Política
Economista diz que Estado n�o consolidou ajuste fiscal

Nos últimos quatro anos Alagoas pagou quase R$ 600 milhões de juros da dívida pública, que consome 15% da receita líquida estadual. Esse volume de recursos é bem maior que todo o dinheiro destinado a investimento e custeio da máquina e denuncia o fracasso do programa de reestruturação e ajuste fiscal implantado no início da atual administração, afirma o economista Cícero Péricles de Carvalho, ao analisar a prestação de contas do governo. Ele adverte que a dívida pública do Estado é impagável, mas pondera que o problema desse gigantesco débito é mais político que financeiro. O economista diz que todos os esforços do governo no sentido de equilibrar as finanças do Estado esbarram no pagamento da dívida pública, maior sangria ao erário estadual e critica o fato de não ter sido feita uma devassa nos contratos de assunção e consolidação da dívida que culminaram com esse débito monumental. Este gigantesco estoque de dívida deveria ter sofrido uma auditoria logo nos primeiros meses do governo, para que todos conhecessem seus responsáveis e o custo desse débito para a sociedade, afirma Péricles de Carvalho. Leia, na íntegra, a entrevista do economista e professor da Universidade Federal de Alagoas: ### Como anda a economia de Alagoas depois da implantação do ajuste fiscal ? Péricles - Alagoas continua vivendo sua crise fiscal. O programa de reestruturação e ajuste fiscal assumido, em 1997, como uma das políticas públicas que compõe a reforma fiscal do governo federal, apresenta todo o seu fracasso: apesar de adotar diversas medidas de austeridade, como a redução de gastos com pessoal, de ter privatizado suas empresas; da busca de disciplina e equilíbrio fiscais e estabilidade macroeconômica, o saldo da dívida total aumentou em R$ 2,3 bilhões, saltando de R$ 2,1 para R$ 3,4 bilhões atuais e a parte federalizada dessa dívida cresceu em 400 milhões de reais, passando de R$ 1,4 para R$ 1,8 bilhão; a arrecadação própria não acompanhou o ritmo das transferências federais, caracterizando uma dependência que está longe de ser desfeita e, importante, o volume transferido para Brasília a título de pagamento da dívida consegue ser maior que toda soma dos recursos gastos em custeio e investimento. O que falhou nesse programa? Ao assumir o governo, no dia 1o de janeiro de 1999, o novo governo descobriu que herdava três grandes problemas financeiros que o imobilizaria durante toda sua gestão: uma dívida impagável com o governo federal; uma receita própria insuficiente para cumprir seu papel administrativo, que é o de pagar a folha de pessoal, manter a máquina pública e realizar investimentos; e uma agenda conflitiva com o principal setor econômico, o sucroalcooleiro. Nesses quatro anos não houve crescimento da receita própria do Estado? Na verdade, o primeiro secretário da Fazenda, professor Arnon Chagas, assumiu para administrar os três nós: a) uma dívida gigantesca de 2,1 bilhões de reais, que leva todos os meses 15% da pequena receita líquida do Estado, transferida que é para a Secretaria do Tesouro Nacional; b) uma receita própria (impostos arrecadados no Estado) diminuta, na qual a arrecadação do principal tributo, o ICMS, era insuficiente para pagar a folha de pessoal do Poder Executivo e c) uma agenda conflitiva com o principal setor econômico do Estado, que vem se arrastando há mais de uma década. E qual a raiz desse endividamento que engessa o desenvolvimento de Alagoas ? A dívida estadual, o primeiro problema, mais que financeiro, era e continua sendo um problema político. A formação desse estoque gigantesco deveria ter sofrido, já nos primeiros meses de governo, uma auditoria, na verdade uma devassa e uma revisão de todos os contratos, para que seus resultados fossem publicados, com letras garrafais, e que todos soubessem quem a fez, como e quanto custa à sociedade este débito monumental, equivalente, hoje, a cinco anos de arrecadação de todo o ICMS do Estado. O governo passado não havia renegociado essa dívida? É bom lembrar que, em 1990, no Governo Moacir Andrade, houve uma negociação com o governo federal e assinado o Acordo de Refinanciamento em 20 anos e financiamento de toda sua dívida. Pelo acordo afirmado, Alagoas repassava ao Tesouro Nacional uma dívida total equivalente, hoje, a R$ 180 milhões. Como essa dívida chegou a R$ 3,4 bilhões? O atual vice-governador, que já foi conselheiro do Tribunal de Contas, afirmou que uma auditoria diminuiria em, pelo menos, um terço o total desse débito. Ele propôs, ainda em 1999, uma auditoria, mas sua proposta não foi atendida. Era o mínimo que se esperava em relação à uma dívida equivalente a 68 meses de arrecadação do ICMS de Alagoas. Qual o real impacto da dívida pública na economia estadual? Uma dívida cuja parte federalizada era de R$ 1,4 bilhão, e, apesar de o Estado de Alagoas pagar, entre janeiro de 1999 e junho de 2002, a quantia de 600 milhões de reais, saltou para 1,8 bilhão de reais. Esse montante de recursos transferidos para o Banco Central é muito maior que todo o dinheiro gasto em custeio e investimentos nestes três anos e meio de governo, que foi de 400 milhões. É uma situação perversa para um pequeno estado periférico como o nosso. Ou seja, a dívida é verdadeiramente impagável. O próprio secretário da Fazenda, afirma isso e o governo de Alagoas tem obrigação política de propor uma outra forma contratual que permita o seu pagamento e a solvência do Estado. E onde se encaixa o calote de R$ 1,2 bilhão dos títulos públicos de Alagoas? Evidentemente que, nesta situação, incluir no programa de reestruturação a dívida mobiliária (as letras do tesouro estadual), no valor de R$ 1,2 bilhão, a rolagem da dívida do Produban, no valor de R$ 502 milhões e a federalização da dívida da Ceal, é uma irresponsabilidade, à medida que aumentaríamos o volume devido, esticando o prazo de pagamento, sem nenhuma contrapartida efetiva para os cofres estaduais. Qual a participação do ICMS na arrecadação do Estado? O que o Estado arrecada de ICMS, o seu principal imposto, é insuficiente para pagar a folha de pessoal do Poder Executivo. Nos 42 meses iniciais de governo, de janeiro de 99 a junho deste ano, foi arrecadado R$ 1,8 bilhão de reais em ICMS e pagos R$ 2,1 bilhões de despesas com o pessoal do Poder Executivo. Nossa arrecadação própria é menor que o volume das transferências federais, ou seja, estamos parecidos com Roraima e Amapá, unidades sem renda suficiente que dependem dos recursos vindos de Brasília. Em relação a riqueza criada, Alagoas arrecada, proporcionalmente, menos que Sergipe. Nesta situação, o governo tem de fazer sérias restrições no tocante ao custeio, sem poder sequer sonhar em fazer investimentos fora das áreas nas quais o governo federal tenha participação. Quais as alternativas para Alagoas sair desse atoleiro econômico e do caos social? A saída para Alagoas criar dinâmica, renda, emprego e aumentar sua capacidade de investimento é federalizar ainda mais seu problema regional. Alagoas, devido as suas dificuldades estruturais econômicas, sociais, financeiras e administrativas mais os seus problemas conjunturais, vive uma situação financeira insustentável e sem perspectivas econômicas Alagoas pode politizar sua questão financeira e exigir um tratamento diferenciado em relação aos demais Estados brasileiros. E isso traria vantagens imediatas no tratamento de alguns projetos estratégicos.