientes para construir 56 mil casas populares, pavimentar 934 quilômetros de estradas e erguer 467 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs).

INTEGRAÇÃO

O Gaesf é composto pelos promotores de Justiça Anderson Cláudio e Cyro Blatter, ambos experientes no enfrentamento a organizações criminosas e crimes tributários. Blatter fundou o grupo em 2017.

O trabalho é realizado em conjunto com equipes de inteligência da Sefaz, auditores fiscais, Procuradoria-Geral do Estado, delegados e agentes da Polícia Civil, além de oficiais e praças da Polícia Militar.

“Em 2016 recebi a incumbência de criar um órgão do Ministério Público de Alagoas para recuperar ativos e combater a sonegação fiscal, que já somava bilhões de reais e era considerada uma perda pelo Estado”, lembrou Cyro Blatter, destacando que, à época, apenas cinco estados possuíam estruturas similares.

Ao detalhar a evolução dos casos, o promotor afirmou que, dos R$ 9,3 bilhões identificados, mais de R$ 7 bilhões decorrem de fraudes já comprovadas. “Estamos falando de dívidas sem mais possibilidade de contestação”, afirmou. Ele destacou ainda que o valor recuperado se aproxima da receita anual de ICMS, que somou R$ 10 bilhões em 2024.

Após a identificação da sonegação, a empresa é autuada e passa pelas fases recursais de primeira e segunda instância no Conselho de Contribuintes. Esgotadas as possibilidades de defesa, a dívida é inscrita na Dívida Ativa e pode ser executada pela Procuradoria-Geral do Estado, paralelamente às ações penais movidas pelo Gaesf.

OPERAÇÕES

Neste ano, o grupo deflagrou dez operações em Maceió, Arapiraca, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, recuperando cerca de R$ 400 milhões. No ano passado, R$ 60 milhões voltaram aos cofres públicos.

Por força da Lei de Abuso de Autoridade e do sigilo fiscal, os nomes dos envolvidos não podem ser divulgados, mas o Gaesf afirma que os fraudadores atuam nos setores de plásticos, combustíveis, atacado de grãos e comércio exterior.

Os sonegadores são orientados a aderir a programas de refinanciamento, podendo quitar parte das dívidas com imóveis, veículos, criptomoedas, valores enviados ao exterior e outras garantias. Segundo o promotor, os valores recuperados não estavam previstos no orçamento por se tratarem de fraudes.

As operações também ocorreram fora do Estado. No mês passado, foram cumpridos 15 mandados de busca e apreensão em Santa Catarina, relacionados a uma fraude de R$ 40 milhões.

Para 2026, o Gaesf já tem como alvo uma nova “trade”, de onde pretende recuperar R$ 150 milhões em tributos sonegados. As operações contam com apoio da Receita Federal.

Os fraudadores utilizam empresas de fachada cujos supostos proprietários são beneficiários do Bolsa Família, moradores de rua ou pessoas sem capacidade financeira para manter negócios milionários. “Fechamos 400 empresas inidôneas e estamos focados em outras duas mil que apresentam indícios de fraude”, afirmou Blatter.

Quanto ao crime organizado, o promotor confirmou que facções estão migrando do tráfico para atividades formais, especialmente no setor de combustíveis. “Em Alagoas já identificamos casos em investigação”.

ESQUEMA SOFISTICADO

A sonegação também se sofisticou. “Não existe mais a antiga nota calçada. Os esquemas envolvem profissionais de contabilidade, operadores do Direito, servidores públicos e uso de tecnologias como inteligência artificial”, disse Blatter.

Auditores da Sefaz confirmam o uso de malhas fiscais, cruzamento de dados e monitoramento de movimentação de mercadorias para identificar irregularidades.

IMPACTO SOCIAL

Blatter chamou atenção para o impacto social da sonegação. Dos 3,2 milhões de habitantes de Alagoas, 60% dependem de programas sociais, segundo o IBGE. O Estado tem apenas 400 mil trabalhadores com carteira assinada e pouco mais de 200 mil servidores públicos e dependentes. “O dinheiro sonegado faz falta na saúde, educação, assistência social e em políticas para os mais vulneráveis”, afirmou Blatter. “A sonegação se apropria do dinheiro do cidadão”.

A pena para sonegação varia de um a cinco anos de prisão, mas pode aumentar para até 20 anos quando há envolvimento de organização criminosa, falsificação de documentos e falsidade ideológica.

Neste ano, a maior sentença envolveu oito empresários acusados de fraudes fiscais em Arapiraca. O líder do esquema foi condenado a 10 anos e cumpre pena em regime de liberdade vigiada; o segundo foi condenado a nove anos e seis meses; os demais receberam penas de oito anos. Todos tiveram bens retidos e deverão parcelar débitos que somam R$ 500 milhões.

Em oito anos, o Gaesf apreendeu 114 imóveis e 200 veículos. Para 2026, a meta é recuperar mais de R$ 400 milhões. Blatter reforçou que a população pode ajudar exigindo nota fiscal e denunciando comércio irregular. “Cada real recuperado é mais educação, saúde e cidadania para quem mais precisa”.

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